Cobrado por investidores estrangeiros sobre a preservação dos direitos da população indígena, o vice-presidente Hamilton Mourão admitiu nesta quinta-feira, 9, que é responsabilidade do governo atender aos povos tradicionais, mas não apresentou medidas concretas para isso. Mourão defendeu que o indígena seja "mais integrado" à sociedade. Também disse que milhares de indígenas contraíram covid-19 devido a deslocamentos feitos por eles até as cidades para receber benefícios assistenciais ou fazer compras, e não devido à invasão ilegal de garimpeiros.
Ao comentar decisão do presidente Bolsonaro de vetar a lei que garantia o fornecimento de insumos em aldeias, como água potável, durante a pandemia, Mourão disse que "o indígena se abastece da água dos rios que estão na sua região". Ele reconheceu que, muitas vezes, há contaminação dos rios em terras indígenas justamente devido à presença de garimpeiros. "Se, porventura, algum rio daquele foi contaminado por atividade ilegal, notadamente garimpo, com uso de mercúrio, se leva água para esses grupos", disse, em entrevista coletiva após conversa com representantes de fundos de investimento estrangeiros.
Ao falar sobre a chegada da pandemia nas terras indígenas, disse que não é por que têm "elementos estranhos" dentro da terra que a pandemia chegou. "As senhoras e os senhores têm de entender, na realidade amazônica, que o indígena sai da sua terra para ir até a cidade, seja para receber algum benefício, da nossa Lei Orgânica de Assistência Social, seja porque ele tem de comprar alguma coisa."
Ele disse ainda que seria uma tarefa "hercúlea" bloquear o território indígena para impedir "a entrada de gente", em referência aos garimpeiros. "Se nós vamos ter de bloquear a entrada, também vamos ter de bloquear a saída." Mourão também comanda o Conselho da Amazônia.
Na quarta-feira, 8, Bolsonaro vetou obrigações do poder público com povos indígenas durante a pandemia, o que incluía, além da água potável, distribuição de materiais de higiene e limpeza e de desinfecção das aldeias. Também oferta de leitos hospitalares e de unidade de terapia intensiva (UTI), ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea.
A postura do governo em relação aos indígenas tem sido alvo de críticas de investidores estrangeiros. Segundo Mourão, os presidentes dos fundos de investimento, que se reuniram ontem com integrantes do governo, citaram a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre Povos Indígenas e Tribais em Estados Independentes.
Segundo a Convenção, as terras indígenas devem ser concebidas como a integralidade do meio ambiente das áreas ocupadas ou usadas pelos povos indígenas abarcando aspectos de natureza coletiva e de direitos econômicos, sociais e culturais além dos direitos civis. Os Artigos 15 e 14 enfatizam o direito de consulta e participação dos povos indígenas no uso, gestão (inclusive controle de acesso) e conservação de seus territórios. Além disso, prevê o direito a indenização por danos e proteção contra despejos e remoções de suas terras tradicionais.
Na semana passada, Mourão recebeu o líder indígena Dário Kopenawa Yanomami, no Palácio do Planalto, para falar sobre a violência de garimpeiros contra povos indígenas na Terra Yanomami. Após o encontro, no entanto, Dário disse que Mourão afirmou que vai resolver o problema, mas "não explicou direito como". Os Yanomami falam na invasão de 20 mil garimpeiros em suas terras. O governo admite a presença de 3,5 mil.
O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou cinco medidas a serem adotadas pelo governo para conter o contágio e a mortandade por covid-19 entre os indígenas. A decisão foi tomada no âmbito de ação apresentada por partidos de oposição.
Entre as determinações estão o planejamento de ações com a participação das comunidades, apresentação de planos para contenção de invasores e do próprio vírus nas reservas e a criação de barreiras sanitárias para preservar indígenas isolados. Ele determinou que seja garantido o acesso dessa população ao Subsistema Indígena de Saúde e que as medidas "devem envolver diálogos com o Poder Público e com os povos indígenas, sem se descuidar dos princípios da precaução e da prevenção".
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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