Milhões de brasileiros vão começar 2021 sem saber como vão pagar as contas. O auxílio emergencial está chegando ao fim sem que o governo federal tenha conseguido tirar do papel o plano de criar um novo programa social para substituir a renda extra criada para amenizar os efeitos da pandemia.
O governo federal tem afirmado que outros fatores vão compensar a retirada do auxílio emergencial na economia. No dia em que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que o PIB do Brasil cresceu 7,7% no terceiro trimestre, por exemplo, a Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia disse que “a retomada da atividade e do emprego, que ocorreu nos últimos meses, compensará a redução dos auxílios.
Economista e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV/Ibre), Daniel Duque calcula que a extrema pobreza, que já atinge 13,6 milhões de brasileiros, vai crescer e pode até dobrar no início de 2021. “O fim do auxílio emergencial vai colocar mais cinco milhões de pessoas na pobreza e na extrema pobreza em relação ao período anterior da pandemia, porque o mercado de trabalho ainda está longe de se recuperar, principalmente para a população informal”, explica.
Duque calcula que a extrema pobreza, que considera as pessoas que vivem com menos de US$ 1,90 por dia, atingia 6,9% da população brasileira em 2019 e caiu para 3,3% em meio à pandemia, devido ao auxílio emergencial. Porém, pode alcançar algo em torno de 10% a 15% dos brasileiros no próximo ano, atingindo mais de 20 milhões de pessoas.
Mercado de trabalho
Segundo o professor de economia do Insper e CEO da Siegen, Fabio Astrauskas, o desemprego pode chegar a 20% em 2021, com a entrada de 7 milhões de brasileiros na busca por uma ocupação. Isso significa que o número de pessoas que estão na fila do desemprego no país saltaria dos atuais 14,1 milhões para cerca de 20 milhões.
Astrauskas explica que, nos últimos 12 meses, 13,7 milhões de pessoas saíram da força de trabalho e calcula que pelo menos metade desse contingente vai voltar a pressionar a taxa de desemprego devido ao fim do auxílio emergencial. “Há um grupo de desalentados que está fora do mercado de trabalho, porque sabe que está difícil encontrar emprego e está recebendo a ajuda do governo, mas que deve voltar a procurar uma vaga assim que o auxílio emergencial terminar”, explica o economista.
Ele diz que boa parte dessas pessoas corre o risco de não conseguir um emprego logo no início do ano, já que o mercado de trabalho e a economia brasileira não devem se recuperar tão rapidamente. “Não vamos conseguir gerar tanto emprego num curto espaço de tempo. Então, o aumento do desemprego será uma consequência direta do fim do auxílio emergencial”, alerta.
Com desemprego em alta e o aumento da pobreza, os economistas também preveem uma barreira a mais para o consumo e a recuperação econômica. Por isso, projetam que a atividade econômica, que vem se recuperando do baque provocado pela pandemia nos últimos meses, deve desacelerar no início do próximo ano, até que o governo consiga destravar as questões fiscais e as reformas estruturantes, que, hoje, impedem o aumento dos investimentos públicos e privados.
Queda no varejo
Setor mais beneficiado pelo impulso do auxílio emergencial, o comércio já viu o ritmo de recuperação desacelerar após a redução do benefício de R$ 600 para R$ 300. Por isso, tenta se preparar para a retirada total do auxílio no início do próximo ano. “A tendência é de taxas menos positivas do que as dos últimos meses”, admite o economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC) Fábio Bentes.
Ele lembra que, além do fim do auxílio emergencial e do desemprego elevado, o recrudescimento da pandemia pode contribuir para a redução do consumo. Por isso, acredita que a atividade econômica vai andar de lado no início do próximo ano.
Diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI), Felipe Salto reforça que “a economia pode ter um ano muito ruim do ponto de vista do PIB e do crescimento” caso haja um recrudescimento da pandemia, já que, hoje, não há margem no Orçamento para novas despesas — problema que fez o governo adiar para o próximo ano a discussão sobre a PEC Emergencial, proposta de emenda à Constituição que poderia liberar algum espaço do Orçamento para a criação do substituto do Bolsa-Família. *Estagiárias sob supervisão do subeditor Rafael Alves
Solução temporária que foi prorrogada
Publicada em 2 de abril de 2020, a lei do auxílio emergencial afirmava que o benefício duraria apenas três meses. Além disso, os beneficiários do programa Bolsa-Família já estariam automaticamente cadastrados no mesmo. Na época, o presidente chegou a informar que o auxílio ajudaria 54 milhões de pessoas.
Além do auxílio, também foi criado o aplicativo Caixa Auxilio Emergencial para que os requisitantes pudessem efetuar o cadastro e receber o benefício. Durante os primeiros dias, vários usuários relataram problemas técnicos no sistema até 8 de junho, dia em que as agências dos Correios em todo o Brasil também foram habilitadas para apoiar os beneficiários.
Em 1º de setembro, o presidente Jair Bolsonaro anunciou a prorrogação do auxílio emergencial até dezembro, com quatro parcelas adicionais de R$ 300. “O valor definido agora é um pouco superior a 50% do Bolsa-Família. Então, nós decidimos aqui, até atendendo à economia em cima da responsabilidade fiscal, fixar em R$ 300”, informou na ocasião.
Calendário final
» Neste último mês de pagamento, os beneficiários do programa receberão os R$ 300 até o dia 29
» Quem nasceu entre janeiro e outubro, receberá até sexta-feira, 25
» Os demais pagamentos serão realizados no dia 28
» Para quem nasceu em novembro, no dia 29