O esforço de arregaçar as mangas, rever a carreira e encarar uma atividade nova, em plena crise sanitária, exigiu empenho maior do que Sabryna Santos, de 36 anos, imaginaria num momento especial da gestação do primeiro filho dela, Francisco, hoje com sete meses. Quando a gravidez completou 90 dias, ela enfrentou um baque no serviço de artesanato para festas, no qual havia se especializadao, e que foi duramente afetado pelo isolamento social para deter a COVID-19.
Não havia mais contratos a cumprir, o que derrubou o faturamento da pequena empresa de Sabryna Santos. Ela define como uma redescoberta profissional a mudança que a levou para um novo negócio montado na cozinha da casa onde mora, em Divinópolis, na Região Centro-Oeste de Minas Gerais. “Praticamente, havia perdido o meu emprego”, lembra.
Histórias semelhantes à de Sabryna se tornam mais frequentes passado mais de um ano das medidas restritivas às atividades do comércio e do setor de prestação de serviços para conter a disseminação do novo coronavírus. A reinvenção de empreendedores e trabalhadores por conta própria é o tema da série de reportagens Negócio em Casa, que o Estado de Minas publica desde domingo.
As mulheres sentiram de forma particular o impacto da COVID-19 no mercado de trabalho, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O percentual de mulheres que estavam trabalhando atingiu, em 2020, o pior índice na série acompanhada pelo instituto. No terceiro trimestre do ano passado, elas representavam 45,8% do total de trabalhadores, taxa que só perdeu para 44,2% em 1990. Salvo raras exceções, cabe a elas a responsabilidade de cuidar dos filhos e ajudar nas aulas a distância, enquanto segue o distanciamento social.
A decisão de Sabryna Santos de empreender em um novo segmento foi tomada logo após as primeiras restrições impostas pelo distanciamento e a falta de horizonte para a retomada das atividades ligadas a festas e comemorações. “Sempre adorei a cozinha. É um espaço terapêutico para mim, como se eu pudesse sair um pouco da realidade e me transportar para outro mundo, onde posso me realizar”, conta.
A transformação ocorreria em cinco meses, estimulada por outra paixão de Sabryna Santos, a culinária, que deu a ela a fama de chef nos encontros com os amigos. Da produção inicial de biscuit e os chamados bolos fakes (quitanda confeccionada com isopor ou biscuit recoberto de superfície comestível) ela passou a produzir creme de café, geleia, e biscoitos de nata. Hoje, faz refeições por encomenda.
Tudo é feito na cozinha de casa. Entre abril e setembro do ano passado, ela adaptou a agenda de trabalho para conseguir dividir o tempo entre a maternidade e a nova profissão. De forma esporádica, surge alguma oportunidade de atuar no serviço de artesanato para festas.
O ritmo do novo empreendimento ganhou fôlego após o fim da licença-maternidade de Sabryna. Ajudou o pé-de-meia feito por ela e o marido, que também trabalha no ramo de eventos. “Deu para levar, apesar dos dias difíceis. Estava muito preocupada até conseguir criar minha empresa. Tive a ideia e a coragem para mudar de ramo e me arriscar”, destaca.
Despesas
Para conciliar a maternidade com a empresa, Sabryna precisou aprender a administrar o tempo e a estabelecer prioridades. Ela produz por encomenda, e no caso dos risotos concentrou a preparação em um sabor por semana. Com o novo desafio do negócio próprio, ela e o marido colocaram os pés no freio das despesas. “Precisei também cortar muitos gastos e viver com pouco. Priorizamos algumas contas básicas e tentamos ser mais minimalistas para que o orçamento não ficasse apertado”, conta. Dificuldades à parte, ela carrega no sorriso a inspiração para sempre se reinventar.
“São dias difíceis e estranhos. O que me sustenta é a fé. Tenho o otimismo trágico também de retirar algo bom do que está ruim. Mesmo numa situação de sofrimento, tentar ver o lado positivo e como posso me transformar mediante as oportunidades que me aparecem”, afirma. Assim como o fiho Francisco, a nova empresa está engatinhando, crescendo e se desenvolvendo. Enquanto isso, o artesanato ficou guardado em algum armário à espera do sinal verde para colorir novamente as festas que virão.
*Amanda Quintiliano/ Especial para o EM