A Proposta de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2022 será enviada ao Congresso nesta terça-feira (31/8). Em meio às acirradas discussões entre Executivo, Legislativo e Judiciário, a expectativa do mercado é de que o texto seja menos político e contemple quatro principais pontos: pagamento dos R$ 89 bilhões de precatórios; despesas discricionárias comprimidas; despesas obrigatórias revistas; e o montante reservado ao novo Bolsa Família nos patamares de 2020 (cerca de R$ 35 bilhões), sem ampliação de valor e da base de beneficiários. Na prática, entretanto, poucos acreditam que o que estará escrito seja cumprido, diante da tendência de expansão de gastos pelo governo, que pretende turbinar o Bolsa Família
"O Executivo irá apenas 'cumprir tabela' (prazo constitucional) ao entregar a PLOA 2022. As dúvidas e as incertezas vão continuar. O governo pretende fazer um omelete, mas não tem ovos", diz o especialista em contas públicas Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas. A estratégia de divulgar uma peça fictícia está evidente, diz, no discurso oficial, pelas pretensões de lançamento de um robusto programa social, de reajustar salários de servidores, de prorrogar a desoneração da folha e de incluir bilhões no Fundo Eleitoral.
Mas não há espaço no teto de gastos. "Nesta terça-feira, o governo dará apenas o pontapé inicial em um jogo complicado, que será disputado nos próximos quatro meses. E tudo dependerá da combinação com os 'russos', ou seja, com o Congresso Nacional", ironiza o especialista. Ele lembra que ainda não se tem sequer uma solução para os precatórios. "Além do mais, os parâmetros da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO, divulgada em 23 de agosto) já estão defasados em relação às previsões do Boletim Focus, do Banco Central. O mercado está, a cada semana, mais pessimista", aponta.
"O que se espera é que reduza despesas. Quando encaminhará em setembro o corte que prometeu nos subsídios? Não seria viável, nesse cenário de crise, a redução das emendas parlamentares, notadamente no valor de cerca de R$ 17 bilhões (em 2021) das abomináveis emendas do relator? Diante de tantas incertezas, o PLOA deverá conter, uma vez mais, valor extremamente elevado nas 'despesas condicionadas', que dependem da autorização do Congresso", reforça Castello Branco.
Fux-Dantas
Rachel de Sá, chefe de economia da Rico Investimentos, destaca que "o mercado está em compasso de espera e aguardando a resolução Fux-Dantas" - que vem sendo alinhavada entre o presidente do STF e do CNJ, Luiz Fux, e o ministro Bruno Dantas, do STJ, que envolve também os presidentes da Câmara, Arthur Lira, e do Senado, Rodrigo Pacheco - para resolver a questão do pagamento dos precatórios e definir espaço orçamentário para o novo Bolsa Família. Resolução, no entanto, que não tem data para acontecer.
"Mas o mercado espera a solução dos precatórios. Não acreditamos que o governo vai furar o teto até o fim do ano. É claro que o ótimo, em relação ao ajuste das contas, já foi embora. Mas entre o ótimo e o apocalipse, tem espaço. E para o Bolsa Família, por lei, é preciso encontrar uma fonte permanente de recursos", conta Rachel. Para tal, o Executivo conta com a melhora na arrecadação de impostos, que vem crescendo nos últimos meses, apesar da insistente alta na inflação, principalmente dos alimentos e dos combustíveis, argumenta a economista.
Para fazer a conta fechar, afirma Rachel de Sá, o governo terá de lançar mão da estratégia "matemática de uma discricionária quase zerada" - as despesas discricionárias são aquelas que o governo tem liberdade para decidir quando e se vai pagar, ao contrário das obrigatórias, que é obrigado a pagar. "É claro que, assim, os investimentos caem. O que se discute, também, são os subsídios e as emendas parlamentares. Mas o governo tem pouca margem de manobra, o que pode trazer no futuro possíveis contingenciamento de recursos", destaca Rachel.
Ela admite que "uma parte da PLDO não reflete o que vai acontecer". "Essa peça orçamentária será apenas uma prévia", diz. Para Cesar Bergo, sócio-investidor da Corretora OpenInvest, Somente o fato de o governo ter falado que ia dar calote nos precatórios, já criou instabilidade no mercado. "A gente espera, obviamente, seriedade no orçamento, mas se formos medir pelo que aconteceu no ano passado, vai ser difícil". Existem interrogações, diz. "Sobretudo, em questões ligadas à pandemia e aos auxílios emergencial e assistenciais. Tem muitas dúvidas", conta Bergo.