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Estado de Minas Endividamento

Com inflação alta, famílias buscam crédito até para ter comida à mesa

Necessidades básicas têm de ser financiadas com cartão, em meio a aumento de preços e desemprego. Ao todo, 11,9 milhões de famílias estão endividadas


06/09/2021 04:00 - atualizado 06/09/2021 07:29

Endividamento das famílias cresce, segundo pesquisa, na esteira do desemprego e dos aumentos dos preços de alimentos, combustíveis e, agora, da energia elétrica
Endividamento das famílias cresce, segundo pesquisa, na esteira do desemprego e dos aumentos dos preços de alimentos, combustíveis e, agora, da energia elétrica (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press - 21/6/21)

Brasília – O alto nível de endividamento das famílias brasileiras preocupa e envolve até mesmo a satisfação de necessidades tão essenciais quanto colocar comida na mesa e abastecer o carro usado para trabalhar. Pesquisa mais recente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) identificou novo recorde no número de endividados em agosto, dessa vez de 72,9%, o que corresponde a 11,89 milhões de famílias com alguma dívida em aberto.


A cuidadora Rosilene de Souza precisa usar o cartão de crédito para fazer as compras do mês, mas se preocupa com o avanço das faturas
A cuidadora Rosilene de Souza precisa usar o cartão de crédito para fazer as compras do mês, mas se preocupa com o avanço das faturas (foto: Bernardo Lima/Divulgação)
A  Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) mostra que grande parte do endividamento das famílias, cerca de 83%, está associada ao uso do cartão de crédito. Nos lares de renda mais baixa, o crédito tem sido utilizado até em itens de primeira necessidade, como alimentos.

“Com a alta inflação sobre itens essenciais na cesta de consumo das famílias de menor renda, (as famílias) acabam tirando espaço do orçamento e se endividando mais, para consumir itens de primeira necessidade, como alimentos. O dinheiro não está chegando até o final do mês e as pessoas estão usando o cartão de crédito para fazer essa cobertura”, explica Izis Ferreira, pesquisadora responsável pela pesquisa da CNC.


(foto: Fernanda Fernandes/Divulgação)

O cartão ajuda porque, às vezes, falta alguma coisa em casa, um leite, e você não tem dinheiro

Manoel Gilmar Lima Mendonça, vigilante

A situação da secretária Maria Rosa Tavares Oliveira, de 39 anos, ilustra bem esse cenário. Ela conta que precisa tomar oito medicações por dia, e, assim, tem de recorrer ao crédito para bancar as outras despesas básicas. “Há meses que não tem como pagar, tenho que apelar para o cartão de crédito. Aí as faturas comem boa parte do meu salário. Quase 30% da renda da minha casa está indo para o pagamento de faturas”, revela.

A cuidadora Rosilene de Souza, de 46, também desabafa. “Mesmo com a ajuda da família, muitas vezes acabo usando o cartão de crédito para fazer a compra do mês. O problema mesmo é que parece um caminho sem saída, parece que a fatura aumenta mais a cada mês que passa”.
 
A CNC identificou que entre os principais fatores por manterem alto o endividamento das famílias estão a expansão do acesso ao crédito, o alto índice de desemprego e a inflação elevada. Na avaliação do  presidente da entidade de classe, José Roberto Tadros, grande parte das dívidas são feitos por trabalhadores informais que recorrem ao crédito para investir em pequenos negócios.

“Mas há uma necessidade grande de planejamento do orçamento familiar para que esse alívio não vire um problema ainda maior do que o que se tinha inicialmente, uma bola de neve”, alerta.
 
De acordo com os dados da pesquisa, o acesso ao crédito por consumidores atingiu 19,2% no primeiro semestre de 2021. A taxa é a maior desde o início de 2013. O crédito mais acessível, com taxas de juros relativamente baixas, contribuiu para o aumento gradual do endividamento, que foi acompanhado, também, pela alta na inflação. Desde novembro, quando estava em 66% de famílias com dívidas a pagar, o endividamento teve elevações consecutivas.
 
Segundo Izis Ferreira, a aceleração começou a ser observada nesse período, não só devido ao maior acesso ao crédito, mas à inflação persistente. “Foi quando começou a acirrar e a gente viu preços dos alimentos, energia e combustíveis subirem mais, e agora está extremamente intenso por conta dos aumentos na energia elétrica”, afirma a pesquisadora.

Acesso 'facilitado'


As instituições financeiras têm disponibilizado cada vez mais crédito à população. O banco digital Nubank, por exemplo, anunciou recentemente a ampliação de limite de cartão de crédito a 35 milhões de clientes nos próximos 12 meses. O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, lançou, no fim de agosto, linha de crédito que deverá atender 100 milhões de pessoas. O executivo sustentou que o produto deverá ser “a maior operação de crédito da história do Brasil” e “revolução no mercado financeiro”.
 
A maioria dos grandes supermercados, atualmente, tem seus próprios produtos de crédito para compra exclusiva nos estabelecimentos credenciados. É o caso do Grupo Pereira, que administra três grandes marcas de supermercado no país e que, há cerca de três anos, lançou o Vuon Card. De acordo com Rafael Souza, diretor de Negócios do produto, o aumento no uso de crédito apontado pela CNC reflete na demanda pelo cartão.
 
“A gente tem tido crescimento muito forte. O  segmento de supermercados, por ser um serviço essencial, teve pouco impacto da pandemia, e o cartão teve maior procura no período”, afirma Souza. Ele disse que a burocracia é mínima para os consumidores que queiram fazer um cartão do grupo.
 
Um desses consumidores é o vigilante Manoel Gilmar Lima Mendonça, de 46. Ele conta que costuma comprar no crédito na maioria das vezes e que o cartão para compra exclusiva no supermercado já o salvou em diversas situações de aperto. “O cartão ajuda porque, às vezes, falta alguma coisa em casa, um leite, e você não tem dinheiro, mas tem o cartão que te permite comprar”, afirma.

NO SUFOCO


Percentual de famílias brasileiras endividadas

Período                                        Taxa %

2020

Junho                                                67,1
Julho                                                 67,4
Agosto                                               67,5
Setembro                                           67,2
Outubro                                              66,5
Novembro                                           66
Dezembro                                           66,3

2021


Janeiro                                                66,5
Fevereiro                                             66,7
Março                                                  67,3
Abril                                                    67,5
Maio                                                    68,9
Junho                                                   69,7
Julho                                                    71,4
Agosto                                                  72,9

Fonte: CNC



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