Após ter enfrentado a dura vida sem trabalho durante dois anos e meio, o vendedor Victor Hugo Solano, de 24 anos, foi beneficiado pela recuperação do emprego neste ano, em Belo Horizonte. “Gosto muito da área de vendas e espero dar o meu melhor a partir de agora, que voltei a trabalhar”, diz ele, entusiasmado com o trabalho conquistado numa sapataria instalada na Savassi, Região Centro-Sul da capital.
Grandes municípios, além de BH, a exemplo de Contagem, Betim e Nova Lima, na Região Metropolitana; Uberlândia e a vizinha Uberaba, no Triângulo; e Ipatinga, no Vale do Aço mineiro, tiveram dinamismo para impulsionar as vagas no estado. Com o fôlego dessas cidades que têm expressiva participação na produção mineira de bens e serviços, Minas chegou à marca de 10,1 milhões de pessoas ocupadas de janeiro a setembro, último dado disponível em estudo sobre o mercado de trabalho feito pela Fundação João Pinheiro e a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social (Sedese)
A população ocupada em Minas cresceu 10,8% frente ao último trimestre do ano passado. Apesar disso, o total de empregados no estado ainda está 2,2% abaixo do universo do terceiro trimestre de 2019, período pré-pandemia de COVID-19, quando 10,3 milhões estavam trabalhando, o que leva a um cenário de incertezas no próximo ano. Ouro Preto e Jeceaba, na Região Central do estado; Pedra do Indaiá, no Centro-Oeste; Porteirinha, no Norte; e Guapé, no Sul, ainda vivem consequências negativas da crise econômica e foram as cidades que demitiram mais que contratam até setembro.
O avanço da geração de empregos resultou, em boa parte, do aumento da informalidade. Esse fenômeno ocorreu depois de expressivo crescimento do universo de trabalhadores sem carteira em 2020 no estado, equivalente a 221 mil pessoas a mais, representando acréscimo de 20,6%. Enquanto isso, foram criados 203 mil postos de trabalho com carteira, elevação de 5,8% no ano passado. Neste ano, de julho a setembro, Minas registrou mais 81 mil empregos formais e 102 mil sem registro, em comparação com o período de abril a junho.
"É muito mais difícil e cansativo trabalhar na rua"
Isabele Vitória Gomes, estudante de enfermagem e confeiteira
“A informalidade é uma preocupação. Percebemos muitas falências de empresas durante a pandemia e ainda não sabemos o quanto isso afeta os trabalhadores de baixa qualificação. A maioria perde empregos e vai para a informalidade, o que agrava a disparidade no mercado de trabalho”, afirma Denize Maia, pesquisadora da Fundação João Pinheiro.
Segundo ela, as atividades com maior nível de qualificação serão as que terão mais ofertas de emprego no futuro. “Alguns estudos indicam que as ocupações que vão se expandir mais são as de mão de obra especializadas, como ciência, tecnologia, saúde e engenharia. Por outro lado, as que terão menor demanda são as voltadas para serviços como alimentação, atividades administrativas e de atendimento ao público”, destaca a pesquisadora.
A estudante de enfermagem Isabele Vitória Gomes, de 21 anos, precisou recorrer ao trabalho informal para pagar os estudos. Demitida no início do ano de uma loja de roupas masculinas, ela busca recursos por meio da venda de doces caseiros pelas ruas do Centro de Belo Horizonte.
“Quando era mais nova, fiz o curso de confeitaria. Tinha que conseguir uma forma de ganhar meu dinheiro para pagar a mensalidade da faculdade, já que fiquei sem trabalho. Até procurei emprego com carteira assinada, mas não encontrei. E minha família me sugeriu eu investir na atividade. Estou satisfeita, mas é muito mais difícil e cansativo trabalhar na rua”, afirma a estudante, que espera conquistar vaga de estágio na área que escolheu em 2022 e também investir no negócio próprio.
"Preciso aumentar minha renda, porque minha situação não está fácil"
Fernando de Jesus Silva, pedreiro sem carteira de trabalho
Onde encontrar
Em Minas Gerais, Belo Horizonte é líder no ranking de admissões formais (400,7 mil) e demissões (344,8 mil) de janeiro até outubro, segundo os dados mais recentes do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho e Previdência. O saldo de empregos com carteira assinada na capital, que comanda o carro-chefe dos mai- ores municípios em relação ao Produto Interno Bruto (PIB, o conjunto da produção de bens e serviços do estado), foi de 56.926 oportunidades.
Por sua vez, em Uberlândia, responsável pelo segundo PIB de Minas, a diferença entre contratações e dispensas somou 12.559 postos de trabalho. O município foi seguido por Contagem (10.868), Betim (8,5 mil) e Ipatinga (5.860). Na direção oposta, o pior desempenho do emprego formal foi observado em Ouro Preto, na Região Central do estado, onde 930 vagas foram eliminadas a mais que as admissões. Em Porteirinha, no Norte, o saldo de oportunidades no mercado de trabalho ficou negativo em 329 vagas.
Apesar do aumento da população ocupada no estado, neste ano, o número de desempregados em Minas permanece elevado, de 1,2 milhão, de acordo com a edição de julho a setembro último da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A taxa de desemprego recuou de 12,6% entre abril e junho para 10,7% no trimestre terminado em setembro. Houve queda de 13,2% no número de desocupados.
"Se tudo evoluir, podemos reforçar nosso quadro no futuro"
Regina Farah, empresária do setor de moda
Fôlego curto das vagas para incluir 1,2 milhão
Com mais de 1,8 milhão de contratações no acumulado de janeiro a outubro, Minas Gerais teve saldo líquido positivo de 300,6 mil empregos formais, descontadas 1,4 milhão de demissões. Ainda que os resultados sinalizem esperança para os desempregados, a fila de 1,2 milhão de pessoas que estão em busca de emprego é gigantesca. Nela está o pedreiro Fernando de Jesus Silva, de 32 anos, que sobreviveu os últimos anos exercendo atividades sem carteira assinada.
A meta de Fernando Silva, agora, é conquistar emprego formal. “Preciso aumentar minha renda, porque minha situação não está fácil, pelo contrário, está muito complicada. Temos que buscar sempre uma melhora. Há alguns anos vivo de serviços sem carteira assinada, mas um amigo teve um acidente de trabalho e isso me motivou a conseguir um trabalho fixo”.
Quem teve a sorte de voltar ao mercado foi o vendedor Victor Hugo Solano, de 24, contratado em meados de outubro. O professor de economia da UFMG Mário Rodarte avalia que o Brasil ainda tem desafios para atingir um patamar satisfatório de recuperação dos empregos perdidos durante a crise. “A pandemia foi um momento excepcional, com redução da taxa de admissões e a distribuição do auxílio emergencial para pessoas que saíram do mercado de trabalho. Mas, quando você compara ao período pré-pandemia, ainda temos um nível de ocupação menor, até porque houve taxa de crescimento zero no Brasil. Mas a recuperação ainda se mostra tímida.”
Segundo ele, as ações praticadas pelo Ministério da Economia para frear a retração podem tomar efeito contrário em 2022. “O aumento da taxa básica de juros praticada pelo governo, que alguns analistas acreditam ser uma medida correta para o controle da inflação, tende a inibir o consumo e o investimento. Há um certo pessimismo de que essa recuperação continue sendo lenta, podendo ser convertida em nova contração devido à política monetária”.
Para quem tem a incumbência de contratar, o sentimento ainda é de cautela. Proprietária da rede de lojas Betina, a empresária Regina Farah diz que só vai readmitir funcionários se o faturamento tiver aumento considerável no próximo ano. “Ficamos dois anos com o comércio fechado e tivemos de reduzir o quadro de trabalhadores. Estamos vendo uma melhora na economia com a reabertura das atividades e esperamos seguir nesse ritmo. Se tudo evoluir, podemos reforçar nosso quadro no futuro”, afirma.