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Estado de Minas ECONOMIA

PIB brasileiro cresce em 2021, mas 4 riscos trazem nuvens pesadas para 2022

Inflação, juros, gargalos de produção e incerteza com guerra pioram quadro pouco favorável. Em 2021, serviços foram destaque, graça ao avanço da vacinação


04/03/2022 09:46 - atualizado 04/03/2022 11:46

A economia brasileira cresceu 4,6% em 2021 e 0,5% no quarto trimestre, em relação ao terceiro, informou nesta sexta-feira (04/03) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Ambos os resultados representam uma recuperação, após queda de 3,9% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2020 e recuos de -0,3% e -0,1%, respectivamente, no segundo e terceiro trimestres de 2021 (o dado do segundo trimestre foi revisado de -0,4% divulgado anteriormente).

No ano passado, os principais destaques positivos da atividade foram o setor de serviços (em alta de 4,7%), impulsionado pelo avanço da vacinação, e a indústria, que cresceu 4,5%, após tombo de 3,4% no primeiro ano da pandemia.

O setor agropecuário registrou queda de 0,2% em 2021, impactado por quebras de safras devido a questões climáticas e problemas na cadeia de produção pecuária.

Na ponta da demanda, os investimentos cresceram impressionantes 17,2% em 2021, sob efeito dos juros baixos no início do ano passado — é preciso lembrar que a Selic começou 2021 em 2%, menor patamar da história.

Apesar do crescimento bem acima dos anos anteriores, economistas avaliam que há pouco a se comemorar com o resultado do PIB em 2021. Isso porque boa parte do crescimento é resultado da comparação com o ano fraco de 2020 e o avanço de 4,6% do PIB brasileiro em 2021 é inferior ao de países vizinhos como Colômbia (10,6%) e Argentina (10,3%).

Para 2022, as perspectivas já eram pouco animadoras, com economistas prevendo PIB estagnado — isto é, com variação zero ou próxima de zero —, devido principalmente ao efeito da forte alta de juros sobre a economia.


Um membro das Forças de Defesa Territoriais guarda um posto de controle, na Praça da Independência, no centro de Kiev
Incerteza com guerra na Ucrânia piora quadro já pouco favorável para este ano (foto: Reuters)

A esse cenário pouco otimista somou-se a guerra na Ucrânia, que traz ao menos quatro riscos adicionais para a atividade esse ano: o de uma piora na inflação devido à alta de preços das commodities; de juros elevados por mais tempo, na tentativa de conter esse aumento da inflação; de continuidade dos gargalos de produção na indústria; além de um aumento da incerteza, que inibe os investimentos das empresas.

Entenda o que aconteceu com o PIB em 2021, como ficou o quarto trimestre e o que vem pela frente em 2022, em meio às incertezas geradas pelo conflito no Leste Europeu.

2021: serviços em destaque, mas pouco a comemorar

Rodolfo Margato, economista da XP Investimentos, destaca o bom desempenho do setor de serviços em 2021, com crescimento de 4,7%, após queda de 4,3% em 2020.

"Aqui a maior influência, a partir da metade do ano, veio da reabertura econômica. Depois de muitas idas e vindas, a campanha de vacinação contra covid-19 ganhou tração ao final do segundo trimestre, permitindo o retorno de uma série de atividades que impulsionaram o setor terciário na segunda metade do ano", observa o analista.

Ele destaca os serviços prestados às famílias, como turismo, hospedagem, bares e restaurantes; além do desempenho sólido dos serviços de informação e comunicação, resultado da dinâmica da pandemia; e transportes, com a retomada da mobilidade.

Na indústria, que registrou uma alta de 4,5% em 2021, após queda de 3,4% no ano anterior, o quadro é um pouco mais complexo.

Margato observa que boa parte do crescimento registrado no ano passado se deve à base de comparação fraca de 2020. Mas, olhando o resultado a fundo, há desigualdade importantes.

A construção civil registrou uma alta de 9,7% no ano passado, com retomada das obras particularmente no segmento imobiliário residencial. Já a indústria de transformação cresceu 4,5%, após uma queda de 4,4% em 2020, com o crescimento contido por gargalos de produção, com alta de custos e escassez de matéria-prima em setores diversos, como o automotivo.

Com queda de 0,2%, o setor agropecuário foi impactado positivamente pelo crescimento da safra de soja no primeiro trimestre. Mas, ao longo do ano, culturas como milho, café, cana-de-açúcar e algodão tiveram quebras de safras importantes, devido a problemas climáticos.

"A leitura que fica de 2021 é que o Brasil está crescendo muito menos do que seus pares", avalia Marcos Ross, economista-chefe do banco Haitong.

"Estamos crescendo 4,6%, até que é bastante para o quadro recente de Brasil, mas é muito menos do que Colômbia e Argentina, que estão crescendo acima de 10%. E tem muito de efeito estatístico no nosso crescimento, devido à base fraca de 2020."

4º trimestre: agro forte, mas calma lá

Se em 2021 o efeito estatístico teve papel importante na alta de 4,6% do PIB, no quarto trimestre não foi diferente.

O grande destaque no crescimento de 0,5% da economia em relação ao terceiro trimestre foi o avanço de 5,8% da agropecuária, mas isso se deve em forte medida a um efeito "rebote", após queda de 7,4% no terceiro trimestre, resultado de uma combinação de seca, geadas e o fim da safra de soja.

Já o setor de serviços teve uma alta mais modesta, de 0,5%, ainda sob impulso do avanço da vacinação, mas com destaque negativo para o comércio, que registrou queda de 2% em relação ao trimestre anterior, sob impacto da perda de renda da população, diante do avanço da inflação.

O "rebote" da agropecuária e a ligeira alta do PIB de serviços compensaram uma queda de 1,2% da indústria, que teve desempenho negativo em quase todos os setores: extrativa (-2,4%), transformação (-2,5%), eletricidade (-0,2%). A exceção foi novamente a construção, com avanço de 1,5%.

2022: com guerra, novos riscos

Ao fim do ano passado, os economistas estavam pessimistas com as perspectivas para o PIB em 2022, prevendo um desempenho muito próximo de zero.


Frentista abastecendo carro
Uma das preocupações é com a piora na inflação devido à alta de preços das commodities, que pode se refletir no preço dos combustíveis (foto: Getty Images)

Alguns fatores contribuíam para isso: a fraca herança estatística deixada por 2021 para esse ano (de apenas 0,1%); a forte alta de juros, com a Selic indo de 2% em janeiro do ano passado para 10,75% em fevereiro de 2022, com perspectiva de superar os 12% nos próximos meses; a perspectiva de uma inflação persistente, mesmo diante dos juros altos; e o clima negativo para negócios, devido às incertezas do ano eleitoral.

Nesse começo de ano, porém, a coisa tinha mudado um pouco, e alguns economistas estavam mais otimistas.

Eles estavam olhando para uma série de fatores promissores: a atividade em recuperação no quarto trimestre de 2021, após dois trimestres de queda no PIB; a perspectiva de avanço de concessões e privatizações neste ano; municípios e Estados de caixa cheio após a arrecadação recorde de 2021, que pode se traduzir em investimentos; e a perspectiva de uma série de estímulos à economia por um governo Bolsonaro de olho na reeleição.

Mas então veio a guerra na Ucrânia. O otimismo perdeu força e os economistas agora avaliam que há quatro riscos principais para a atividade nesse ano.

"Ficou para atrás a possibilidade de normalização das cadeias produtivas com esse novo choque da guerra. Esse novo cenário pode pressionar a indústria ainda mais, tanto em custos, como em dificuldade de acesso a matérias-primas", observa Luana Miranda, economista da gestora de recursos GAP Asset.

Outra preocupação agora é com uma piora da inflação, diante da forte alta de commodities como petróleo, gás natural, minerais e alimentos como trigo, milho e soja, que podem ser impactados ainda por uma eventual escassez global de fertilizantes.

"Tem um viés altista para a inflação. A parte de combustíveis é uma preocupação: a defasagem dos preços domésticos em relação aos preços internacionais de gasolina chegou em 30%. Isso é muito alto, pois a defasagem costuma rodar em torno de 10%. A Petrobras não deve conseguir segurar essa defasagem por muito tempo sem reajustar os preços", diz Miranda, ponderando que o real valorizado em relação ao dólar ajuda a evitar um quadro ainda pior.

Segundo Margato, da XP, alguns setores da economia brasileira podem se beneficiar dessa alta de preços das commodities, como o agronegócio, que vai vender seus produtos a valores mais altos. Mas o efeito líquido de uma inflação maior é negativo para a economia em geral.

"Inflação mais alta tira poder de compra das famílias", diz Margato, destacando a queda da renda dos brasileiros que persiste há pelo menos seis meses, como resultado da inflação.

Com a carestia persistente, o Banco Central pode optar por manter os juros altos por mais tempo, o terceiro fator de atenção para a atividade.

"Nas nossas contas, a Selic chega a 12,75% em junho. Antes, achávamos que após as eleições de outubro, haveria espaço para o Banco Central começar a cortar a taxa básica de juros, mas a depender da evolução do conflito militar, talvez o Banco Central decida postergar um pouco esse corte. Isso também significa uma atividade doméstica mais fraca adiante", afirma o analista da XP.

Por fim, o último ponto de atenção nesse novo cenário trazido pelo conflito no Leste Europeu é o aumento das incertezas.

"Diante de um quadro de maior percepção de risco, de um quadro econômico mais nublado, isso pode deprimir a confiança dos empresários e postergar decisões de investimentos. Isso impacta o sentimento econômico e pode também atrapalhar a dinâmica da atividade", completa Margato.

Marcos Ross, do Haitong, destaca que tudo vai depender da duração da guerra.

"O Brasil não é uma economia muito aberta, somos historicamente fechados e muito protecionistas. Então não temos uma raiz de crescimento voltada ao comércio exterior", observa.

"Agora, se a alta de preços de commodities persistir ao ponto de impactar a atividade da China, pode haver um efeito de desaceleração econômica mais complicado."

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