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Estado de Minas Inflação na mesa

Frete e insumos pressionam lavouras em recuperação

Cinturão verde da Grande BH nem sequer se reergueu dos estragos das chuvas e sente alta dos combustíveis e de matérias-primas


06/04/2022 04:00 - atualizado 05/04/2022 23:32

 o meeiro Eustáquio Andrade tratou a terra e faz novo plantio
Após perder 5 mil pés de alface em fevereiro, o meeiro Eustáquio Andrade tratou a terra e faz novo plantio, como outros trabalhadores na região de Mário Campos (foto: Fotos: Jair Amaral/EM/D.A Press)

Os tons de verde voltaram a colorir o cinturão de plantio de hortaliças que atende os consumidores da Região Metropolitana de Belo Horizonte, após as chuvas intensas do começo do ano. Os temporais castigaram as pequenas e médias plantações e provocaram altas inéditas nos preços de verduras, legumes e frutas. Esses produtos já voltaram a florescer nos canteiros, mas a demanda do consumidor ainda é maior que a oferta e a expectativa é de que o desequilíbrio persista até a próxima estação chuvosa, em setembro, mantendo alto o custo desses alimentos para as famílias. Outros dois fatores que pressionam a inflação dos hortigranjeiros são os aumentos das despesas nas lavouras e a elevação dos preços dos combustíveis, encarecendo o frete do transporte das mercadorias.

No atacado da CeasaMinas, entreposto da companhia de abastecimento em Contagem, na Grande BH, os preços disparam, enquanto o volume de produtos oferecidos caiu, diante das plantações ainda em recuperação. Estudo feito pela CeasaMinas mostrou redução de 3,6% na oferta de hortigranjeiros em fevereiro. As chuvas destruíram algumas lavouras, como as de cenoura. Entre as hortaliças, o preço médio aumentou 18%. Ovos ficaram 45% mais caros na negociação entre produtores e intermediários devido também à aproximação do período da quaresma.

A situação nas hortas de Mário Campos, Ibirité, Sarzedo e Brumadinho, cidades no entorno da capital mineira, é de intenso trabalho para recuperar os terrenos e acelerar os plantios. O serviço começa as 4h. Contudo, existe uma barreira, a do fornecimento de mudas para quem não tem produção própria.

A região também enfrenta dificuldades com o fornecimento de energia. Na última terça-feira, diversas equipes da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) ainda trabalhavam na recuperação e recomposição da rede elétrica. As chuvas encharcaram o solo, provocando muitas quedas de árvores sobre as redes de fornecimento de eletricidade. Os ventos derrubaram postes em toda a zona rural da região.

Ramon Rodrigues Campos, de 36 anos, é filho de um proprietário de sete hectares de plantio de hortaliças em Mário Campos, Artur Campos Filho, de 71, que sempre trabalhou na produção local. O carro-chefe é o chuchu, seguido de brócolis. Cinco meeiros trabalham na área. Segundo Ramon, os dois primeiros meses do ano foram “difíceis”, até mesmo para o chuchu, que necessita de muita irrigação. “Perdemos grande parte da lavoura e o brócolis nem sequer chegou ao início da produção, por ser mais sensível a grandes volumes de água.”

O produtor considera que a recuperação tem sido positiva. As plantas mortas são arrancadas. Contudo, no cultivo do chuchu são necessários 4 meses entre o plantio e a colheita. “Nunca vi preço tão alto como no início do ano, quando chegou a R$ 100 a caixa de 20 quilos. Nesta semana caiu para R$ 20 a caixa.”, diz o produtor.

O preço do combustível pesa também, mas não tanto porque a propriedade tem transporte próprio, conta Ramon. “Se tivéssemos que pagar frete, a história seria outra”, pondera. Para administrar melhor as despesas, segundo ele, a solução é manter os caminhões carregados tanto na ida quanto na volta do entreposto da Ceasa na Grande BH. “Tudo isso na ponta da caneta para que não fiquemos dependentes só da lavoura.”

Os meeiros das terras de Ramon, Raul Herculano Martins de Souza, de 26, e Edir Catarino da Silva, de 46, começam o trabalho por volta das 4h. Eles colhem, em média, 100 caixas de chuchu por semana, cada um. Ambos falam do início de 2022 como “o pior” de sua vida no campo. “A colheita foi péssima, mas estamos retomando aos poucos e os preços estão muito bons, somados com o retorno de muitas atividades paralisadas pela pandemia.”

'Bate copo' 

“Perdemos 85% de tudo o que produzimos”, conta o meeiro Josinei Andrade Faria, de 31, que arrenda uma área com outros quatro meeiros. Ele planta alfaces crespa, comum e americana, além de coentro, brócolis ninja e comum, e milho durante o período em que o solo tem de ser renovado. A jornada dele começa a partir de 6h, mas tem de ser antecipada quando o calor se torna intenso ou falta água.

Com agilidade, ele “bate copo”, como classifica o ato de proteger pequenas mudas de alface com um copo plástico para fazer a capina química ao redor da planta. A alface que começa a brotar só será colhida em dois meses, “se o clima estiver bom”, destaca Josinei. A melhor época ocorre por volta de junho, quando o clima frio e de pouca chuva ajuda no desenvolvimento da planta. A colheira pode ser feita em 30 dias e é menor a quantidade necessária de adubo.

Colhidas diariamente, as verduras são repassadas, diretamente, a sacolões da região metropolitana da capital, sem passar pela CeasaMinas. Segundo o produtor, uma caixa com 36 pés de alface é vendida ao custo aproximado de R$ 20. “Mas tem variado a cada semana. Os melhores preços são em janeiro, mas não tínhamos para oferecer.”

Eustáquio dos Santos Andrade, de 42, meeiro há um ano e meio, planta alface e mostarda. “Em fevereiro, perdemos praticamente tudo. Quando estiou, tratamos a terra e, agora, plantamos de novo. Só de alface perdemos 5mil pés. Não tivemos como trabalhar", desabafou.

Nas terras em que Ramon Campos compartilha resultados, plantio de chuchu foi refeito
Nas terras em que Ramon Campos compartilha resultados, plantio de chuchu foi refeito, mas transporte tem custo alto


NO SUFOCO

3,6%

Foi a queda, em fevereiro, da oferta de hotifrútis no atacado da Ceasa Minas na Grande BH

18%

Foi a remarcação dos preços das hortaliças vendidas no atacado do entreposto de Contagem


No varejo, preços mais que dobram

O site de pesquisas de preços Mercado Mineiro e o aplicativo ComOferta apuraram significativa elevação de preços ao consumidor, neste mês, em sacolões de Belo Horizonte. As remarcações foram identificadas em levantamento feito entre os dias 9 e 11 em 18 estabelecimentos da capital na comparação com as tabelas de janeiro. O repolho comandou os aumentos, com a farta variação de 152%. O preço médio do quilo do produto subiu de R$ 2,51 para R$ 6,34.

O quilo da abóbora passou a ser vendido a R$ 6,99, frente aos R$ 2,91 anteriores, diferença de 140%. Houve reajuste expressivo de preços também para o quilo da cenoura, que foi encontrado a R$ 10,95, em média, 83% a mais que o custo verificado em janeiro, de R$ 5,96. Entre os produtos que tiveram menor aumento frente ao começo do ano estão o tomate, a cebola branca, a alface americana e a cebolinha, com altas que variaram de 20% a 30%, mas, ainda assim, apresentando valores expressivos.

O preço médio do quilo do tomate comum passou de R$ 7,93 para R$ 10,32, aumento de 30%. O quilo da cebola branca subiu de R$ 4,11 para R$ 5,14, acréscimo de 24,95%. A alface americana ficou 31% mais cara, saindo de R$ 3,99 para R$ 5,24 a unidade. A cebolinha, que custava R$ 1,76, foi encontrada a R$ 2,32 neste mês, ou seja, 32% mais cara. De acordo com a pesquisa, os únicos itens que apresentaram queda de preços foram a banana-prata, de R$ 6,84 para R$ 5,16, redução de 24%, e o abacate, cujo preço médio do quilo caiu de R$ 12,20 para R$ 8,17, recuo de 33%. 

Produtor de mudas, Lúcio Oliveira
Produtor de mudas, Lúcio Oliveira diz que desequilíbrio com demanda superior à oferta tende a se manter


Demanda de mudas supera a produção

Após dois anos de pandemia de COVID-19, aumento de combustíveis e fretes de transporte, enchentes, tempestades e chuvas de granizo desorganizaram todo o sistema produtivo e de distribuição. O momento é de preparar a terra e ordenar os plantios das mudas, setor com dificuldades para suprir a grande demanda.

Lúcio Moreira de Oliveira, de 65 anos, empresário proprietário da LM Viveiros, fornece mudas, entre outras, de alfaces crespa, lisa, roxa e americana; acelga, brócolis comum e ninja(japonês), couve, beterraba, repolho, cebolinha, salsa, coentro, rúcula, em Mário Campos, Brumadinho, Sarzedo, Ibirité, BH e Betim. Ele diz que a demanda está acima da capacidade produtiva da matéria-prima.

“As chuvas de janeiro e fevereiro foram muito além dos limites. Houve enchentes e muita gente perdeu toda a produção. Quem tinha horta, precisou esperar secar para depois preparar a terra e agora adquirir mudas. Então, houve um choque entre o estoque de mudas e a demanda, já que tudo estava perdido. Os viveiristas não estavam preparados para tamanha perda. Se havia mil bandejas, o mercado precisava de 10 mil.”

Segundo o produtor, a expectativa é de que essa defasagem continue com o mercado aquecido. A empresa de Lúcio Oliveira conta com oito estufas, cada uma comportando em torno de mil bandejas. Cada bandeja tem 200 células (mudas). Mesmo assim, a demanda não é atendida. Situação climática semelhante Oliveira diz ter visto apenas em 1997, “quando as chuvas provocaram inundações, mas em menor espaço de tempo e sem a antecedência de uma pandemia”.

Acima da média 

De acordo com o boletim meteorológico do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), fevereiro foi um mês chuvoso em Minas Gerais devido à atuação de episódios da Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS). As condições climáticas observadas nos períodos de 7 a 12 e 18 a 21 do mês passado, provocaram chuvas frequentes em grande parte do estado, com maiores acumulados na região central mineira, Alto Paranaíba, na área metropolitana de Belo Horizonte e Zona da Mata. Os totais mensais variaram aproximadamente entre 100 e 500 milímetros, tendo superado a média histórica para fevereiro em quase todas as regiões do estado.

Em janeiro, na Região metropolitana de BH, o período seco se deu apenas durante nove dias consecutivos. A precipitação total mensal superou a média histórica em quase todo o estado, situando-se no intervalo médio apenas no Leste e no Vale do Jequitinhonha. O final do primeiro decênio registrou níveis superiores a 600 milímetros na RMBH. (EG)


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