A economia brasileira cresceu 1% no primeiro trimestre de 2022, em comparação com os três últimos meses de 2021, informou nesta quinta-feira (2/6) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Na comparação com igual período do ano anterior, o PIB (Produto Interno Bruto) apresentou crescimento de 1,7%. Em valores correntes, o PIB chegou a R$ 2,249 trilhões.
O resultado era esperado por analistas. Segundo especialistas consultados pela BBC News Brasil, o crescimento traduz resultados positivos impulsionados pela reabertura econômica e uma recuperação do mercado de trabalho, somados à valorização das commodities no cenário global.A retomada é impulsionada pelo setor de serviços, que cresceu 1% no primeiro trimestre de 2022, segundo o IBGE.
Mas, de acordo com cientistas políticos e economistas, a divulgação do dado não deve ter grande impacto na decisão de voto do eleitorado brasileiro.
Isso porque, segundo os especialistas, o resultado positivo do PIB nem sempre está alinhado com uma sensação positiva e otimista em relação à economia entre a população. Outros fatores, como a alta da inflação e as taxas de desemprego, podem pesar muito mais no momento em que o brasileiro vai à urna.
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Puxada pelo valor de alguns alimentos e dos combustíveis, a inflação oficial de preços no Brasil alcançou 12,13% em maio, no acumulado dos últimos 12 meses, segundo o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor).
"Na minha experiência, o crescimento do PIB em um patamar como esse demora a refletir em uma sensação positiva na opinião pública. Especialmente porque o crescimento é normalmente observado de forma heterogênea entre as diferentes regiões e setores da população", diz Mauricio Moura, presidente do Instituto Ideia e professor da Universidade George Washington, nos EUA.
Segundo o doutor em economia e política, a maior parte do eleitorado não está atenta à divulgação de índices macroeconômicos, mas sim à forma como a economia afeta seu dia a dia.
"As pessoas estão lidando com a dificuldade de pagar contas, encontrar emprego e sobreviver - e muitas vezes não entendem como os dados de crescimento que veem na televisão podem dialogar com a perda de renda que observam no seu dia a dia", afirma Moura.
Rodolfo Margato, economista da XP, pondera que o cenário macroeconômico atual produz sinais mistos para a percepção do consumidor e do trabalhador.
"Por um lado, observamos um crescimento da confiança dos consumidores e dos empresários na economia no período recente, o que está diretamente relacionado ao melhor desempenho do PIB e a uma melhora no mercado de trabalho", diz o especialista.
"Mas tem o outro lado da história: uma inflação bastante elevada, que acaba machucando o sentimento econômico da população", complementa Margato.
O Índice de Confiança Empresarial (ICE), calculado pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e citado pelo especialista, avançou 2,9 pontos de abril para maio deste ano. Essa foi a terceira alta consecutiva do indicador, que atingiu 97,4 pontos, em uma escala de 0 a 200 pontos, o maior nível desde outubro de 2021 (100,4 pontos).
Quando se trata do mercado de trabalho, o principal índice de avaliação é a taxa de desemprego. Segundo a última divulgação do IBGE, de 31 de maio, a taxa caiu para 10,5% no trimestre encerrado em abril, para o menor nível desde 2016. Mas a falta de trabalho ainda atinge 11,3 milhões de brasileiros.
O que está por trás do crescimento da economia?
De acordo com os dados divulgados pelo IBGE, houve queda na Agropecuária (-0,9%), mas estabilidade na Indústria (0,1%) e elevação dos Serviços (1%) no primeiro trimestre de 2022.
No setor externo, as Exportações de Bens e Serviços cresceram 5%, enquanto as Importações de Bens e Serviços caíram 4,6% em relação ao quarto trimestre de 2021.
Segundo Margato, os maiores fatores que impulsionam a alta do PIB são a reabertura econômica após a pandemia, a valorização das commodities no cenário global e a recuperação do mercado de trabalho.
"O primeiro fator por trás desse crescimento, e talvez o mais importante, é a reabertura econômica com o benefício adicional da flexibilização mais recentes de medidas restritivas contra à covid-19, como a não obrigatoriedade do uso de máscara em locais fechados, especialmente nas áreas de varejo e lazer", diz o economista.
Ao mesmo tempo, os patamares bastante elevados de preços de commodities no mercado global têm beneficiado o Brasil, que é um grande exportador líquido de commodities como a soja e o minério de ferro.
"Há um impacto direto sobre os setores que exportam commodities, como o agronegócio e o extrativismo mineral. A rentabilidade maior acaba ainda transbordando para outras atividades, como comércio e serviços."
Por fim, Margato explica que com a reabertura da economia, muitas atividades e serviços que são intensivos em mão de obra passaram a contratar mais nos últimos meses.
"É verdade que em termos de salário médio os níveis ainda estão relativamente baixos, ainda muito aquém do que observávamos antes da pandemia, mas há sinais inequívocos de uma recuperação sólida do emprego", diz.
A previsão da XP é de que a tendência de crescimento da economia se mantenha também no segundo semestre. No entanto, a partir do 3º trimestre, a consultoria espera uma queda como consequência da desaceleração da demanda doméstica e da elevação da taxa de juros.
Inflação e defasagem salarial
Para a professora de Ciência Política da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) Maria do Socorro Braga, apesar da notícia boa em relação ao crescimento da economia, o impacto da inflação no poder de compra e a defasagem salarial são dois fatores percebidos com mais intensidade pelo eleitor atualmente do que os números do PIB.
"Do ponto de vista do comportamento eleitoral, o voto pode ser bastante influenciado pela economia, ainda mais em um ano como esse, após uma pandemia", diz.
"Mas a divulgação do indicador pelo IBGE afeta apenas as camadas mais atentas e que têm amplo conhecimento do que o PIB significa para a economia. Em um contexto de inflação de dois dígitos, o que a maior parte das pessoas percebe mesmo é o seu poder de compra sendo corroído."
Nesse contexto, segundo Braga, a candidatura do presidente Jair Bolsonaro (PL) à reeleição é a mais prejudicada, já que a população tende a atribuir o atual cenário econômico ao líder incumbente.
"Não é esse crescimento do PIB no primeiro trimestre que vai gerar grandes mudanças nas pesquisas eleitorais. A não ser, é claro, que junto com isso sejam lançadas novas políticas econômicas que venham a reduzir o desemprego e a inflação e a aumentar o poder de compra em pouquíssimo tempo", diz.
A mais nova pesquisa eleitoral FSB/BTG, divulgada em 30 de maio, aponta o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) com 46% das intenções de voto no primeiro turno, à frente de Bolsonaro, com 32%.
Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB) e André Janones (Avante) tiveram 9%, 2% e 1% das intenções, respectivamente. Os demais não pontuaram.
'Reeleição é sobre economia'
Uma pesquisa Datafolha realizada entre 25 e 26 maio mostrou que a maioria dos brasileiros considera que a economia será determinante para definir seu voto na eleição de outubro.
Entre os entrevistados, 53% consideram que a situação econômica está tendo "muita influência" na sua decisão de voto.
Somados aos que acham que a economia tem "um pouco de influência" (24%) nessa escolha, a importância do tema atinge 77% —enquanto 21% não veem influência alguma.
"É um clichê, mas as reeleições são decididas por desempenho econômico", diz Mauricio Moura. "O Brasil teve vários presidentes eleitos ou reeleitos por influência da economia".
No cenário atual, a percepção da situação econômica pela população ajuda a explicar o desempenho de Jair Bolsonaro nas pesquisas. Segundo o Datafolha, entre março e maio, subiu de 46% para 52% a parcela de quem considera que sua situação econômica piorou nos últimos meses.
Entre os eleitores do atual presidente, a possibilidade de uma mudança de voto devido a uma piora da economia é cerca de dez pontos percentuais maior do que entre os simpatizantes do ex-presidente Lula.
Se a inflação aumentar, por exemplo, 32% dos eleitores do presidente podem mudar o voto, segundo a pesquisa. Entre os de Lula, são 23%.
"O levantamento do Datafolha ajuda explicar as razões porque, pela primeira vez, um incumbente começa o ano eleitoral sem conseguir reverter sua posição de desvantagem", diz Maria do Socorro Braga.
Se não vencer, Bolsonaro será o primeiro presidente a não se reeleger entre todos os que puderam concorrer, desde a redemocratização, a um segundo mandato.
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