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Estado de Minas DINHEIRO NO BOLSO

Auxílio Brasil: alívio relativo e com efeito eleitoral incerto

Beneficiários do programa federal consideram bem-vinda a ajuda de R$ 600. E querem mais. A primeira parcela ajudou a driblar a fome


05/09/2022 04:00 - atualizado 05/09/2022 10:27

Marilza, Marizete, Cíntia, Fernanda, Gabriela e Francisco têm histórias que se cruzam em um ponto comum: para não passar fome, eles precisam do Auxílio Brasil. O valor de R$ 600, todos afirmam, é pouco. Mas é essencial para que se mantenham durante o mês. O Estado de Minas foi às ruas para ouvir cidadãos que dependem da ajuda do governo federal para conseguir o básico para sobreviver. Apesar do relativo alívio no bolso, os efeitos do aumento do benefício, com continuidade prometida pelos candidatos que polarizam as eleições para a Presidência da República, não definem o voto dos eleitores ouvidos pela reportagem, que oscilam entre um e outro. 

 

O benefício contempla quem está na extrema pobreza, com renda mensal de até R$ 100 por pessoa, e em situação de pobreza, com renda per capita entre R$ 100,01 e R$ 200. Caso de Fernanda Rodrigues, que vive em Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, e sustenta filhos e netos, e da dona de casa Marilza de Freitas, de 61 anos, que mora no Aglomerado Santa Lúcia, em uma casa simples, com mais três pessoas, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Fernanda conseguiu matar a fome da família. ComoMarilza, que  não trabalha e recebe o Auxílio Brasil para dar o que comer aos seus netos, que ficam com ela durante o dia.


Moradora de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha, Fernanda Rodrigues alimentou a famíia com os R$ 600
(foto: Sérgio Vasconcelos/Gazeta de Araçuaí)

 

Tímida, com poucas palavras, Marilza só se soltou quando falou do preço dos alimentos. Fazendo contas, a dona de casa reclamou que com R$ 600 não dá para comprar muita coisa no supermercado. “A gente vai com 100, 200 reais e não dá nada não. Dá para comprar o básico, um arroz, uns 60 (reais) de carne”, pontuou.

 

Sobre o restante de sua alimentação, ela agradeceu à Associação de Moradores do Aglomerado Santa Lúcia. Marilza afirmou que se não fosse a cesta básica doada pelas ONGs, a situação iria apertar ainda mais. Ela ainda ressaltou que se não fosse a ajuda externa, o benefício do governo não seria o bastante para comer durante o mês todo.

 

“Se a gente não recebesse essa cesta básica, não daria para passar o mês. As coisas estão bem caras. Aí abaixa mais a renda. Seria bom se aumentasse”, disse Marilza.

 

Sua vizinha, a faxineira Marizete Gomes dos Santos, de 46, também disse que a salvação do mês é a cesta básica que recebe de projetos sociais. “Se a Associação não ajudasse, a gente estava perdido", contou.

 

Marizete ressaltou que as idas ao supermercado estão cada vez mais escassas. E a culpa é do preço alto dos produtos. A substituição de alimentos, como a carne, é uma realidade para ela. A faxineira afirmou que só dá para comer carne de segunda e que, às vezes, come mistura.


Com nove pessoas em casa, Cíntia recorreu ao auxílio para complementar a renda, mas diz que foi insuficiente
(foto: Denys Lacerda/EM/DA Press)

 

“Quando vou ao supermercado, compro o básico. Arroz, feijão, macarrão, óleo. De vez em quando, compro um pezinho de galinha com umas misturas. Só dá pra comer carne de segunda, carne de boi não. Carne de boi está cara”, disse.

 

Ela ainda relembrou a época em que recebia o Bolsa Família, benefício de transferência de renda dos governos Lula (2003 a 2006 e 2007 a 2010) e Dilma (2011 a 2014 e 2015 a 2016) , ambos do Partido dos Trabalhadores (PT). Marizete disse que recebia menos verba do governo, mas que o poder de compra era maior.

 

“Quando eu recebia o Bolsa Família, as coisas eram mais baratas, dava para comprar várias coisas. Agora aumentou (o benefício), mas os preços subiram também. Um litro de leite custa R$ 6. Antigamente, tudo era baratinho. Comprava o leite a R$ 2,50, R$ 1,90. Hoje tudo está caro. O arroz foi para R$ 40”, desabafou.

 

A neta de Marizete, que fez 7 anos recentemente, não teve festa de aniversário. A avó e os pais até tentaram celebrar, mas os ingredientes para fazer um bolo estão  caros para a realidade da família. “A crise não me deixa comemorar o aniversário da minha neta”, disse.

MEDO DA FOME

Cíntia Priscila Martins, de 37, trabalha com captação de pessoas para tirar fotos. “Foto na hora, foto! Conhece?”, indagou. Na Praça Sete, ela aborda as milhares de pessoas que passam pelas ruas do Centro de Belo Horizonte durante o dia.

 

E Cíntia reclamou. Sua fonte de renda é o trabalho que exerce na rua. Porém, para fazer carteira de identidade, a pessoa que tirava as fotos 3X4 necessárias para a confecção do documento, agora tem a comodidade de ser fotografada dentro dos Postos Uai. “Eles tiraram o pouco que a gente tinha”, disse.

 

Marizete receberu o auxílio, mas reclamam do preço dos alimentos, que corrói a renda, apesar do aumento
(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)

Com nove pessoas morando na mesma casa, Cíntia precisou recorrer ao Auxílio Brasil. Mas, ainda assim, afirmou que o valor de R$ 600 não está dando para fazer uma compra completa do mês. “Dá para comprar o básico e mesmo assim não é tudo. Você vai escolhendo algumas coisas e complementa com algum trabalho que faz. E com esse valor não dá para comprar mais nada não. Só a alimentação mesmo e olhe lá. Só o grosso mesmo. A verdade é essa, porque não dá para comprar tudo. Está tudo um absurdo. O óleo foi para R$ 8, R$ 9. Eu já comprei até de R$ 12”, relatou.

 

Cíntia, que já é avó, contou da dificuldade de suprir a alimentação de todas as pessoas que moram na sua casa. Ela disse que percebeu um aumento dos preços dos produtos após a pandemia. A mulher entende que muitas empresas entraram em falência e agora estão repassando o custo disso para os consumidores, mas, segundo ela, não adianta dar um benefício de R$ 600 se isso não supre a cesta básica.

 

SITUAÇÃO DE RUA

Francisco José dos Santos Júnior, de 40, é pernambucano, mas mora nas ruas de Belo Horizonte. Seu endereço fixo, afirmou, é na Avenida do Contorno. “Carrego uma coisinha pra lá e outra pra cá”, diz Francisco, conhecido como Pernambuco dos camelôs, já que essa é a sua ocupação. Francisco tem dois filhos morando em São Paulo e manda dinheiro para eles todo mês, mesmo não tendo renda fixa. Para ele, o Auxílio Brasil ajuda muito, nesse sentido. Ele não recebe o valor de R$ 600, porque também conta com o Auxílio Gás, concluindo em um montante de R$ 710. No entanto, o camelô afirmou que, mesmo recebendo mais e não pagando aluguel, não dá para consumir alimentos melhores. “Dá pra comer direitinho, mas todos os alimentos estão caros. Arroz, feijão, tudo. A carne, pior ainda. Tem que comer é ovo, miojo”, disse.

  

A alta do preço dos alimentos é o que mais preocupa Pernambuco. Ele reclamou que, para fazer compras hoje, é preciso ter muito dinheiro, senão não se leva nada do supermercado.“Vai fazer compra para você ver. Não compra nada. Se for fazer compras, pode ir com a carteirinha recheada, senão não traz nada”, afirmou.

 

Gabriela Lopes Gomes, de 38, também pontuou que não tem dinheiro o bastante para fazer a compra do mês. Ela, assim como Francisco, não tem endereço fixo, e atualmente trabalha como artesã de rua no Centro de Belo Horizonte. Mas é nômade, viaja o Brasil inteiro com a sua arte.

 

Gabriela disse que, em alguns meses, chega a faltar comida. Ela vive com o marido, que também é artesão de rua e cuida de dois cachorros. Mesmo não tendo dependentes diretos, o dinheiro do Auxílio Brasil não consegue suprir as necessidades alimentares, pois ela também precisa comprar os materiais de seus artesanatos.

 

“Invisto mais em material para poder dobrar (a renda). Mas o auxílio ajuda. Não posso reclamar também, né? Mas, às vezes, falta comida sim. Com R$ 100, antigamente, você ia no mercado e comprava um monte de coisa. Hoje, não dá para nada”, disse.

 

Recurso não define votos para presidente

Apesar das realidades parecidas, as intenções de voto para as eleições presidenciais deste ano são distintas. O Auxílio Brasil, que é comum para todos, divide as opiniões sobre os candidatos e, apesar de o aumento ter sido dado no governo atual, o presidente Jair Bolsonaro (PL) não é majoritário na decisão dos beneficiários.

 

A artesã Gabriela disse que não vota há 15 anos, porque sempre está em viagem, mas que se fosse votar este ano, o candidato petista seria sua opção. “Eu votaria no Lula, em relação à educação e cultura. Não sei se posso estar sendo alienada, mas no meu ver, na época do Lula, tinha muito mais dinheiro no bolso, principalmente para o pobre, né? E para a população de rua também”, afirmou.

 

Cíntia, trabalhadora das ruas da Praça Sete, também afirmou que não votaria em Bolsonaro nem se ele aumentasse o valor do benefício, pois ela já tinha a sua decisão tomada antes.“Se Bolsonaro virar e falar ‘Eu vou dar (auxílio) de R$ 5mil’, ainda assim, já tenho outro (candidato) em mente. Posso estar errada com o meu voto, mas não quero tentar o novo, porque tenho medo de decepção com o novo. Eu não sei se é burrice, mas a gente quer insistir em uma pessoa que talvez a gente já tenha um costume. A gente quer permanecer no velho, mesmo que seja voltar para trás”, disse.

 

As vizinhas Marilza e Marizete, do Aglomerado Santa Lúcia, ressaltaram que não sabem, com certeza, em quem vão votar, porém, estão tendendo a escolher pela reeleição do presidente Jair Bolsonaro. Marilza disse que deve votar no ex-capitão pela gestão que ele fez durante a pandemia. Para ela, os esforços de Bolsonaro em entregar o Auxílio Emergencial, que lhe proporcionou renda de R$ 1.200, foram essenciais para a sobrevivência de sua família, na qual ninguém trabalhava na época.

 

“Não acho o governo ruim não, as pessoas falam que está ruim, mas não acho não. O que ele pode fazer, ele faz. Na época da pandemia, achei a gestão dele boa, porque ele deu o Auxílio. Ainda estou pensando, mas meu voto deve ser dele”, afirmou.

 

Já Marizete, além do Auxílio Brasil, tem outra razão para votar em Bolsonaro. Para ela, a escolha é contra Lula. A faxineira disse que não vai votar no petista por ter medo de o candidato ganhar e decretar o “banheiro unissex”. Ela não quer que a neta dela use o mesmo banheiro que outros homens, conforme viu nas redes sociais que aconteceria caso Lula ganhasse as eleições. No entanto, o “banheiro unissex” não consta no plano de governo do petista.

 

“Eu não sabia em quem ia votar, mas como o Bolsonaro ajudou a gente, vou ter que votar nele, para ele ajudar a gente. Esses tempos pra trás, eu estava pensando em votar no Lula. Mas depois que eles estavam falando que as mulheres vão usar o banheiro dos homens, aí eu fiquei preocupada, porque eu tenho uma neta. Isso está muito errado”, disse, receosa.

 

Já Francisco, o morador de rua de Pernambuco, afirmou que não decidiu ainda em quem votar. Mas para ele, quem assumir a Presidência vai ter que manter o benefício. “Eles vão ter que resolver, porque o Auxílio não pode acabar”, afirmou. (LP) 


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