Dólar e juros engataram novas altas na segundo sessão deste ano, enquanto o mercado de ações apresentou forte queda, em mais um dia de reações negativas às ações iniciais do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Investidores voltaram suas atenções ao longo desta terça-feira (2) às falas do novo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que intensificaram preocupações de que decisões políticas se sobreponham à necessidade de equilíbrio das contas públicas.
Temores no exterior quanto à desaceleração da economia global também contribuíam com a aversão aos investimentos de risco, prejudicando ainda mais os ativos brasileiros, principalmente no setor de exploração e distribuição de petróleo.
A moeda americana fechou em alta de 1,77%, cotada a R$ 5,4520 na venda, maior valor desde o final de julho. O Ibovespa, referência da Bolsa de Valores brasileira, recuou 2,08%, aos 104.165 pontos.
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Os juros futuros saltaram de forma generalizada. A taxa DI (Depósitos Interbancários) para 2024, por exemplo, passou de 13,53% para 13,79% ao ano. Os contratos com vencimento em 2025 avançaram de 12,91% ao 13,30%. Negociada entre bancos, a taxa de juros DI serve de referência para o setor de crédito.
Piter Carvalho, chefe de mesa da Valor Investimentos, afirma que as declarações de Lupi sobre a revisão da reforma da Previdência pegaram "investidores locais já sem paciência, que já são contrários ao governo petistas e às mudanças nessas regras".
"A reforma da Previdência demorou anos e, agora, o mercado fica com a incerteza se pode mudar da noite para o dia", completou Carvalho.
Antes da declaração de Lupi ter piorado o humor do mercado, os indicadores já apresentavam forte reação a afirmações feitas por Haddad no início do dia.
O ministro da Fazenda afirmou nesta terça que apresentará ao presidente Lula um plano de voo com ações de curto, médio e longo prazo para a agenda econômica da nova gestão. "Vou apresentar um conjunto enorme de ações para ele, de decisões que ele vai ter de tomar, uma a uma".
Haddad também minimizou as reações do mercado financeiro na véspera. "As pessoas estão se apropriando dos números e do que aconteceu no Brasil em 2022. Estava um clima de que economia estava no rumo certo e esse clima está se desfazendo pela apresentação dos números do enorme rombo eleitoral deixado pelo Bolsonaro", disse Haddad.
Analistas de mercado relatam que há desconfiança sobre a autonomia do ministro e até que ponto as decisões econômicas serão influenciadas pela setor político do governo.
"A incerteza [sobre a política] fiscal vem se concretizando. Hoje tivemos o discurso do ministro da Fazenda reconhecendo que a instância política será responsável por dar a última palavra, o que trouxe uma reação bem ruim para o mercado", comentou Luiz Souza, assessor de renda variável da SVN Investimentos.
Na segunda-feira (2), o mercado financeiro já havia demonstrado descontentamento com o discurso de posse e as primeiras ações do presidente Lula. A leitura feita por analistas é de que há sinais de que o governo será mais intervencionista na economia do que se esperava, com consistente uso de empresas públicas.
As expectativas também pioraram quanto ao controle dos gastos públicos, sentimento que ganhou força após o anúncio da manutenção da desoneração por dois meses para gasolina e etanol, e por um ano para diesel, biodiesel e gás de cozinha.
Durante a posse, Lula chamou o teto de gastos de "estupidez", e disse que ele será revogado. A medida já era prevista pela PEC da Gastança, que elevou o teto e permitiu gastos fora dele, mas estabeleceu que o Executivo deve apresentar uma nova regra para as contas públicas para substituir o atual.
"O discurso de Lula realmente não agradou, mas não trouxe novidades. Acho que o mercado espera que, em algum momento, ele comece a falar como quem governa, em vez de falar como se ainda estivesse em campanha", comentou Tomás Awad, sócio-fundador da 3R Investimentos.
No exterior, os principais mercados apresentaram ligeira queda após o feriado prolongado de Ano-Novo. Em Nova York, o índice parâmetro da Bolsa, o S&P 500, cedeu 0,40%. Os indicadores Dow Jones e Nasdaq caíram 0,03% e 0,76%, respectivamente.
No mercado de petróleo, o barril do Brent era negociado no final da tarde com queda de 4,13%, cotado a US$ 82,36 (R$ 443). A matéria-prima é referência para os preços praticados pela Petrobras, cujas ações mais negociadas na Bolsa brasileira recuaram 2,53%.
Analistas consultados pela agência Bloomberg atribuíam a aversão aos investimentos de risco ao temor de uma recessão global, sobretudo diante do crescimento das preocupações de que o aumento dos casos de Covid na China resulte em novo fechamento de atividades econômicas e quebra nas cadeias de distribuição.
Apesar do exterior negativo, é incerteza quanto à economia local o principal motivo para as desvalorizações do real e do Ibovespa, segundo Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura.
"Está ficando claro que o governo não tem um plano fiscal e que a ala política está empurrando mais estímulos fiscais, a exemplo da desoneração dos combustíveis", disse Borsoi.
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