reunião de negociação entre governo e sindicalistas

Além do reajuste linear de 9% para todas as categorias do funcionalismo, o documento contempla aumento de R$ 200 no auxílio alimentação, para R$ 658

Rosana Hessel/CB/D.A press
O governo federal formalizou, na manhã desta sexta-feira (24/3), o acordo de reajuste salarial de 9% com as centrais sindicais, na sede do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI). A ministra do MGI, Esther Dweck, assinou o termo do acordo com os representantes do funcionalismo na sede da pasta, com quase uma hora de atraso e problemas técnicos para a execução do Hino Nacional — que acabou sendo cantado a capela pelos presentes.
Dweck explicou que não quis adiar o evento para ajustar a agenda de outros ministros, porque era mais importante a assinatura do acordo. “Precisávamos acelerar tudo para conseguir aprovar todos os atos ao longo de abril para ter tudo implementado a partir de maio”, afirmou. Ainda segundo ela, o acordo foi elogiado pelos servidores e "acabou de ser elogiado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT)".

O evento contou com a presença do ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Márcio Macêdo; da ministra da Saúde, Nisia Trindade; e do secretário-executivo do Ministério do Planejamento e Orçamento, Gustavo Guimarães.

Além do reajuste linear de 9% para todas as categorias do funcionalismo, o documento contempla aumento de R$ 200 no auxílio alimentação, para R$ 658, que passará a valer a partir de maio, mas os créditos em conta-corrente dos servidores ocorrerão de junho em diante.

O documento, de duas páginas, contém oito cláusulas. Para a implementação dos novos valores, será preciso um Projeto de Lei do Congresso Nacional (PLN) para incluir os reajustes no anexo V da Lei Orçamentária Anual (LOA) para o exercício anualizado.

Com isso, o governo encaminhará ao Congresso o instrumento legal que tratará do reajuste salarial, “observando o comando que impede a retroatividade sobre os efeitos do presente acordo”. E, para a implementação do reajuste do auxílio alimentação, será editada uma portaria com o acréscimo de R$ 200. A portaria foi assinada pela ministra do MGI durante a cerimônia.

"Ninguém sai 100% feliz"

Apesar de não repor as perdas salariais com a inflação desde os últimos sete anos, de 43,6%, a reabertura da Mesa Nacional de Negociação Permanente com os servidores pelo atual governo, no início de fevereiro, foi um marco para o setor, de acordo com sindicalistas e autoridades.“Esse é o acordo possível diante da disponibilidade orçamentária. Ninguém sai 100% feliz”, disse o gerente de Gestão de Pessoas e de Relações de Trabalho, Sérgio Mendonça, responsável pelas negociações com os sindicatos.

Citando o limite disponível no Orçamento, de R$ 11,2 bilhões, o secretário lembrou que as negociações entre governo federal e centrais sindicais, não ocorriam desde o governo Michel Temer (MDB), em 2016. A Mesa funcionou entre 2013 e 2016, nos governos petistas. “Foi um acordo razoável e bom, dentro do nosso ponto de vista. E nós tratamos dessa rodada com todas as entidades representativas dos servidores públicos federais”, afirmou ele citando que conversou com mais 150 pessoas na Mesa.

Hino Nacional
Durante o evento, o presidente do Fórum Nacional Permanente das Carreiras Típicas de Estado (Fonacate), Rudinei Marques, afirmou que o processo de negociação foi célere e “irretocável”. “Esse processo marca mais do que a negociação mais célere do serviço público federal e da volta da retomada do diálogo e respeito com os 12 milhões de servidores ativos, inativos, aposentados e pensionistas”, afirmou ele, lembrando que o acordo acabou sendo formalizado em um mês e meio, após três rodadas de diálogo.

“Depois de tantos anos de ataques, nos últimos quatro anos, a gente chegava na cerimônia e tinha constrangimento de cantar o Hino Nacional, mas, hoje, cantamos à capela no exercício de amor à Pátria”, acrescentou. “Sabemos que o governo fez um esforço fiscal tremendo para recompor as perdas, pelo menos parcialmente", disse ele, que defendeu o fortalecimento das entidades de classe e as classes sindicais.

Na avaliação de Marques, no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), não houve nenhum tipo de negociação, e, em alguns órgãos, quando as categorias tentavam algum tipo de diálogo para valorização das categorias, alguns responsáveis, antes de começarem a conversa com sindicalistas, chegavam ao cúmulo de colocarem uma arma sobre a mesa.

“Algumas áreas foram destruídas. Houve muito abuso e assédio institucional, principalmente em órgãos da Cultura e do Meio Ambiente”, destacou Marques, em entrevista ao Correio. “O que aconteceu com a reabertura da Mesa, do ponto de vista simbólico, foi muito importante, para mostrar que o novo governo quer tentar construir alguma coisa melhor para os trabalhadores”, acrescentou.

A mesa de negociação atual teve três rodadas e, na avaliação de Marques, foi “a mais rápida da história do funcionalismo federal”. “Houve um gesto de boa vontade de ambas as partes. As entidades compreenderam que o governo fez um esforço para o diálogo, mas dentro da atual conjuntura econômica e fiscal, o aumento linear de 9% foi o que foi possível”, acrescentou.

No termo do acordo, também ficou determinado que o calendário para o funcionamento da Mesa Nacional será definido a partir de maio pela Secretaria de Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho do MGI. Segundo Marques, a expectativa dos trabalhadores é negociar um plano plurianual durante as novas conversas da Mesa a fim de incluir um novo reajuste no Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2024, que precisará ser enviado ao Congresso até 31 de agosto. Contudo, ele reconheceu que o prazo será curto e as condições poderão ficar mais difíceis diante de uma perspectiva manutenção da taxa básica de juros (Selic), de 13,75% ao ano, por um período mais prolongado, que poderá ajudar a travar ainda mais a atividade econômica, que está em processo de desaceleração. Conforme a mediana das projeções do mercado coletadas pelo Banco Central e de crescimento baixo da economia neste ano.

Ao tomar a palavra, o ministro Macêdo parabenizou a “maturidade” das entidades de classe durante a negociação com servidores e afirmou que o acordo é o início de uma nova relação entre servidores e o governo federal. “São seis anos de ausência completa de diálogo, desde o governo Dilma Rousseff. Depois de 2016 é o primeiro acordo feito entre governo e servidores. É um novo tempo que vai exigir muita paciência e diálogo para reconstruir o país com união”, afirmou ele, que comparou o “silêncio” do governo anterior ao da ditadura militar. Ao fim da fala, afirmou que o ex- presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) está bem. “O presidente está bem. Foi início de pneumonia que está sendo tratado. Ele exagera, às vezes”, disse.

A ministra Nísia Trindade também ressaltou a importância do momento de retomada das negociações, marcada pela assinatura do acordo. “É a reabertura de um processo que fortalecerá as relações e o Estado brasileiro. No Ministério da Saúde, temos um contingente de trabalhadores muito grande e temos também que, no Sistema Único de Saúde, temos 70% de mulheres. E o aprendizado dessa negociação eu creio que, para a reestruturação do da Saúde, será fundamental. É muito importante esse aprendizado, mas há um longo caminho pela frente, que passa pela questão fiscal, no processo de reconstrução do país”, afirmou.

Propostas

Durante as conversas da Mesa, os servidores iniciaram as rodadas pedindo uma correção de 43,6% de reposição da inflação, percentual que foi utilizado para o aumento do auxílio alimentação. O governo fez uma proposta inicial de 7,9% de reajuste a partir de março, mais os R$ 200 adicionais para o auxílio. Os sindicatos, por sua vez, fizeram uma contraproposta de 13,5% de reajuste linear e o governo, na terceira rodada, para os percentuais do acordo, cujo impacto fiscal, de R$ 11,2 bilhões no Orçamento deste ano, é o mesmo previsto na primeira proposta, porque o número de meses do ano para o pagamento é menor. Contudo, de acordo com Marques, o acordo vai garantir um recurso anualizado de R$ 16 bilhões, que já precisarão constar na previsão orçamentária de 2024.

Na avaliação do presidente da Fonacate, o governo fez o que foi permitido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). “Deram o reajuste máximo pela inflação no auxílio, mas concederam o limite orçamentário para o aumento salarial, mantendo a previsão dos R$ 11,2 bilhões de impacto fiscal no Orçamento deste ano, mas os servidores terão a garantia do pagamento dos cerca de R$ 16 bilhões anualizados. Esse acordo foi até onde era possível a utilização dos recursos disponíveis”, explicou.
Sindicalistas presentes defenderam a desvinculação dos reajustes à necessidade do ajuste fiscal. “O novo marco fiscal não pode ser o tigrão para perseguir o trabalhador", frisou Sérgio Ronaldo, presidente do Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais (Fonasef).

Novo cronograma

Além do cronograma para a nova rodada de negociações com as centrais sindicais, também falta definir quem serão os representantes que terão lugares à mesa com o governo, na avaliação de Marques. "Há uma tendência dos governos petistas de darem preferência para as entidades do sistema sindical e das confederações, mas é preciso ver como ficarão as questões das associações históricas, que também precisam ter assento à mesa”, destacou. Ele ressaltou que as categorias ainda esperam uma definição do governo sobre duas instruções normativas que limitaram as atividades sindicais e impuseram dispositivos para constranger e desestimular paralisações, publicadas em 2018 e 2021. Durante o evento, entidades defenderam maior equidade nas remunerações das mulheres no serviço público durante a retomada das mesas setoriais, que também está prevista no acordo.

Fontes do ministério ainda não confirmaram se o texto do acordo será encaminhado ao Legislativo como medida provisória ou em vários projetos de lei para cada categoria. O texto do PLN poderá tramitar concomitante ao texto do acordo, porque é apenas uma formalização das rubricas, segundo técnicos do governo.