Após alcançar patamar recorde em 2021, o número de pessoas consideradas pobres caiu para 22,7 milhões nas metrópoles brasileiras em 2022.
O resultado significa que, no intervalo de um ano, 3,4 milhões de habitantes deixaram para trás a linha de pobreza nas regiões metropolitanas.
As conclusões são do 13º boletim Desigualdade nas Metrópoles. O estudo analisa informações disponíveis para 22 regiões metropolitanas.
Em 2021, a população considerada pobre nesses locais havia chegado a quase 26,2 milhões. Foi o maior patamar da série histórica iniciada em 2012.
O boletim é produzido pelo laboratório de estudos PUCRS Data Social em parceria com o Observatório das Metrópoles e a RedODSAL (Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina).
Para se ter uma ideia, os 3,4 milhões de pessoas que deixaram a situação de pobreza em 2022 superam, por exemplo, a população inteira estimada para um local como Brasília (cerca de 3,1 milhões).
Apesar da queda, o contingente ainda considerado pobre (22,7 milhões) equivale a mais de um quarto dos habitantes das metrópoles analisadas.
Isso é ilustrado pela taxa de pobreza, que baixou do recorde de 31,3% em 2021 para 27% em 2022, segundo o boletim.
Tanto o número de pobres (22,7 milhões) quanto a taxa (27%) do ano passado ficaram acima dos patamares de 2019, no pré-pandemia. À época, os indicadores estavam em 21,6 milhões e 26,3%.
Os menores níveis da série histórica foram registrados pelo boletim em 2014 (18,4 milhões e 23,4%).
André Salata, coordenador do PUCRS Data Social e um dos autores do estudo, afirma que a retomada do mercado de trabalho teve papel preponderante para a redução da pobreza no ano passado.
Segundo o pesquisador, esse estímulo ocorreu porque o trabalho é a principal fonte de renda domiciliar no país.
Além da reação do emprego, a ampliação do Auxílio Brasil para R$ 600, às vésperas das eleições, no segundo semestre de 2022, também ajudou a elevar o rendimento dos mais pobres, acrescenta Salata.
"O filme do último ano é um tanto positivo, mas a situação ainda é negativa porque mais de um quarto da população das metrópoles segue pobre", pondera.
A nova edição do boletim foi construída a partir de dados da Pnad Contínua com recorte anual.
Essa versão da Pnad, divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), vai além do mercado de trabalho e contempla outras fontes de renda, incluindo programas sociais.
Embora tenha estourado a meta pelo segundo ano consecutivo, a inflação menor em 2022 (5,79%), frente a 2021 (10,06%), foi outro fator que trouxe algum alívio para a renda no ano passado, diz Marcelo Ribeiro, pesquisador do Observatório das Metrópoles.
"Isso [inflação menor], de algum modo, contribuiu para a manutenção de um certo poder de compra", afirma Ribeiro, que também é autor do boletim e professor do IPPUR (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da UFRJ).
O estudo segue recomendações do Banco Mundial para definir as linhas de pobreza e extrema pobreza. Essas medidas levam em consideração parâmetros de PPC (paridade de poder de compra).
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Em valores de 2022, convertidos em reais, a linha de pobreza foi de aproximadamente R$ 636 per capita (por pessoa) por mês. A linha de extrema pobreza, por sua vez, ficou em torno de R$ 199 per capita por mês.
Na prática, moradores de domicílios cujo rendimento por pessoa esteve abaixo desses patamares foram classificados pelo boletim como pobres ou extremamente pobres.
"Para viver em uma metrópole, são níveis de renda muito baixos", ressalta Ribeiro.
1,8 MILHÃO DEIXA EXTREMA POBREZA
De acordo com o boletim, a extrema pobreza também caiu no ano passado. O número de habitantes nessa condição nas metrópoles baixou do recorde de 5,7 milhões em 2021 para 3,9 milhões em 2022.
Ou seja, 1,8 milhão saiu da situação de extrema pobreza no intervalo de um ano. O número de 3,9 milhões é o menor desde 2017 (3,7 milhões), mas segue distante da mínima da série, registrada em 2013 (2,4 milhões).
A taxa de pobreza extrema caiu do recorde de 6,9% em 2021 para 4,7% em 2022. É o menor patamar desde 2017 (4,6%).
De acordo com Salata, a tendência é de que a pobreza e a extrema pobreza sigam em queda em 2023. O ritmo dessa redução, segundo ele, deve ser menor do que em 2022, já que o resultado do ano passado veio após níveis recordes em 2021.
"Não acredito que vai ter uma mudança do mesmo tamanho, porque 2021 havia sido muito negativo", aponta.
Nos primeiros meses deste ano, a geração de empregos deu sinais de arrefecimento, mas economistas ainda enxergam um mercado de trabalho forte.
Ao mesmo tempo, as projeções passaram a indicar crescimento acima do esperado inicialmente para o PIB (Produto Interno Bruto) e alta menor para a inflação em 2023.
O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda aposta na volta do Bolsa Família, que substituiu o Auxílio Brasil, uma das marcas do mandato de Jair Bolsonaro (PL).
O Bolsa Família manteve o benefício de R$ 600, com possibilidade de pagamentos adicionais para famílias contempladas pelas transferências.
DESIGUALDADE CAI, MAS ABISMO PERSISTE
O boletim sobre as metrópoles também apontou que a renda média para o conjunto das regiões metropolitanas subiu para R$ 1.984 em 2022, depois de atingir a mínima da série em 2021 (R$ 1.862). A elevação foi de 6,5%.
A alta, contudo, não foi suficiente para trazer a média de volta ao patamar anterior à pandemia, de 2019 (R$ 2.124). O indicador é composto por diferentes fontes de recursos, como mercado de trabalho e programas sociais.
A camada que mais se beneficiou do movimento de alta, diz o boletim, foi a dos 40% mais pobres. Nessa parcela, a média de renda (R$ 511) subiu 17,5%.
Enquanto isso, a elevação foi de 8,4% entre os 50% intermediários (R$ 1.858) e de 2,3% entre os 10% mais ricos (R$ 8.515).
Consequentemente, a desigualdade de renda teve redução de 2021 para 2022, segundo o coeficiente de Gini. Para o conjunto das metrópoles, o indicador caiu de 0,565 para 0,545. O patamar mais recente é o menor desde 2016 (0,544).
O Gini varia de 0 a 1. Quanto mais alto o resultado, maior é o abismo entre os extremos da população.
Em 2022, os 10% mais ricos ganharam 16,7 vezes, em média, o rendimento dos 40% mais pobres nas metrópoles. A diferença segue "muito alta", mas é a menor desde 2016 (16,5), aponta o boletim.
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