Potenciais presidenciáveis em 2026, os ministros Simone Tebet (Planejamento) e Fernando Haddad (Fazenda) exibem um alinhamento que destoa do histórico de atritos entre titulares das duas pastas. A aparente sintonia, porém, encobre episódios do relacionamento em que ela ficou isolada, foi pouco ouvida ou não explorou todo o potencial de voz quando teve a chance —reforçando o protagonismo dele nas discussões.
Pessoas próximas a Haddad apontam que Tebet cedeu um pouco mais ao discurso da esquerda, enquanto aliados da emedebista dizem que foi justamente o contrário: o titular da Fazenda teria sido quem convergiu para o centro —postura que pode ter rendido elogios do mercado, mas também críticas severas do próprio PT.
A harmonia em público não significa ausência de discordâncias ou subordinação, afirmam aliados da ministra. Apesar disso, avaliam, em determinados momentos ela peque por se deixar ficar à sombra de Haddad.
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A coletiva de anúncio da mudança no Sistema de Metas de Inflação, em 29 de junho, foi analisada por membros do governo como um desses momentos em que o Planejamento poderia ter tido mais voz.
Tanto Haddad quanto Tebet integram o CMN (Conselho Monetário Nacional), que conta ainda com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. O colegiado é quem define as metas de inflação.
Segundo interlocutores, o ministro da Fazenda fechou o desenho com o presidente Lula (PT) em uma conversa no Palácio do Planalto, enquanto Tebet e Campos Neto aguardavam na sala histórica de reuniões do CMN na sede do Ministério da Fazenda.
Na entrevista para detalhar o anúncio, Haddad centralizou os questionamentos, enquanto Tebet ensaiava responder e sussurrava uma espécie de cola fora do microfone, mas evitou dar declarações. A cena não passou despercebida por parte de seus auxiliares, que preferiam maior participação da ministra no anúncio, mas viram na conduta a tentativa de não atropelar Haddad.
Para integrantes do governo, Tebet entendeu o anúncio como um recado de que o petista estava ali para falar em nome de Lula. Por outro lado, seu silêncio pareceu uma atuação subordinada à do ministro da Fazenda.
Para evitar transparecer atritos, eventuais discordâncias entre os dois até agora foram resolvidas em conversas reservadas, sem embates públicos. Nas pautas no Congresso, os ministros se alinharam para aprovar o novo arcabouço fiscal e a Reforma Tributária, duas das principais medidas econômicas de Lula.
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Um episódio de divergência citado por interlocutores envolveu a elaboração o arcabouço. Inicialmente, o Planejamento ocupou uma posição lateral nas discussões. Uma vez incluída, a ministra chegou a defender uma banda mais flexível para a execução da meta de resultado primário, de 0,5 ponto percentual do PIB (Produto Interno Bruto) para mais ou menos. A justificativa era garantir investimentos.
Haddad, por sua vez, argumentou a favor da proposta original, com uma banda mais estreita, de 0,25 ponto percentual, contando com a capacidade do governo em obter receitas extras e atingir as metas fiscais. O ministro acabou convencendo os demais e emplacou sua visão.
O Planejamento também ficou ressentido pela falta de apoio nas negociações iniciais de um dispositivo que evita um corte de até R$ 40 bilhões na proposta de Orçamento. Apenas na reta final, membros do Palácio do Planalto se engajaram nas articulações.
A inércia da Fazenda foi escancarada pelo relator do arcabouço fiscal no Senado, Omar Aziz (PSD-AM). No plenário, o senador disse que Haddad "não apresentou nenhum senão" em relação a esse ponto do texto.
Há quem diga que Tebet ainda não colocou em prática todo o poder que o Planejamento pode ter nas discussões. Além do peso que ela trouxe após seu papel na campanha em apoio a Lula, a ministra tem sob sua pasta estruturas importantes, como a Secretaria de Orçamento Federal —um dos redutos técnicos da política fiscal do governo.
Integrantes do governo ponderam que a relação dos ministros é boa por enquanto, mas pode mudar após as eleições municipais de 2024, a depender do veredito das urnas sobre a força do PT para emplacar prefeitos. A proximidade do pleito de 2026 também pode afetar os ânimos.
Para aliados de Tebet, não há como ela se contrapor a Haddad num momento em que o próprio mercado financeiro elogia as medidas tomadas pelo ministro da Fazenda. Além disso, Haddad tem a confiança de Lula e é um nome próximo ao presidente, enquanto a ministra não goza do mesmo status.
Em conversas reservadas, Haddad e Tebet se elogiam e se referem um ao outro como parceiros. O presidente do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), avalia que os ministros estão com ideias convergentes, mas admite receios.
Tebet também pode ter de ceder em outras frentes não relacionadas às tratativas com a Fazenda. O PT tenta emplacar Marcio Pochmann, ex-presidente do Instituto Lula e quadro histórico do partido, à frente do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A ministra aguardava o fim da coleta de dados para o Censo para trocar a presidência do órgão, hoje sob o comando interino do diretor de Pesquisas, Cimar Azeredo. Havia expectativa de que Azeredo fosse mantido no cargo, mas o PT quer Pochmann.
O nome do economista, porém, enfrenta resistência de parte do Planejamento, para quem ele não tem notável saber para ocupar o posto. Outra ala do ministério, no entanto, avalia que aceitar a indicação pode demonstrar boa vontade com a sigla de Lula.
Apesar disso, a relação entre Haddad e Tebet tem se mostrado afinada, contrariando apostas de que as duas pastas viveriam em pé de guerra pela condução da política econômica.
O produto final dessa interação é uma inflexão na dinâmica entre os dois ministérios no passado, segundo parlamentares e integrantes do governo.
Havia preocupação, por parte de aliados de ambos, de que a convivência dos dois no governo pudesse ser marcada pela disputa por protagonismo —algo que não se concretizou até o momento.
A relação vai na contramão de outras observadas no passado. No primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), o então ministro do Planejamento, José Serra, vivia às turras com Pedro Malan (Fazenda), a quem criticava pela postura em relação a gastos públicos e juros. Já sob Lula, os embates ocorreram entre Antônio Palocci, então chefe da Fazenda e que caiu nas graças do mercado financeiro, e Guido Mantega, na época à frente do Planejamento.
Um dos argumentos do ministro Paulo Guedes para fundir várias pastas em seu Ministério da Economia era justamente unificar a linha de pensamento nas diferentes áreas e evitar atritos habituais entre as pastas.
Tebet e Haddad se falam com frequência, quase diariamente. Aliados próximos de ambos dizem que o "santo bateu" e que eles demonstram convergência de pensamentos sobre decisões econômicas. Tebet tem a visão de que o governo "tem que dar certo", daí a necessidade de atuar pelo conjunto, não em causa própria.
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