Entidades nacionais que representam o varejo, junto com a Frente Parlamentar de Comércio, Serviços e Empreendedorismo (FCS), instaurada pelo Congresso Nacional, estão em campanha para barrar a tentativa do Banco Central (BC) e do sistema financeiro de limitar a compra parcelada sem juros no cartão de crédito. Uma reunião sobre esse assunto foi convocada pelo BC para amanhã e deve reunir representantes dos bancos, das empresas de cartão e máquinas de crédito e das entidades de classe do comércio.
Pressionada pelos bancos, a autoridade monetária estuda controlar as compras parceladas sem juros no cartão de crédito, limitando o número máximo de parcelas, para compensar uma possível queda nos juros do rotativo (aquele cobrado quando o consumidor não paga a fatura em dia). Essa queda está prevista na legislação sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, batizada de Desenrola Brasil, que estabelece limite para os juros no rotativo e regras para renegociação e parcelamento de dívidas.
Atualmente, o juros no rotativo chegam, em média, por ano, a 445,7%. Os bancos têm até janeiro para apresentar uma proposta de regulamentação dessas taxas que seja aceita pelo BC, caso contrário elas serão limitadas a 100% ao ano.
O deputado federal Domingos Sávio (PL), que representa a FCS na Câmara, diz que a frente é “categoricamente” contra o limite do parcelamento sem juros, mecanismo, segundo ele, essencial para que o consumidor brasileiro possa adquirir produtos de valor mais elevado sem onerar as despesas das famílias. O parlamentar lembra que essa tentativa de limitar o parcelamento sem juros foi rechaçada pelo parlamento durante a tramitação do Desenrola Brasil nas duas casas legislativas, Câmara e Senado.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci, os bancos alegam que as compras parceladas sem juros aumentam os índices de inadimplência e forçam a aplicação de taxas exorbitantes no rotativo, mas ele lembra que quem criou essa modalidade de compra foram os próprios bancos quando tinham o monopólio do mercado das máquinas de cartão de crédito. “Foram esses bancos grandes que lançaram o parcelado sem juros. Hoje são contra porque na época só tinham duas maquininhas, mas o mercado abriu, hoje são dezenas, e veio a concorrência que fez com que o spread caísse 85% com a abertura do mercado das maquininhas”, afirma o dirigente e empresário se referindo à queda da taxa cobrada pelos bancos para adiantar para as empresas os valores das compras parceladas.
O presidente da Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), José Cesar da Costa, afirma que para o pequeno e microempresário hoje o parcelado sem juros é fundamental, pois possibilita o incremento das vendas, principalmente de quem ainda não conseguiu se recuperar dos efeitos da pandemia nos negócios. Segundo ele, a Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) quer limitar o parcelamento em no máximo quatro vezes. “Acho muito apertado e não resolve o problema daquele que precisa de prazo maiores”. De acordo com ele, na reunião prevista para amanhã, as entidades vão defender que não existe espaço para redução do parcelado e que isso somente seria possível se os juros hoje fossem menores. “É uma luta difícil e pesada contra os bancos”, afirma.
Geraldo Defalco, presidente da Associação Nacional dos Comerciantes de Material de Construção (Anamaco), afirma que o parcelamento sem juros está sedimentado na economia brasileira, principalmente para a compra de linha branca e material de construção e representa cerca de 60% das vendas. “Se você corta isso radicalmente você prejudica como um todo, pois vai haver demissão, queda de arrecadação e vai ser difícil ajustar isso a curto prazo”. Segundo ele, a Anamaco deixou como contraproposta o estabelecimento de um limite de doze parcelas sem juros, mas que deve vir acompanhada da queda da taxa de juros.
Ciranda
Procurada pela reportagem, a Febraban afirmou que defende “abertamente um modelo sustentável de financiamento do consumo para o cliente, que precisa ter alternativas que evitem a ciranda financeira do empilhamento do parcelado das compras”. “De um lado, o cartão se tornou um meio de pagamento relevante para o consumo. Mas, de outro, com as compras parceladas de forma ilimitada, esse meio passou a ser um pesadelo, levando o consumidor ao superendividamento. E esse pesadelo parece não acabar, porque o consumidor, com vários cartões nas mãos, é induzido a parcelar suas compras em prazos cada vez mais longos. Temos revelado algo que não se diz abertamente ou não se quer que seja debatido: o parcelado sem juros não é sem juros, pois os juros estão embutidos no preço do produto”.
A nota diz ainda que o setor se manterá firme em três linhas de atuação: “manutenção do cartão de crédito como relevante instrumento para o consumo, diluição do risco entre os elos da cadeia, hoje concentrado nos bancos emissores que suportam todo o peso da alta inadimplência, e reequilíbrio da grande distorção que só o Brasil tem, com 75% dos recebíveis das compras na modalidade de parcelado sem juros”.
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