Um projeto de mapeamento geográfico para resolver problemas de alto impacto social, econômico e ambiental, desenvolvido em um laboratório que funciona dentro do Departamento de Ciência da Computação (DCC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), foi aprovado para receber financiamento do Instituto Serrapilheira.
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Apagão no CNPq afeta cientistas da UFMG e demais universidades brasileirasRanking coloca UFMG entre as 700 melhores universidades do mundoUFMG enfrenta crise dramática com o corte de verbasEstudantes da UFMG alcançam o segundo lugar em competição internacional Instituto concede bolsa de estudos para alunos de baixa renda da UFMGA pesquisa é coordenada pelo professor do DCC, Jefersson Alex dos Santos. De acordo com ele, o Laboratório de Reconhecimento de Padrões para Observação da Terra (Patreo) desenvolve pesquisas voltadas para aplicações geográficas. “O principal foco do laboratório e também do projeto é o desenvolvimento de abordagens para reconhecimento de padrões a partir de imagens aéreas.”
Nesse projeto específico, o professor conta que a proposta é trabalhar com três aplicações principais.
Nesse projeto específico, o professor conta que a proposta é trabalhar com três aplicações principais.
A primeira é mapear estradas rurais no Cerrado e na Amazônia.
“A degradação do meio ambiente, principalmente na Amazônia, está muito associada com isso. Identificar as áreas que já foram desmatadas, é um sistema praticamente resolvido, tem sistemas do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). O que queremos fazer é mapear essas estradas porque já existe uma correlação alta entre elas e as próximas areas a serem desmatadas e que vão sofrer atuação de garimpo ilegal.”
“Identificando onde estão as estradas rurais você consegue mudar a dinâmica do que está acontecendo ali e prever onde estão as próximas áreas com atividades ilegais”, completa. Para esse mapeamento, Jefersson tem a parceria de um especialista na área que é Raoni Rajão, professor da Escola de Engenharia da UFMG.
A segunda aplicação é usar técnicas de mapeamento aéreo para monitorar focos de dengue. Neste caso, também já existe uma parceria com a Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
“Esse grupo trabalha com a dinâmica da dengue há muito tempo e desenvolveram metodologias que mostram uma correlação alta entre a condição das moradias com o fator de alto risco de incidência de dengue.”
Essa parte do projeto vai usar imagens aéreas para tentar estimar as condições de moradia e possíveis focos de dengue em larga escala.
“Nesse estudo específico, eles vão distribuir armadilhas para captura de fêmeas adultas de aedes aegypti e os ovos delas. A ideia é correlacionar isso para verificar o grau de assertividade das técnicas computacionais que estamos usando.”
A proposta é ter um sistema automatizado que categoriza uma cidade inteira, possibilitando um trabalho mais direcionado e utilizando menos recurso público para combater a dengue.
O professor explica que esse sistema pode ser usado pelo poder público, por exemplo.
“A gente vai desenvolver a pesquisa básica, se o poder público se interessar e quiser investir para transformar isso em um produto, a gente está à disposição. Acontece muito das empresas também se interessarem por desenvolver e comprar a tecnologia da universidade.”
A terceira aplicação é a identificação de espécies endêmicas em regiões específicas. Este fenômeno está ligado às mudanças climáticas.
“Quando tem um distúrbio no clima da região é um indício de que pode estar ocorrendo uma mudança climática. Temos uma área de estudo na Serra do Cipó. Monitorar essas plantas, em uma região grande como essa é difícil, você acaba cobrindo uma área pequena da região. Então a ideia é automatizar o processo e usar a inteligência artificial para identificar novas espécies de plantas e as variações delas ao longo do tempo.”
Segundo Jefersson, as demandas e os tipos de dados para cada aplicação são diferentes.
“Na Amazônia, por exemplo, não usamos imagem aérea padrão. A gente tem que usar imagens de radar que conseguem penetrar nuvens, já que é uma área onde chove muito. No caso do monitoramento de plantas precisamos analisá-las ao longo do tempo, então são várias imagens por dia. É diferente das estradas rurais que precisam de uma imagem boa, em determinado período. Já para o controle da dengue, usamos imagens de altíssima resolução urbana.”
Desafio é ensinar a máquina
O professor explica que trabalha com visão computacional, inteligência artificial, mais especificamente aprendizagem de máquina e processamento de imagens.
“Apesar de trabalhar com computação, eu me interesso muito por pesquisa interdisciplinar, com interação para outras áreas do conhecimento para obter resultados de impacto não só na computação, mas também nessas outras áreas.”
O professor conta que, nos últimos anos, as áreas de visão computacional e inteligência artificial avançaram muito.
“Teve o avanço de muitas metodologias, o poder computacional das máquinas aumentou e permitiu fazer análises mais aprofundadas. Na área de reconhecimento de padrões por imagens de satélite, por exemplo, apesar de ter avançado muito, ainda tem uma série de desafios computacionais.”
Segundo ele, apesar dos avanços existe “um abismo entre o que essas técnicas oferecem e o que as aplicações e mapeamento geográfico necessitam.”
Jefersson acredita que a principal limitação é exatamente onde está a maior contribuição do projeto.
“Para você ensinar a máquina, precisa dar exemplos para ela e a dificuldade, nessas áreas de mapeamento geográfico, é justamente ter um especialista para anotar dados para a máquina. O que a gente propõe no projeto é desenvolver metodologias que permitam que a máquina aprenda com menos dados, menos informação e menos anotação para treinar os modelos.”
Mais recursos e bônus da diversidade
Mais de 500 projetos concorreram ao edital do Instituto Serrapilheira, e apenas 12 foram selecionados. Serão três anos para a pesquisa ser desenvolvida. O professor acredita que a aprovação vai ajudar em muitos aspectos.
“O primeiro é o holofote que isso dá para o laboratório e a universidade. É importante para atrair mais recursos ainda. O impacto direto é o recurso mesmo. Infelizmente, estamos tendo muitos cortes de verba com a pesquisa no Brasil. Na UFMG temos essa estrutura boa de equipamentos porque fazemos muita parceria com empresas, então isso não é problema. Mas, bolsa para pesquisa pura é muito difícil e esse projeto vai proporcionar duas bolsas de doutorado e uma de mestrado. Isso é muito valioso hoje em dia.”
Além das bolsas, o investimento do instituto vai permitir a compra de equipamentos de alto desempenho, recursos para viagem, publicação de artigos, participação em conferências para a formação dos alunos e atualização dos professores.
Outra vantagem é a divulgação. “O Serapilheira tem toda uma infraestrutura, uma rede de contatos, em que eles divulgam os projetos que financiam. Isso meio que retroalimenta o sistema. Desde que o anúncio foi feito eu já tive o contato de três empresas interessadas em projetos desse tipo.
O instituto tem ainda um bônus da diversidade. “É um recurso extra que ainda vai ser aprovado para o projeto, com estratégias de inclusão e diversidade na pesquisa, pode ser gênero, raça, etnia. No nosso caso, temos uma demanda, nas exatas como um todo, por mais mulheres. Então, minha proposta é uma bolsa de doutorado para manter mulheres na computação.”
*Estagiária sob supervisão do subeditor João Renato Faria