Desde 1965, comemora-se, em 21 de abril, o Dia de Tiradentes, alcunha de Joaquim José da Silva Xavier, um dos líderes da Inconfidência Mineira. A figura de herói nacional, no entanto, nem sempre acompanhou o inconfidente - há quem defenda que essa foi uma construção histórica, iniciada quando o Brasil se tornou uma República.
Polêmicas à parte, Tiradentes nasceu na Fazenda do Pombal, em Minas Gerais, no ano de 1746, e morreu aos 45 anos, como punição por sua participação na Inconfidência Mineira (1789), que foi uma das três tentativas de independência formal do Brasil que aconteceram no século XVIII. Além dela, houve a Conjuração Fluminense (1794) e a Conjuração Baiana (1798).
Em Minas Gerais, o movimento pela independência foi protagonizado por membros da elite local, insatisfeitos com a cobrança excessiva de tributos por parte de Portugal, especialmente pela imposição da “derrama” em um contexto de queda da atividade mineradora. Tratava-se de uma taxação compulsória para assegurar um repasse mínimo estabelecido de ouro à metrópole quando a cota anual não fosse atingida.
Além disso, os inconfidentes mineiros tinham contato com as ideias iluministas, em franca expansão na Europa, que questionavam o sistema colonial e defendiam o liberalismo na esfera política (República) e econômica (intervenção mínima do Estado).
A ideia dos revoltosos era, portanto, proclamar a independência de Minas Gerais e do Rio de Janeiro (não havia um projeto de independência geral do país) e proclamar a República Federativa, nos moldes do que havia acontecido nos Estados Unidos alguns anos antes.
Não houve, na Inconfidência Mineira, qualquer debate sobre a abolição da escravatura, confirmando o caráter elitista do movimento, que era formado por intelectuais e membros das classes mais ricas da sociedade, como os poetas Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, os padres José da Silva Rolim e Carlos Correa de Toledo e Melo e importantes militares. Tiradentes era um dos poucos representantes das classes menos abastadas e credita-se a isso o fato de ter sido o único executado com o fracasso do movimento. Outros envolvidos foram expulsos do país, mas não levados à morte.
Um fato curioso é que, por ter sido alferes – baixo posto militar – Tiradentes dificilmente teve a barba longa, como costuma ser retratado. Acredita-se que esse recurso é uma tentativa de aproximá-lo à figura de Jesus Cristo, reforçando a construção de herói nacional no imaginário coletivo.
A ideia dos inconfidentes era proclamar a independência no dia em que seria recolhida da derrama, para gerar apoio da população das cidades vizinhas ao movimento. O lema seria libertas quae sera tamem (liberdade, ainda que tardia), trecho de um poema em latim, ainda hoje estampado na bandeira de Minas Gerais.
Os planos foram frustrados, no entanto, por conta da traição de Joaquim Silvério dos Reis, que delatou os companheiros em troca do perdão de sua dívida com a Coroa.
Tiradentes assumiu toda a culpa pelo movimento. Seu julgamento levou três anos e ele terminou enforcado, no dia 21 de abril de 1792, com o corpo esquartejado e exposto em diversos locais, entre o Rio de Janeiro e Minas Gerais, como forma de intimidar outros possíveis movimentos contrários à metrópole.
Com o tempo, Tiradentes passou a representar a identidade republicana no Brasil. A primeira grande festa em sua homenagem aconteceu no dia 21 de abril de 1890, com uma solenidade presidida pelo marechal Deodoro da Fonseca. Somente em 1965, o marechal Castelo Branco sancionou a Lei nº 4.897, que estabeleceu o dia 21 de abril como feriado nacional e Tiradentes como Patrono da Nação Brasileira.
Algumas frases de Tiradentes documentadas durante o processo de julgamento*
“(...) que os nacionais dessa América não sabiam os tesouros que tinham e que podiam aqui ter tudo se soubessem fabricar”
“(...) poderia assim suceder que essa terra se fizesse uma república, e ficasse livre dos governos, que só vêm cá ensopar-se em riquezas de três em três anos, e quando eles estão desinteressados sempre têm uns criados, que são uns ladrões, e que as potências estrangeiras se admiravam, de que a América Portuguesa não se subtraísse da sujeição de Portugal”
"(...) a nova república que se estabelecesse deveria ter uma bandeira (...) deveria ter um triângulo, representando as três pessoas da Santíssima Trindade"
*Fonte: Auto de continuação de perguntas feitas ao Alferes Joaquim José da Silva Xavier – 4ª sessão de perguntas em 18/01/1790. Assinados por José Pedro Coelho Machado Torres (desembargador e juiz da devassa), Marcelino Pereira Cleto (Ouvidor e Corregedor da Comarca do Rio de Janeiro e escrivão para a devassa), José dos Santos Rodrigues e Araujo (tabelião) e Joaquim José da Silva Xavier (Alferes, inquirido).
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