2020 não é um ano para amadores. Me refiro ao “novo normal” e à situação surreal que o novo coronavírus nos impôs. Mas não quero propor aqui uma reflexão sobre como nos comportarmos frente à “normalidade” que estamos vivenciando, pois diariamente estamos sendo, e muito, informados sobre a situação da pandemia no Brasil e no mundo e das formas de nos protegermos contra o famigerado SARS-CoV-2 (nome dado pelo Comitê internacional de taxonomia viral – ICTV) , vírus causador da doença Covid-19 (nome dado pela Organização Mundial da Saúde – OMS).
Como professor de Biologia, quero bater um papo com você sobre alguns tópicos que não são discutidos abertamente. Quero me ater a elementos fundamentais para que você tenha um bom desempenho em provas e, obviamente, ampliar o entendimento sobre o panorama que nos foi imposto por um “ser” que não podemos ao certo chamar nem de vivo nem de não vivo. Aliás, tenho minhas dúvidas se podemos chamar esse fechador de mundo de “um ser”.
O fato é que esse “fechamento do mundo” está diretamente relacionado ao primeiro termo que temos que analisar mais de perto para não haver confusão quanto ao seu sentido verdadeiro. Somos testemunhas oculares de uma pandemia sem precedentes na história contemporânea. Mas porque estamos passando por essa situação fechadora de mundos? Pandemias e suas irmãs menos agressivas, epidemias e endemias, seguidas dos surtos, estão sempre envolvidos com doenças infecto contagiosas, ou seja, causadas por micro-organismos patogênicos aos seres humanos.
Covid-19: de Epidemia a Pandemia
Analisemos o início da Covid-19 para estabelecermos a diferença entre esses termos: em dezembro de 2019 houve, na província de Hubei, cidade de Wuhan, na China, um SURTO de uma pneumonia sem causa conhecida e nunca antes detectada em humanos que espantou as autoridades de saúde locais. Após exames específicos foi identificado que o agente causador (etiológico) da doença era um tipo de coronavírus que não circulava, anteriormente, entre os seres humanos. Uma característica epidemiológica comum às pessoas que apresentavam a doença foi que as mesmas haviam frequentando o mercado de frutos do mar em Wuhan. Ao se espalhar rapidamente pelo território chinês o surto ganhou o título de EPIDEMIA e no dia 31 de dezembro de 2019 o governo chinês
informou a OMS que havia algo estranho ocorrendo no país, ligando assim, o sinal de alerta na saúde pública mundial.
Em território brasileiro, o primeiro caso de Covid-19 foi declarado em 26 de fevereiro de 2020. Com o espalhamento da doença em vários países do mundo a OMS decretou no dia 11 de março que o mundo estava vivenciando uma PANDEMIA de Covid-19 causada pelo SARS-CoV-2. Vale lembrar, embora não esteja relacionada à Covid-19, que as ENDEMIAS são causadas por doenças que afetam uma determinada região e não se espalha ao entorno ou seja elas não têm relação quantitativa e sim local, uma doença endêmica é uma patogenia típica de determinada região.
Voltando ao SARS-CoV-2, esse “ser” causador de tantos transtornos ainda hoje é um grande ponto de interrogação para a ciência, mas como falei vou me ater a algumas questões não tão faladas e que podem salvar aquele estudante que vai participar de algum concurso vestibular bem como o entendimento da atual situação.
Conhecendo um pouco mais sobre o coronavírus
Pois bem, o tal agente etiológico da Covid-19 é um vírus zoonótico, ou seja ele é capaz de infectar diferentes espécies de animais incluindo o homem. Sim: o famigerado novo coronavírus conseguiu vencer a barreira das espécies saltando de um hospedeiro para o outro até conseguir pular no organismo humano.
Momento “papo técnico”: eventos moleculares como mutações e recombinações gênicas agregados à seleção viral permitiram que o inconveniente vírus se adaptasse a infectar nossas células, principalmente aquelas do sistema respiratório superior (cavidade nasal, faringe, laringe e parte superior da traqueia) e inferior (parte inferior da traqueia, brônquios, bronquíolos e pulmões).
Vírus é realmente um ser vivo?
Mas o que são vírus? Que tipo de “ser vivo” é capaz de fazer tanto estrago na nossa espécie e em outras também? Primeiramente gostaria de chamar a atenção para o fato de que em alguns meios de comunicação o termo “matar o vírus” virou quase que uma máxima de proteção contra o “coronga”. Meus queridos, não dá para matar algo que quando não está parasitando uma célula, não está “vivo”. Os vírus, fora das células (vírions), não possuem características para serem incluídos no grupo dos seres vivos de acordo com a denominação, mesmo que controversa para alguns biólogos, de vida. Esses “seres” não possuem metabolismo próprio nem estruturação celular, características básicas para chamá-los de seres vivos. Por outro lado possuem características para chamá-los de vivos, quando parasitando células, como um material genético compatível com o do hospedeiro e isto se refere também ao mesmo tipo de código para a produção de suas proteínas, o código genético viral é o mesmo código compartilhado pela maioria esmagadora dos seres vivos e como disse anteriormente esse código se refere à forma pela qual os seres vivos produzem suas proteínas.
Então podemos dizer que os vírus são parasitas intracelulares obrigatórios, caso contrário não conseguiriam se reproduzir, ou seja eles precisam estar dentro das células, escravizando-as para que elas (as células) controladas pelos vírus produzam novas partículas virais. Diante desse impasse intelectual podemos dizer então que os vírus são partículas infectantes formadas por substâncias químicas; basicamente um pacote de proteínas (capsídeo) que envolve o material genético (DNA ou RNA).
Papo técnico que pode ser cobrado na prova
Momento “papo técnico” 2: o capsídeo mais o material genético podem ser chamados também de núcleo capsídeo. Os vírus podem ou não, também, possuírem um envoltório formado por lipídios e glicoproteínas (vírus envelopados) que, em contato com as células hospedeiras, causa um enorme e devastador estrago.
Sendo mais específico agora, o SARS-CoV-2 é um tipo de coronavírus, e essas partículas são vírus zoonóticos que parasitam principalmente morcegos, e o nome corona vem do fato de possuírem, no seu envelope lipoproteico, espículas formadas por glicoproteínas (proteínas e carboidratos) que se assemelham à coroa solar, então esse “infeliz” possui, além do capsídeo, um envelope que, pasmem vocês, é bem similar à membrana plasmática das células que ele escraviza. E tem mais: o material genético do novo corona vírus é um RNA (ácido ribonucleico), aquela molécula que faz a ponte das informações do núcleo, onde existe a receita para a produção de proteínas na molécula de DNA (genes), para o citoplasma das células onde ocorre a produção efetiva das moléculas proteicas.
Mais “papo técnico”? Temos: o material genético do SARS-CoV-2 é um RNA de filamento positivo que é usado diretamente no citoplasma da coitada parasitada para a produção direta das proteínas virais e consequentemente formação de novos vírus acarretando a destruição da célula. E como se não bastasse esse agente se multiplica muito rapidamente nas vias respiratórias superiores e lá permanece por um tempo razoavelmente grande facilitando assim a disseminação da Covid-19. Vamos lembrar que o novo coronavírus parasita também as vias respiratórias inferiores causando, em alguns casos, um quadro de hiperinflamação que pode levar o paciente a morte.
Proponho agora uma rápida reflexão: Pelo fato de ser um vírus zoonótico a forma mais eficaz de se evitar novas doenças zoonóticas seria manter a barreira estabelecida entre os reservatórios naturais das doenças e a sociedade humana. #Ficaadica. Muita saúde e juízo para todos. Grande abraço.
Nelson Fernandes é professor de Biologia do Percurso e Determinante Pré-vestibular.