Não se iluda ao pensar que entrar na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) ficará mais fácil com uma única etapa, representada pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), sem o peso das questões abertas da segunda fase. Nos cursinhos, o assunto de ontem foi um só: o fim do vestibular e a adesão da maior instituição de ensino superior do estado ao Sistema de Seleção Unificada (Sisu). Nos preparatórios, a aposta é de uma disputa ainda maior, especialmente com estudantes de São Paulo, vistos como os principais concorrentes dos mineiros. Com gente de todo o país na briga, o que promete aumentar ainda mais a média de 60 mil inscritos por ano, a previsão é de afunilamento geral, nos cursos mais tradicionais até nos menos concorridos.
Isso porque a UFMG se torna um dos destinos mais cobiçados, por fazer parte do grupo de universidades de excelência do país a adotar o modelo, junto com as de Brasília (UnB) e do Rio de Janeiro (UFRJ). Um novo fenômeno também é esperado: muitas chamadas extras, para compensar a desistência de candidatos que se inscreverem, mas, aprovados em outros vestibulares, optarem por estudar mais perto de casa.
Coordenador do cursinho Pré-UFMG, Paulo Miranda é categórico: “Não tenha dúvida, não ficou mais fácil, ficou mais difícil”. Para exemplificar, ele compara o vestibular da medicina da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), que já adota o Sisu, com o da UFMG. “A Ufop tem menos tradição, mas exige uma nota muito maior, porque a concorrência é brutal, o que passará a ocorrer também na UFMG, UnB e UFRJ, que dentro do Sisu são as unidades de referência. Antes, concorria na UFMG quem estava disposto a pagar R$ 100 pela inscrição e a fazer a segunda etapa em BH”, diz.
Nesse novo cenário, cuja nota será dada pelo Enem, ele acredita em uma hierarquização das escolas e em uma concorrência muito mais acirrada. “Quando se tem concorrência com pessoas do país inteiro, os alunos vão querer, justamente, aquelas universidades que são referência e que receberão os melhores”, ressalta.
Para Miranda, a Federal de Minas será alvo, principalmente, dos estudantes de São Paulo, estado vizinho, mais rico e populoso do país, cujas principais universidades não aderiram ao Sisu. “O Enem trouxe vários candidatos que fazem vestibular em São Paulo e que prestaram exames lá e em Minas. Acabaram por ficar perto de casa ou onde consideraram melhor. Tivemos 150 vagas em medicina na segunda chamada ano passado, o que mostra que estudantes de Minas não passaram, ficaram na lista de espera”, pondera. O coordenador acrescenta que esse fenômeno se estenderá para os cursos menos concorridos e implantados recentemente na universidade. “Teremos segundas chamadas longas a partir do ano que vem”, prevê.
A invasão de estudantes de outros estados já é fato no câmpus de Belo Horizonte. No vestibular 2011, o primeiro a usar o Enem como substituto da primeira etapa, o número de aprovados no concurso que declararam morar ou ter concluído o ensino médio em outros estados dobrou, fato que se repetiu na edição do ano passado. O fenômeno também se reflete entre os inscritos. Em 2011, dos estados que mais enviaram candidatos, São Paulo liderou o ranking, com 10.721, seguido pelo Rio de Janeiro (1.149). Ano passado, 15% dos classificados para a segunda fase eram de outras unidades da federação, com os paulistas de novo na ponta.
O diretor pedagógico do pré-vestibular Chromos, Aimã Sampaio, porém, minimiza os efeitos da mobilidade de estudantes. “Na prática, o deslocamento de alunos de um estado para outro não tem ocorrido. Há dados recentes comprovando que 80% das vagas tinham sido, a princípio, ocupadas por alunos de fora, mas que não se matricularam”, afirma, sem se referir especificamente à UFMG. “Haverá, sim, a necessidade de mais chamadas para preencher as vagas, mas acabarão nas mãos de quem está em gravitando em torno de BH”, acredita.
Surpreendidos
O fato é que, nos lares mineiros, a preocupação de pais e filhos já é grande. A estudante Rafaela Cristina Souza de Oliveira, de 18, aluna do Chromos, que está em dúvida entre direito e administração, diz que foi pega desprevenida. “Todo ano há boatos, mas, como nunca se concretizaram, nos preparamos para a primeira etapa com o Enem e, depois, para a segunda com questões abertas”, conta. Para Rafaela, é falsa a impressão de uma seleção mais fácil. “Neste primeiro momento, odiei a notícia, pois, sendo em nível nacional, ficará bem mais difícil. Antes, se eu tirasse nota melhor em exatas, tinha diferencial para ir para a fase seguinte. Agora, tem que ir bem em tudo. Em um curso concorrido, será preciso um mínimo de 850 pontos para garantir a aprovação”, relata.
A administradora Lígia Lemos da Costa, de 49, teme pelo futuro da filha, Amanda Costa, de 18, que estuda em escola particular da capital. “Fiquei apavorada com a notícia. Minha filha vai tentar engenharia química, que foi um dos mais concorridos deste ano, e, agora, a tendência é piorar. Ela terá de fazer o caminho inverso também: provas em outros estados, para garantir uma vaga em federal. Senão, o jeito será estudar em uma universidade particular”, diz.
Tira-dúvidas
O que é o Sisu?
» É um sistema informatizado do Ministério da Educação, por meio do qual instituições públicas de educação superior oferecem vagas a candidatos participantes do Enem.
Quem pode se inscrever?
» Todo estudante que participar do Enem e obtiver nota superior a zero na redação. Algumas instituições exigem nota mínima para determinados cursos. É necessário informar o número de inscrição e a senha usados no Enem do ano em questão.
Como é feita a inscrição?
» A inscrição é feita somente pela internet e não tem taxas. O candidato pode simular várias vezes, mas se inscrever em até duas opções de cursos, que podem ser da mesma instituição ou de universidades diferentes.
Quantas vagas o Sisu oferece?
» Para a primeira edição de 2013 foram 129.319 vagas espalhadas pelo país.
O que deve fazer Quem já tem um curso superior e quer obter novo título?
» Na UFMG, esses candidatos faziam a segunda etapa como avaliação para conseguir a vaga em um novo curso. Agora, terão que fazer o Enem e as notas serão avaliadas pela instituição, sem passar pelo Sisu.
Há oferta de vagas para cursos na modalidade de ensino a distância no Sisu?
» Não. O processo seletivo é somente para vagas de cursos presenciais.
Qual foi a concorrência no último processo?
» A média foi de 15 candidatos/vaga, com 1,9 milhão de inscritos. O segundo curso mais procurado este ano foi medicina da Universidade Federal de Juiz de Fora: para as 127 vagas ofertadas, se inscreveram mais de 12 mil pessoas.
Quantas universidades estão inscritas?
» São 101 instituições, sendo 43 universidades federais, 38 institutos e dois centros de educação tecnológica, uma faculdade federal e 17 institutos estaduais
Quais universidades mineiras participam?
» Além da UFMG, as federais de Ouro Preto, Viçosa, Lavras, Alfenas,
Juiz de Fora, Itajubá, Uberlândia e dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.
O que vai mudar no calendário escolar?
» As escolas e cursinhos terão que reorganizar o calendário. Agora, alunos não precisarão intensificar os estudos nas questões abertas e as aulas de dezembro e janeiro devem ser extintas.