Jornal Estado de Minas

Estudantes de Santa Luzia seguem à espera do MEC para refazer as provas do Enem

Jéssica, Luiza e Maria Cecília consideram um avanço que a violência contra a mulher tenha sido tema de redação - Foto: Rodrigo Clemente/EM/D.A Press
O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2015 marcou estudantes de todo o Brasil e, de forma especial, alguns mineiros. O dia seguinte ao fim das provas foi diferente para Maria Cecília Viveiros e Santos, de 18, Jéssica Vancarla Rodrigues Souza, de 23, e Luiza Franqueira Leite, de 22. Feministas, as meninas consideraram um avanço a redação ter como tema a persistência da violência contra a mulher. Em Esmeraldas, na Grande Belo Horizonte, o poeta Diovani Mendonça não teve sossego depois que o projeto desenvolvido por ele, Pão e Poesia, virou tema de uma das 45 questões da prova de linguagens, códigos e suas tecnologias. Já três estudantes de Santa Luzia (Grande BH) ainda se recuperavam ontem de um trauma no sábado: por um erro de fiscais de prova, elas tiveram menos tempo para fazer o exame.

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Diferentemente de milhares de estudantes que fizeram o exame no fim de semana e nessa segunda-feira descansaram, as luzienses Júlia Lanzetta, de 17, Júlia Santiago e Júlia Íris, ambas de 18, estavam apreensivas. As três lembram que uma aplicadora de prova da Escola Estadual Leonina Mourthé de Araújo, no Bairro São Benedito, encerrou as provas às 17h30, quando o correto seria às 18h. Ao saírem da escola, as estudantes perceberam que outras pessoas ainda respondiam a questões e procuraram um policial militar para registrar boletim de ocorrência.


O Inep, organizador do Enem, reafirmou nessa segunda-feira que, por causa do erro, as alunas terão direito a repetir o exame em 1º de dezembro, com candidatos que farão o Enem PPL (pessoas privadas de liberdade). Ainda assim, as três cobram mais informações. “Quero saber primeiro se é possível, onde vai ser a prova, como vai ser e se prevalecerá a maior nota”, disse Júlia Íris. Até ontem à tarde, elas ainda não tinham recebido nenhuma comunicação do ministério. “Ainda estou abalada com toda a confusão”, conta Júlia Santiago.

REDAÇÃO Já a escolha do tema de redação (violência contra a mulher) foi motivo de comemoração entre muitas alunas. “O Enem colocou mais de 7 milhões de estudantes para pensar sobre a violência contra a mulher. Isso é importante, muda as estruturas”, disse a candidata Maria Cecília Viveiros.  Em sua redação, a estudante, que pretende ser médica, problematizou a relação entre a persistência da violência contra mulher e a cultura machista.
Como proposta para solucionar o problema – que é uma das exigências feitas pelo Enem – a jovem defendeu a maior divulgação de canais de denúncia e a criação de delegacias especializadas.

O poeta Diovani Mendonça criou projeto que imprime versos em embalagens de pão e acabou citado em questão - Foto: Arquivo pessoal
A jovem lembra que ela e outras colegas, mesmo que não tenham sofrido casos de violência, podem ajudar a minimizar o problema ao denunciá-lo. Amiga de Cecília, Luiza Leite destacou que muitas mulheres temem denunciar, porque, embora sejam vítimas, se consideram responsáveis pela violência sofrida. “Muitas estão em relações abusivas e não sabem.” A mãe de Luiza, a funcionária pública Elizabeth Regina Franqueiro, de 54 anos, considerou relevante o debate gerado pelo tema. “Aprendi com minha filha a ser feminista, passei a andar de cabeça erguida. Tenho orgulho dela, como de toda essa geração que tem voz ativa”, afirmou.


Na avaliação da professora de português do Colégio Bernoulli Janaína Rabelo, as escolas deverão se aprofundar em temas relacionados às minorias e aos direitos civis. Para ela, tanto o tema da redação quanto as questões da prova de ciências humanas apontam que os alunos precisam construir repertório mais amplo, o que fará com que disciplinas como filosofia, sociologia e antropologia ganhem destaque nas salas de aula. 

POESIA
Embora não tenha feito a prova, o poeta Diovani Mendonça acabou virando centro das atenções no Enem.

Ele é criador do projeto Pão e Poesia, que consiste em imprimir versos em embalagens de pão e foi citado em questão da prova. Ele conta que recebeu vários e-mails, ligações e mensagens nas redes sociais durante todo o dia de ontem. “Estou com um sentimento de gratidão que transborda nos olhos. Lembrei-me de toda a caminhada do projeto, iniciado com um sonho maluco e que contou com apoio de muitas pessoas”, recorda.


O projeto começou em 2008, quando Diovani estava no distrito de Caracóis, em Esmeraldas, e, em uma conversa de bar com um empresário, explicou o seu plano de espalhar poesia no papel de pão. O empresário, dono de gráfica, doou o material, assim como outros proprietários de empresas que também foram voluntários, para imprimir 300 mil embalagens, com imagens de artistas plásticos, textos de poetas renomados e novatos. “Queria disseminar a poesia por diversos lugares”, afirma Diovani.

O projeto foi premiado em um concurso do Ministério da Cultura, expandido para salas de aula com cursos de sensibilização poética ministrados por Diovani, entrou em leis de incentivo à cultura, recebeu patrocínios de empresas e multinacionais e as embalagens de pão se espalharam por diversos bairros da periferia de BH, Sabará e até no interior paulista, totalizando quase 1 milhão de impressos.

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