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Estado de Minas

Mais da metade da população adulta de Minas estudou apenas até o fundamental

Pesquisa aponta que 54,5% da população de Minas com 25 anos de idade ou mais estudou apenas até o ensino fundamental. Estado convive ainda com 1,06 milhão de analfabetos


postado em 22/12/2017 06:00 / atualizado em 22/12/2017 11:53

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)
Números divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelaram uma Minas Gerais de pouca escolaridade formal, com muitas lacunas em sala de aula e um longo caminho a percorrer para sanar o grande gargalo da educação: a evasão escolar. De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), mais da metade da população do estado com 25 anos de idade ou mais estudou apenas até o ensino fundamental. São 54,5% da população de adultos mineiros que deveria ter concluído o processo regular de escolarização, mas cumpriu somente a etapa mais básica do ensino – aquela voltada a crianças e adolescentes de 6 a 14 anos. O estado convive ainda com outra mazela: 1,06 milhão de analfabetos. Segundo especialista, o levantamento mostra sinal de alerta e uma educação pela metade.

Em números percentuais, significa 6,2% das pessoas de 15 anos ou mais sem qualquer letramento, um pouco abaixo do observado para o Brasil (7,2%). Essa taxa, segundo a Pnad, apresentou relação direta com a faixa etária, aumentando à medida que a idade avançava até atingir 19,1% entre os mineiros com 60 anos ou mais. Os resultados da pesquisa são referentes a 2016.

Eles mostram ainda que a população com idade superior a 15 anos tem, em média, 7,8 anos de estudo. No Brasil, o tempo médio é de oito anos. “Esse número é menor que a quantidade de tempo que se passa no ensino fundamental (nove anos), o que significa que os alunos evadem antes. Por isso, são importantes projetos para trabalhar a correção de fluxo e deixar o aluno com idade e série adequados”, afirma a analisa educacional na Diretoria de Ensino Fundamental da Secretaria de Estado de Educação, Mônica de Oliveira Ribeiro Couto.

Quando considerados gênero e raça, também há distorções. No estado, a taxa de analfabetismo para os homens com 15 anos ou mais de idade foi de 6,1%; e para as mulheres, 6,3%. Analisando por cor ou raça, verifica-se que a taxa de analfabetismo para as pessoas pretas ou pardas é quase duas vezes maior que entre as brancas – 7,7%, frente a 4,2%. Ano passado, 97,7% das crianças e adolescentes de 6 a 14 anos estavam frequentando o ensino fundamental em Minas, enquanto no país essa proporção era de 96,5%.

FORA DO TEMPO No estado, na etapa inicial, que idealmente deve ser cursada dos 6 a 10 anos de idade, 96,8% dos alunos tinham a idade correta para a série em que estavam, ou seja, 3,2% dos meninos estavam fora da série padrão. Na fase seguinte, do 6º ao 9º ano (11 a 14 anos), a proporção começa a se inverter e o percentual de estudantes atrasados sobe para 9,7%, seja por reprovação ou evasão.

A explosão ocorre na passagem para o ensino médio: 29% dos estudantes de 15 a 17 anos estão na série inadequada para a idade. Distorção que permanece no ensino superior, no qual apenas um quarto dos universitários mineiros (25,9%) percorreram o trajeto escolar sem atrasos e chegaram à graduação no tempo regular. A média do país é de 23,8%.

O desafio da volta e da permanência


O auxiliar administrativo Giovanni Delamare Passos, de 28 anos, abandonou a escola quando estava no 1º ano do ensino médio, aos 17 anos. Todo ano o desânimo falava alto e ele nem chegava a concluir o período letivo. Saía antes da escola. Até o dia em que deu o adeus que pensava ser definitivo. “Eu não gostava de estudar, a metodologia dos professores e o conteúdo das aulas não eram interessantes e eu já trabalhava na época. Tudo isso somado ao meu desinteresse me fez desistir”, conta. Mas, 11 anos depois ele voltou à sala de aula, desta vez na Educação de Jovens e Adultos (EJA), por meio da qual tentará concluir a educação básica em três semestres. “À medida que vamos ficando mais velhos, vamos vendo a necessidade de certas conquistas que só se tem com o estudo e sentindo o peso do mundo nas costas na condição financeira, por não ter uma profissão”, diz o jovem, que sonha agora com o curso superior de tecnologia da informação.

Assim como Giovanni Passos, mais da metade da população mineira concluiu apenas o ensino fundamental, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgados ontem. A professora de pedagogia e pós-graduação do Centro Universitário Uni-BH Verônica Figueiredo chama a atenção para as consequências do analfabetismo ou do baixo grau de instrução da população. “Quanto menor o desenvolvimento acadêmico de um povo, menor será o desenvolvimento científico e em várias outras áreas. Interfere também na cultura e na formação do sujeito. A convivência faz parte dos quatro pilares preconizados pela Unesco em relação ao aprender”, diz. “Se nossos cidadãos não frequentam a escola ou a frequentam pouco, serão pouco desenvolvidos”, ressalta.

A analisa educacional na Diretoria de Ensino Fundamental da Secretaria de Estado de Educação, Mônica de Oliveira Ribeiro Couto, diz que a pasta promove várias ações que favorecem não só a inserção de crianças, jovens e adultos, mas também a permanência deles. Entre elas está a oferta de vagas na educação integral e integrada. Dois projetos servem como antídoto da evasão. Um deles é o acompanhamento pedagógico diferenciado para alunos do 4º ao 9º anos, num trabalho que envolve letramento e cálculo. Este ano, foram atendidos 18.999 estudantes diagnosticados com alguma defasagem no processo de alfabetização.

O outro são circuitos de aprendizagem em língua portuguesa e matemática. Há também programas para corrigir a defasagem de idade e série, além daqueles voltados para reinserir alunos que estão fora da escola. “Um dos grandes gargalos da educação é a evasão. Por isso, a importância de tornar a escola mais atrativa por meio de professores e de outras metodologias de ensino que façam a criança e o jovem permanecerem”, ressalta Mônica.

Três perguntas para


Andrea Ramal, educadora, consultora em educação e doutora em educação pela PUC-Rio

Ainda somos um país de semianalfabetos?
Isso não se aplica totalmente. Os números da Pnad em Minas refletem, de um modo geral, o crescimento do acesso à educação básica que ocorreu nas últimas décadas. Ao contrário do que acontecia há 40 anos, hoje temos no Brasil um número significativo de crianças entre 6 e 14 anos na escola (em Minas, 99,3%), mas não era assim há algumas décadas, o que explica que uma parcela importante da população com 25 anos ou mais tenha apenas o ensino fundamental (em Minas, 54,5%).

O que explica essa variação de adequação da idade/série e esses saltos de uma etapa para outra da formação escolar?
Mesmo tendo mais gente na escola, os números mostram que o problema está no processo de aprendizagem. A distorção idade/série se acentua ao longo dos anos, mostrando que os alunos repetem de ano e a escola vai se tornando um funil. A responsabilidade disso não é só da escola, claro, mas das condições sociais e culturais em que os estudantes vivem. Um conjunto de fatores resulta no quadro que a Pnad retrata. Não podemos falar necessariamente de analfabetos funcionais nem de semianalfabetos, mas sem dúvida podemos comprovar um quadro de baixa escolaridade e de alto risco de não aprendizagem.

Qual a consequência desses números na educação formal brasileira?

Podemos inverter a pergunta: na verdade é a educação formal brasileira que está causando esses números. Seja porque a escola não é eficaz como deveria, seja porque os estudantes não encontram as condições necessárias (sociais, econômicas e culturais) para aprender e evoluir naturalmente, ao longo dos anos, na série adequada para a idade. O fato é que uma parte importante da população estudantil enfrenta o fracasso escolar, com a repetência de um ou mais anos, ou os baixos indicadores de aprendizagem. A Pnad é um sinal de alerta: temos uma educação pela metade.


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