Jornal Estado de Minas

Falência de gráfica coloca Enem sob risco; entenda

A gráfica que imprimiria o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) decretou falência ontem e paralisação de todos os trabalhos. Segundo especialistas, o incidente pode ameaçar a realização do maior vestibular do país. A RR Donnelley, multinacional responsável pela prova desde 2009, informou que "precisou encerrar suas operações no Brasil" por causa das "atuais condições de mercado".
 
O ideal é que a prova fosse para a gráfica ainda este mês ou, no máximo, em maio, para que o cronograma não atrase. A notícia, revelada pelo jornal O Estado de S. Paulo, causou insegurança em estudantes que se preparam para o exame que, em 2018, teve 6 milhões de candidatos. O vestibular será em novembro e começaram ontem as inscrições para quem quer pedir a isenção da taxa.
 
A falência complica mais a situação do Enem, que está sendo afetado pela atual crise no Ministério da Educação (MEC). Na semana passada, o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), Marcus Vinicius Rodrigues, foi demitido ao se desentender com o ministro Ricardo Vélez Rodríguez. O Inep é o órgão responsável pelo Enem.
 
O presidente do Inep daria o aval para o trabalho da comissão criada mês passado para analisar questões consideradas "inadequadas" na prova.
Ainda não foi nomeado um substituto. Rodrigues também havia pensado em usar a Casa da Moeda para parte da impressão do Enem, mas a ideia não foi adiante. Procurado desde a manhã de ontem, o Inep não se manifestou.
 
Só depois de finalizado o trabalho da nova comissão é que a prova com 180 questões será montada. "Uma coisa é fazer a prova em novembro, outra coisa é o que tem de ser feito agora, há uma cadeia para ser viabilizada", diz o especialista em avaliação e professor da Universidade de São Paulo (USP) Ocimar Alavarse. "Não é qualquer gráfica que pode imprimir o Enem, há um risco grande."
 
A RR Donnelley assumiu a impressão quando a prova foi roubada e cancelada em 2009, na gestão de Fernando Haddad no MEC. O episódio foi revelado pelo Estado à época. Depois disso, foram feitas apenas duas licitações nesses dez anos para impressão da prova - em 2010 e em 2016. 
 
Ambas foram vencidas pela RR Donnelley e os contratos foram prorrogados por cinco anos.
Em 2016, o valor do serviço era de R$ 130 milhões. A empresa também venceu licitações para imprimir outros exames do Inep. Concorrente da RR Donnelley, a Gráfica Plural entrou com representação no Tribunal de Contas da União (TCU) em 2016, alegando que havia "direcionamento do certame" por causa de "exigências restritivas". Até hoje não há deliberação do TCU a respeito.
 
A licitação realizada no ano passado para impressão do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade) também está parada por questionamentos na Justiça. 
 
"O governo federal está prestes a chegar aos 100 dias sem ter muito o que mostrar em educação. Espero que esse episódio não sirva de justificativa para atrasos e alterações no Enem, que tem imensa repercussão na vida dos jovens", disse a presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz.
 
História
 
O roubo do Enem em 2009 foi justamente dentro da Gráfica Plural, que havia sido contratada por um consórcio vencedor da licitação para aplicar a prova. A Justiça, no entanto, não responsabilizou a gráfica pelo crime porque o furto foi realizado em um ambiente cedido para o consórcio. Na sequência, o Inep instaurou diversos processos de logística e segurança para o Enem. A contratação da gráfica passou a ser de responsabilidade do Inep.
 
"Toda mudança traz risco", diz o então presidente do Inep, Reynaldo Fernandes.
Segundo ele, o governo continuou com a RR Donnelley porque ela se mostrou eficiente e segura. Mas uma maneira de minimizar os problemas de segurança, diz, seria descentralizar a prova. "Temos de sair desse sistema de uma prova única, já temos tecnologia para isso."
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