A expectativa era de crescimento, o que se revela nas matrículas e na quantidade de câmpus espalhados pelo estado. Mas, enfrentando também um novo corte nas finanças, as escolas de ensino técnico fazem as contas e avaliam se terão condições de se manter ao menos até o fim do ano.
Se nos cortes feitos nos últimos quatro anos se buscou preservar as verbas de custeio, aquelas voltadas para a manutenção das instituições, desta vez elas não foram poupadas. Alguns institutos federais não podem contar mais com praticamente 40% desses recursos. Caso do Instituto Federal do Sul de Minas, onde até a alimentação dos estudantes está em risco. A instituição viu mais de R$ 16,2 milhões de seu orçamento anual ser retidos, deixando comprometido o funcionamento de seus oito câmpus. Estudos da Pró-Reitoria de Administração mostram que o bloqueio, descontado o valor do auxílio-estudantil, representa um contingenciamento de 39,86% do orçamento institucional de operação, muito mais que os 30% citados.
Do total bloqueado, R$ 15,2 milhões se referem a custeio, o que inclui despesas como água, luz, manutenção de laboratórios e predial, de equipamentos, compra de ração e insumos para os setores agrícolas, terceirização, material de consumo, entre outros. Com isso, a reitoria teme ainda não conseguir arcar com as despesas de manutenção dos alojamentos em que moram os estudantes, o pagamento de água, energia elétrica, a compra de ração para os animais das escolas fazenda.
Há risco ainda de demissão de terceirizados, por causa do risco de para a manutenção dos contratos de prestação de serviço com limpeza e segurança. Em nota, a reitoria informou que será necessária revisão no processo de concessão de bolsas, das viagens técnicas e eventos voltados para pesquisa e extensão. Além disso, há a possibilidade de problemas na reposição de equipamentos dos laboratórios e em uma série de ações necessárias ao aprendizado.
As escolas tentam reverter a situação. Até quinta-feira, reitores e diretores das escolas de ensino técnico se encontram em Brasília na reunião mensal do Conselho das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), onde o bloqueio será a pauta principal das discussões. Na sexta, a instituição tem marcada reunião no MEC, onde também tratará do assunto.
No Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet-MG), a ordem dos últimos anos já foi de apertar os cintos. Para preservar as atividades de ensino, pesquisa e extensão, uma das instituições federais mais tradicionais do estado optou por vários ajustes internos, como demissão de pessoal de segurança e limpeza. Praticamente no meio do ano, novos cortes inviabilizam o pagamento de serviços básicos, como despesas com água, energia elétrica e atividades terceirizadas. Foram bloqueados R$16.983.100 de um total de R$ 48.048.931, um corte de 35,4%. “Um corte desse não é factível. Temos contratos assinados e isso é inviável. Se formos aplicar percentual dessa natureza, teríamos que encerrar as atividades em setembro ou outubro”, afirma o diretor-geral da instituição, Flávio Antônio dos Santos.
Limpeza, segurança, contas de água e luz, sem contar os projetos de natureza acadêmica, como aqueles que envolvem bolsas de estudantes dos ensinos técnico, da graduação e pós nos 11 câmpus estão prejudicados. O professor lembra que, em 2016, por determinação do governo federal, foi necessário reduzir as despesas em 15%,o que levou à demissão de terceirizados e ajustes nos contratos de limpeza e segurança. “Fizemos o dever de casa. Agora, não há onde cortar”, afirma Flávio dos Santos. No período de 2015 a 2018, orçamento de custeio e capital sofreu redução de 23,2%.
“Minha única conclusão é de que haverá reversão dessa decisão. Embora tenhamos clareza de que um corte dessa magnitude torna inexequível a gestão até fim do ano, não temos certeza de qual será a disposição do novo governo para o diálogo com as instituições. Há expectativa de reversão, mas acho que a conscientização da sociedade é que será capaz de dar uma resposta às instituições.”
PRIORIDADES O governo federal justifica que os cortes nas instituições federais se volta para aplicação em creches e na educação básica. O ministro da Educação, Abraham Weintraub, chegou afirmar que com o valor de um aluno da graduação se investe em 10 crianças em creche. A reitora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Sandra Goulart, porém, rebate o raciocínio: “É preciso investir em todos os níveis. Não é tirar daqui (ensino superior) para clocar em creche – que é importantíssima também. Investir em educação assegura o futuro do país”, afirmou.
Reitores se mobilizam para reverter cortes
De hoje até quinta-feira, o bloqueio de recursos imposto pelo Ministério da Educação a instituições federais de ensino, incluindo universidades e institutos de ensino tecnológico, está na pauta da reunião mensal do Conselho das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif) que, coincidentemente, ocorre pouco depois do anúncio da retenção de orçamento. Reitores de todo o país tentarão mudar o quadro, a exemplo dos dirigentes de universidades, que marcaram reunião com o MEC para o dia 16. Sexta-feira, o Conif tem reunião marcada com o Ministério da Educação.
O bloqueio já é realidade também no Instituto Federal Sudeste de Minas, na Zona da Mata mineira. Mas, como não foi linear, as receitas referentes ao custeio e funcionamento da instituição tiveram um corte maior ainda, de 36,6%. Dos R$ 53,3 milhões previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA), R$ 16 milhões estão retidos nos cofres da União.
Ao longo desta semana, a reitoria e os dirigentes da escola se reúnem para avaliar os impactos e discutir possíveis ações, estratégias e cenários. A ideia é se antecipar para, caso a situação persista durante os próximos meses, agir “para atenuar o impacto desse bloqueio no orçamento das unidades, com vistas a garantir o pleno funcionamento da reitoria e dos câmpus, indistintamente, uma vez que tal bloqueio afetará a oferta de serviços de qualidade à sociedade nos eixos do ensino, da pesquisa e da extensão”, informou o reitor, Charles Okama de Souza, com pró-reitores e diretores, por meio de nota.
No Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro (IFTM), o contingenciamento é de 30% nas verbas de capacitação, 30% nas de fomento e 37% nas verbas de funcionamento da instituição, que, no entanto, não informou quanto o corte representa em valores.
No Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG), o bloqueio de R$ 15,3 milhões prejudica diretamente o atendimento aos mais de 25 mil alunos nas regiões Norte e Nordeste de Minas e vales do Jequitinhonha e Mucuri. Outros gastos importantes, como auxílios aos estudantes, bolsas de pesquisa e extensão e viagens técnicas também serão revistos e correm o risco de serem cortados.
No Instituto Federal de Minas Gerais, o corte foi de 32%, o equivalente a R$ 20,3 milhões – no custeio, o impacto foi de 39%. O bloqueio atinge todos os cursos, técnicos, superiores, de pós-graduação, ações de extensão e todas as áreas. O instituto lembra que, em 2014, a porcentagem do orçamento total para investimentos era de 18%. Para o ano passado, essa porcentagem caiu drasticamente: 3,83%. Com mais esse baque, o IFMG estuda até quando terá condições de manter o funcionamento básico de seus 18 câmpus.
Menos verbas, mais alunos
De acordo com o último Censo Escolar, em número total de matrículas a educação profissional aumentou 3,9% no ano passado em relação ao ano de 2017. As modalidades que mais cresceram foram a concomitante e a integrada ao ensino médio, com 8% e 5,5% respectivamente. O incremento nas matrículas da educação profissional técnica de nível médio foi de 4,3%. O Plano Nacional de Educação (PNE) propõe triplicar a oferta de educação profissional técnica de nível médio, com 50% da expansão no segmento público até 2024.
Enquanto isso...
...protestos no Rio de Janeiro
Ontem, alunos do Colégio Pedro II e outras instituições federais de ensino do Rio de Janeiro protestaram durante visita do presidente Jair Bolsonaro ao Colégio Militar, na Zona Norte da capital fluminense. Manifestantes gritavam palavras de ordem e empunhavam cartazes contra o corte de 30% nas contas de unidades mantidas pela União em todo o país. Bolsonaro, que participava de solenidade pelos 130 anos da instituição militar, foi surpreendido pela crítica de uma ex-aluna quanto ao seu posicionamento diante da educação pública.