Mesmo antes de a possibilidade da falta de água se transformar em realidade, muita gente já estava preocupada com o desperdício e procurando conscientizar amigos, vizinhos e parentes sobre a necessidade de evitar o consumo desnessário. São pessoas comuns, travando uma verdadeira batalha em defesa das mudanças de atitude e comportamento. As iniciativas começam em casa, se estendem a condomínios e chegam até a estabelecimentos comerciais que reúnem grande volume de pessoas. Nessa luta, que deveria ser de todos, está a gerente comercial Renata Melo, de 34 anos, moradora do Bairro Bandeirantes, na Pampulha, em Belo Horizonte. Para ela é simples: “Quem não está preocupado é inconsequente”.
Ela começou a sentir a diminuição do fornecimento de água ao ver torneiras secas no quintal de casa em algumas situações na semana passada. Dias antes, percebeu redução na pressão, indicativo de diminuição na quantidade de água liberada. A família não molha mais o gramado, não lava carro, quintal, varanda nem enche piscina. Ela entrou na rota da economia em 2014, quando o marido criou uma engenhoca para captar água da chuva e enchê-la. Em tempos de seca, o lazer acabou. Renata comprou uma lava-louça para reduzir a quantidade de água na limpeza. A varanda é limpa com pano e as roupas são usadas até ficarem realmente sujas.
No rastro de Renata está o diretor da GW Administração de condomínios, Gilberto Vespúcio, que tem feito campanha acirrada contra o desperdício e pela redução no consumo nos 400 prédios pelos quais a empresa é responsável, em BH. Circulares entregues aos moradores e cartazes afixados em elevadores servem para pedir que gastem menos água. “Temos a cultura de que em Minas, considerada a caixa d’água do Brasil, nunca faltaria água. Agora, isso mudou, mas a cultura das pessoas, infelizmente, ainda não”, diz. Entre as dicas dadas aos moradores estão as de praxe, com os cuidados ao escovar dentes, tomar banhos, lavar a louça e limpar dependências dos edifícios.
SÍNDICOS E FAXINEIRAS Vespúcio também orienta os síndicos a verificar possíveis vazamentos e a conversar com faxineiras para não lavar garagens e outros ambientes. Lavar carro, só com balde e, mesmo assim, uma vez por mês. Molhar jardim com frequência também não é necessário. A mobilização está rendendo frutos: já há moradores pensando em fazer reservatório para aproveitar água da chuva, quando ela vier. “A economia na conta de água não vai compensar, de imediato, os gastos de instalação. Mas as pessoas devem ter consciência de que água é um bem precioso e é de todo mundo.”
O exemplo começa no prédio onde mora. Além de deflagrar a campanha, Gilberto organizou vistorias nos 15 apartamentos para verificar possíveis vazamentos. O trabalho dá resultados, com redução considerável no consumo. Em novembro de 2013, a conta foi de R$ 2.143 e o consumo, de 350 metros cúbicos. Exatamente um ano depois, o valor caiu para $ 1.517,11 e 241 metros cúbicos. “Não é fácil e teve morador difícil de convencer.”
GRANDES CONSUMIDORES A preocupação de combater o desperdício deve ser estendida aos setores produtivos, dizem especialistas. A agricultura e a produção animal gastam em torno de 70% da água limpa consumida. Outros 15% são escoados na indústria e os 15% restantes correspondem ao consumo humano. Ainda assim, a água que chega na torneira das casas e dos hotéis retorna para os rios. “Será que os grandes consumidores também terão de economizar 30% ou pagar multa sobre o excedente?”, questiona Apolo Heringer , idealizador do Projeto Manuelzão e da Meta 2010 do Rio das Velhas.
Três perguntas para...
Érika Fabri
Coordenadora do curso de engenharia ambiental do Centro Universitário Newton Paiva
Você acredita que serão necessárias medidas mais enérgicas do poder público em BH para controlar a situação? Quais seriam as mais indicadas?
Não acredito em um racionamento de água em BH, porém medidas energéticas como aplicação de multas para o desperdício são bem vindas para tentar evitar ao máximo o racionamento. As multas são aplicadas as pessoas que usam a água para lavar calçadas, carros nas ruas, quintais, etc. Além das multas, outra solução seria o revezamento de abastecimento por regiões, porém essa medida já é mais radical e se assemelha ao racionamento.
Esse desperdício é fruto de uma questão cultural ou da falta de educação das pessoas?
O desperdício é fruto de ambas as questões: cultura e falta de educação. Existem pessoas realmente leigas no assunto e que desconhecem a necessidade de economizar. Um exemplo claro é o de alguns moradores rurais que dizem "a água sai da nascente passa pelo meu chuveiro e volta para o rio.".Eles desconhecem que essa água retorna para o curso d'água poluída, sem possibilidades de uso futuro. Outras pessoas simplesmente não se importam em gastar nem querem saber se vai faltar, principalmente gente que com situação financeira média a alta que diz "eu pago pela água e posso gastar."
Quanto se economiza numa casa sustentável?
Pode-se economizar muito, porém não é possível quantificar sem saber as especificidades da construção e do que se usa para economizar.