Estado de Minas
Pontes de madeira e falta de pavimentação aumentam risco na BR-367
Moradores de comunidade erguida pela Cemig, em Turmalina, sofrem com falta de luz

Descoberta de fungo leva produtores do Serro a apostar no queijo maturado

Pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (Ufla) constataram que o fungo Geotricum candidun, o mesmo que garante um sabor especial aos camemberts franceses, está presente no Serro

Paulo Henrique Lobato - Enviado especial

Juarez Rodrigues/EM/D.A. Press
Serro – “Negociávamos o queijo artesanal a R$ 10. Agora há peças de 800 gramas a R$ 120, R$ 150...”, comemora Júnior Barbosa, dono do sítio Boa Esperança, na cidade colonial do Serro, a primeira região a produzir a iguaria em Minas Gerais, no início do século 18. Da antiga propriedade saem encomendas para os exigentes mercados gastronômicos do Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília e Belo Horizonte.

A fama do queijo artesanal do município ultrapassou a fronteira do Vale do Jequitinhonha há décadas, mas, agora, a ciência ajudou a fomentar o preço na porteira. Pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (Ufla) constataram que o fungo Geotricum candidun, que não faz mal à saúde humana e é o mesmo que garante um sabor especial aos camemberts franceses, está presente em microambientes do Serro.

 

A novidade deixou os queijeiros eufóricos. Vários apostaram no terroir e substituíram parte da produção fresca pela maturada. Deu certo. Quem conta é Barbosa: “Não dava mais para custear as peças frescas a R$ 10. Com o maturado, o valor disparou. Dependendo do tempo de maturação, R$ 120, R$ 150...”.

O processo é uma viagem ao passado. Nos séculos 18 e 19, quando a região dependia do garimpo, a iguaria era levada em mulas e burros em viagens que duravam meses. A maturação ocorria naturalmente. O processo perdeu espaço para o queijo fresco após a abertura de estradas, o que permitiu a chegada da iguaria em pouco tempo à mesa do consumidor.

“O que estamos fazendo é resgatar o espaço do queijo maturado. A aceitação está boa e o preço, maravilhoso”, comemorou Jorge Brandão Simões, presidente da Associação dos Produtores Artesanais de Queijo do Serro (Apaqs). “Somos cerca de 800 fazendeiros em 11 cidades. Posso dizer que já há associado maturando metade da produção”, revelou, acrescentando que, em média, são preparadas 10 mil unidades diariamente.

 

Juarez Rodrigues/EM/D.A. Press
O alimento requintado precisa chegar às mesas certas. Por isso, o grupo participa de palestras e leva as iguarias a diferentes feiras gastronômicas. A qualidade do queijo do Serro é a combinação de fatores naturais de relevo, clima e vegetação, mas também se deve às mãos do homem no preparo, por exemplo, da manipulação do leite ao coalho.

“Todo cuidado é essencial”, reforça o fazendeiro Adilson Cirino de Carvalho, da propriedade Boa Vista. Ele aposta boas fichas no “antigo-novo” processo. Tanto que planeja aumentar o espaço físico em que os alimentos descansam até o ponto da maturação. “Esta peça tem um mês. Esta outra, três meses. O sabor é divino”, vibra o homem.

O queijo maturado atraiu novos clientes ao Serro. Compradores começaram a querer conhecer mais de perto as fazendas, o que abriu a porteira para um novo tipo de negócio, até então pouco explorado na região: o turismo rural. Novamente, quem comenta é Júnior Barbosa: “De acordo com o passaporte, o visitante conhece o processo de ordenha, passeia pela propriedade e acompanha o modo de a gente fazer os queijos”.

O preço das visitas oscila de R$ 25 a R$ 80 e já há fazendeiro pensando em erguer bangalôs. “Estamos nos preparando para construir alguns naquelas rochas. Veja a vista que os turistas terão, além, claro, de saborearem nosso queijo”, comemora Barbosa. Os valores levam em conta alguns pacotes, como caminhada ecológica, passeio a cavalo e almoço. Os clientes são recebidos com café e, claro, queijo. 

Mas nem tudo são flores por aquelas bandas. A morosidade do poder público em reformar estradas da região põe freio à chegada de turistas. Visitantes que poderiam sair das fazendas do Serro e passear por outras regiões do Jequitinhonha desanimam ao constatar que, ainda hoje, importantes rodovias não foram totalmente asfaltadas e pontes de madeira continuam palcos de acidentes.

Parece até os antigos caminhos tortuosos percorridos por mulas e burros, na época do garimpo, quando o queijo era maturado durante longas viagens. Este é o contraponto da próxima reportagem.