O Centro de Educação para o Trabalho Virgílio Resi – Ceduc – está localizado no Bairro Heliopólis, na capital mineira, e nasceu em 2005 com o propósito de enfrentar o problema da desocupação juvenil – em especial de adolescentes e jovens em situação de vulnerabilidade pessoal e social – por meio da educação para o trabalho a partir do Programa Jovem Aprendiz. Desenvolve também iniciativas em prol da erradicação do trabalho infantil, ressocialização de pessoas em reclusão e capacitação de mulheres empreendedoras. Quem está à frente desse trabalho é Elenice de Oliveira Matos, assistente social com pós-graduação em Gestão de Organizações do Terceiro Setor e có-fundadora do Ceduc. Todos os projetos oferecidos pela organização são gratuitos com apoio de empresas parceiras, diversas instituições privadas brasileiras e organismos internacionais, que colocam aporte financeiro para o desenvolvimento de suas ações educacionais. Porém, com a pandemia, o isolamento social e a suspensão de diversas atividades e setores da economia, o Ceduc teve seu orçamento reduzido em 50%, comprometendo a continuidade de parte significativa do seu trabalho educativo. Para amenizar a dificuldade e continuar oferecendo seus serviços à população carente, a instituição lançou a campanha DOAR em que as contribuições podem ser feitas no Banco do Brasil, Agência 3495-9; conta-corrente: 19499-9, CNPJ: 07.578.361/0001-69.Após a pandemia, quando as atividades forem retomadas, aceitará também doações de material de limpeza e gêneros alimentícios para custear o lanche dos jovens.
Qual a filosofia do Ceduc Virgílio Resi?
Entendemos que o trabalho é primordial para sustentar adolescentes e jovens em sua passagem para o mundo adulto, pois é no trabalho que a pessoa descobre e desenvolve seus talentos e aptidões, tem a possibilidade de construir algo positivo para a sua vida e ainda colaborar no desenvolvimento da sociedade. Ou seja, é o lugar por excelência onde a pessoa se vê em ação e pode expressar a sua verdadeira natureza humana. Desejosos de contribuir com essa situação de desemprego juvenil, o Ceduc Virgilio Resi se propõe a preparar a juventude para ingressar no mundo do trabalho, a partir de uma formação humana e profissional que os habilite a estar nesse lugar de forma digna, competente e responsável.
Qual é a população atendida?
Nosso público prioritário são adolescentes e jovens com idade entre 14 e 19 anos, em sua grande maioria provenientes das periferias de Belo Horizonte e Região Metropolitana, e vivem em um contexto comunitário de escassez de oportunidades de trabalho digno, educação, lazer e cultura. Também atendemos adolescentes em situação de acolhimento institucional, isto é, adolescentes que tiveram seus direitos violados e sofreram abusos e negligência familiar e foram retirados do convívio de sua família. Ao completarem 18 anos, precisam sair do abrigamento e o trabalho se torna a alternativa digna para a sua autonomia. Por isso é de suma importância a preparação deles para a entrada nesse mercado. Outro público são os microempreendedores, em especial mulheres empreendedoras que trabalham de forma individual ou coletiva, e necessitam de assessorias gerenciais e capacitações em desenvolvimento humano e de negócio, para levar adiante suas atividades produtivas. Por fim, atendemos ainda o público adulto em privação de liberdade preparando-os para a sua ressocialização na sociedade.
São quantas pessoas envolvidas no projeto?
A organização conta com uma equipe técnica multidisciplinar, num total de 23 colaboradores, composta por assistentes sociais, psicólogos, pedagogos, terapeuta ocupacional, educadores, especialistas em tecnologia da informação, assistentes administrativos e auxiliar de serviços gerais.
A educação para o trabalho é plataforma
social importante para o desenvolvimento humano. Como nasceu a ideia de se trabalhar nessa área?
Exatamente para ajudar as pessoas mais vulneráveis a quebrar o ciclo da pobreza e sair dessa condição de menos valia que muitas vezes lhes são impostas devido a falta de oportunidades para vislumbrar um futuro promissor para si e para a sua família.
Como o programa de aprendizado é realizado?
O Programa Jovem Aprendiz é uma política pública de incremento do primeiro emprego, sob a ótica do trabalho protegido, onde as empresas de médio e grande porte têm a obrigatoriedade de ofertar vagas de aprendizagem para auxiliar na formação técnica e profissional de adolescentes e jovens. Pode se tornar também uma oportunidade para as empresas investir na formação de seu futuro colaborador. A metodologia de ensino do Ceduc Virgilio Resi é estruturada em módulos de formação humana onde se trabalha a educação de valores e as competências atitudinais para o trabalho; em módulos de formação técnica em que são trabalhados conteúdos específicos para o exercício de determinada profissão; em módulos de educação para a vida com atividades socioculturais, participação política e mobilização social, ações de responsabilidade social e solidariedade humana. Os conteúdos da formação técnica são formatados em diversos setores de aprendizagem onde o aprendiz aprende fazendo, dentro de um ambiente empresarial simulado, de modo que ele tenha uma visão sistêmica do funcionamento de toda a empresa e passe por todos os setores até concluir seu ciclo de aprendizagem.
Quantas modalidades são oferecidas de acordo com as demandas do mercado?
A área administrativa engloba os setores de recepção/secretaria; departamento pessoal I e II; contabilidade; logística I; saúde e segurança do Trabalho. Na área do comércio, oferecemos lojística I e II; compras e vendas; marketing; atendimento ao cliente.
Como se alinham a teoria e a prática?
Uma das especificidades do Programa de Aprendizagem é proporcionar ao aprendiz uma vivência prática de trabalho na empresa contratante ou na própria entidade formadora. Na proposta formativa de nossa organização, durante o primeiro mês de seu contrato de aprendizagem, o jovem permanece em processo de formação na entidade e, após esse período, ele começa a vivenciar a prática do trabalhando alternando quatro dias semanais na empresa e um dia de formação técnica na entidade. Durante o todo o percurso profissional eles são acompanhados por um supervisor técnico na empresa e por um orientador profissional da entidade para auxiliar na adaptação ao ambiente de trabalho e acompanhar o desempenho humano e profissional dos aprendizes.
Além dos projetos para jovens e adolescentes, o Ceduc desenvolve iniciativas em prol da erradicação do trabalho infantil. Quais são elas?
A organização iniciou sua atuação no combate à exploração do trabalho infantil em 2008, no Norte de Minas, após uma série de reportagens publicadas pelo jornal ESTADO DE MINAS, intitulada o “Flagelo dos Lixões”, onde denunciava a grave situação de famílias, crianças e adolescentes trabalhando e vivendo nos lixões a céu aberto. Trabalhamos especificamente em 18 municípios que tinham recebido do Ministério Público do Trabalho o Termo de Ajuste de Conduta para sanar este problema.
Quanto tempo durou esse projeto?
Atuamos durante nove anos na região com recursos do Fundo da Infância e Adolescência e com recursos da União Europeia, e em parceria com a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social e Esporte (SEDESE) e o Fórum Estadual de Combate ao Trabalho Infantil e Proteção do Adolescente (FECTIPA-MG). Foi realizado Diagnóstico Sociofamiliar de todas as famílias que trabalhavam nos lixões; promovido encaminhamento de todas as crianças para a escola e para as atividades socioeducativas da Rede Socioassistencial dos municípios; capacitados os técnicos das redes municipais em método de acompanhamento familiar; elaborados Planos Municipais de Combate ao Trabalho Infantil e Planos Municipais de Geração de Trabalho e Renda; ministrados cursos de empreendedorismo para as famílias; elaborados Planos de Negócio; ofertados assessorias gerenciais, capacitações técnicas e oficinas de desenvolvimento de equipe; criação da marca “Mãos do Norte de Minas” e promoção da campanha de financiamento coletivo “Artes e Faces do Norte de Minas”.
Como foi o resultado?
Finalizamos nossa atuação no Norte de Minas em 2017 e com esse trabalho foi possível alcançar a erradicação do trabalho infantil nesses municípios; assessorar 320 mulheres artesãs e incubar 28 empreendimentos econômicos com foco na economia solidária que, em sua grande maioria, ainda continuam em funcionando. Em 2017 nossa metodologia de incubação denominada ISONOMA foi certificada pela Fundação Banco do Brasil como tecnologia social inovadora. Em Belo Horizonte atuamos com o Programa de Aprendizagem que, através da oferta do trabalho protegido, é uma grande ferramenta no combate ao trabalho infantil.
Como são identificados esses casos? Existe uma estatística no município
quanto ao problema?
Em Belo Horizonte, os casos são identificados pelas equipes de abordagem de rua de instituições sociais em parceria com a Prefeitura Municipal. Existe uma pesquisa encomendada pelo Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente que retrata a situação na capital mineira. O ponto crítico das estatísticas é que são contabilizados apenas os casos notificados, o que deixa uma parcela significativa da população infantojuvenil fora essa identificação.
Quais as medidas tomadas pelo Ceduc face ao problema, já que o trabalho infantil é
proibido por lei?
Nossa organização não contrata nenhuma pessoa menor de idade, que não seja na condição de jovem aprendiz.
A ressocialização de pessoas em reclusão é outra iniciativa da instituição. Como ela acontece na realidade?
Atuamos em parceria com instituições de referência no atendimento a esta tipologia de público. Oferecemos formação humana; orientação profissional e empreendedora; construção de Planos de Desenvolvimento de Vida. Já atuamos na Penitenciária Feminina Estevão Pinto (PIEPE) e em diversas APAC’s (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados) instaladas no Estado de Minas Gerais.
Quais são as dificuldades encontradas?
Na Unidade Prisional de modelo tradicional, como a PIEPE, o clima é mais tenso e as condições de trabalho estão sempre em processo de mudança devido a uma série de fatores inerentes às situações prisionais. Resgatar a autoestima, o sentimento de compaixão e autocompaixão, e aceitar o tratamento para abandonar o uso de substâncias psicoativas são os maiores desafios. Nas APAC’s as condições de trabalho são bastante favoráveis, o clima é mais leve e os detentos já estão mais fortalecidos em sua humanidade e mais preparados para iniciar se processo de ressocialização.
Como mulheres empreendedoras podem se capacitar no Ceduc?
Através de capacitações específicas e assessorias de negócio. Realizamos diagnósticos do perfil empreendedor e do empreendimento; elaboramos planos de negócios e auxiliamos em sua execução; ministramos oficinas de desenvolvimento humano, liderança e trabalho em equipe; formação em economia solidária; trabalho em rede e em coletividade; cursos de desenvolvimento de produtos. Para a execução dessas ações buscamos financiamentos públicos e privados. Atualmente temos um projeto pronto para a captação de recursos.
Como são identificados e conduzidos ospotenciais de cada uma?
A partir de um diagnóstico em que se verifica o perfil empreendedor e as condições mínimas para se iniciar um processo produtivo. Com base nesse levantamento inicia-se o processo formativo e a incubação da atividade produtiva.
Como você se envolveu com a ONG? Conte um pouco da sua história.
Sou uma das fundadoras da ONG. Sempre atuei em trabalhos sociais como voluntária e caritativa durante todo o período de minha formação acadêmica. Após a conclusão do curso de Serviço Social, comecei a trabalhar em uma instituição social na coordenação de projetos como foco na formação profissional de jovens e geração de renda para as famílias pobres. Atuei durante 14 anos nessa área onde levamos formação profissional, formação empreendedora e até microcrédito para jovens e famílias residentes em áreas urbanas de baixa de renda de Belo Horizonte, Contagem e Betim.
Essas experiências resultaram na abertura do Cedu?
Após conviver com toda essa situação de pobreza e verificar as diversas mudanças operadas nas vidas dessas pessoas, também verificamos a fragilidade humana de nossos jovens e adolescentes e suas dificuldades de inserir-se no mercado de trabalho e, sobretudo, permanecer no trabalho. Decidimos, com um grupo de profissionais que atuam nessa organização, oferecer um percurso formativo mais consistente para esses jovens de modo que eles pudessem entender o valor do trabalho e sua importância para o seu desenvolvimento humano. Daí nasceu o Centro de Educação para o Trabalho Virgilio Resi como possibilidade de vida; um lugar de encontro que muda o sonho em esperança e preenche a vida de certeza em um futuro melhor.
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