Jornal Estado de Minas

Alta-costura

Luxo com raízes italianas

A silhueta em forma de ampulheta do tailleur "Bar" - Foto: cristian dior/divulgação

Em 2020, ano marcado pela pandemia com o surgimento da COVID-19, a solução para todos os lançamentos de moda foi recorrer a desfiles virtuais. Das grandes grifes internacionais de alta-costura às regionais de pronta entrega, cada uma criou o show on-line a seu estilo, e, sem sombra de dúvida, o da Dior foi, de longe, o mais bonito.
 
 
 
Um espaço preto com uma percussão tocando e alguns dançarinos na penumbra deu início ao espetáculo, gerando no público a curiosidade do que estaria por vir. Aos poucos, algumas frases se acendem nas paredes pretas e uma mulher canta a capela. De repente, luzes se acendem em um lado, criando um belo corredor por onde as modelos começaram a entrar e, em seguida, surge um cenário deslumbrante, todo em luzes, a paisagem de uma cidade. Ao centro, o coreto, onde estão os músicos.
 
- Foto: cristian dior/divulgação 

O longo desfile segue com os bailarinos fazendo suas performances entre as modelos, enchendo os olhos dos espectadores de todo mundo. Isso mesmo, o que antes era para um seleto grupo de convidados, em 2020, por causa da imposição feita pelo isolamento social, se tornou democrático, e ficou disponível para todos os amantes de moda, de beleza e para os curiosos de plantão. Até o dia em que redigi esta matéria, mais de 3 milhões de pessoas já tinham acessado as várias postagens do desfile no Youtube.
Quem ainda não teve oportunidade de conferir, basta entrar lá e procurar “desfile Dior cruise 2021”.
 
- Foto: cristian dior/divulgação 
 
A diretoria criativa da Maison Dior, Maria Grazia Chiuri, escolheu a cidade de Lecce, na Itália, sua querida região natal, para fazer o lindo espetáculo. E aproveitou o momento para celebrar a beleza mágica das artes e dos trabalhos ma- nuais.
O desfile foi pensado e planejado a sete chaves, e as empresas e parceiros que trabalharam foram escolhidos a dedo. A iluminação foi assinada pela Luminarie, de Marinella Senatore, a dança catártica e a música ficaram a cargo da Fundação La Notte della Taranta, com coreografia de Sharon Eyal e música erudita de Paolo Buonvino, que encantou todos.
 
- Foto: cristian dior/divulgação 
 
 
Coleção faz homenagem a trabalho artesanal
 
A diretora criativa da marca, Maria Grazia Chiuri, procurou dar nova dimensão ao trabalho coletivo neste período em parti- cular. Apesar das desvantagens da distância, o fato de trazer outra perspectiva para o cotidiano deu força e imaginação à equipe Dior. Foi ela quem escolheu para esse desfile, Cruzeiro, reconectar sua paixão criativa à região da Itália, sua terra natal. Os textos do antropólogo Ernesto De Martino, dedicados às tradições italianas, que influenciaram autores como Germano Celant ou Georges Didi-Huberman, a levaram a explorar suas origens. Puglia – como também é chamada –, e suas diferentes energias, onde crenças mágicas como o Tarantismo são perpetuadas, tornaram-se, nesse contexto particular, uma forma de utopia concreta, uma nova leitura do mundo.
 
Em uma homenagem que a maison disse ter sido sutil ao savoir-faire local, mas pelo que vimos foi bem marcante, as silhuetas Dior carregam, nesta coleção, o lema dos ateliês da Fundação Costantine – “Amando e cantando”, um diálogo virtuoso em nome da excelência. Fazendo referência ao icônico vestido Miss Dior, de Christian Dior, de 1949, o artista Pietro Ruffo imaginou um campo com uma constelação de feixes de trigo evocando uma paisagem de verão.
Uma narrativa de natureza selvagem é transposta a camisas e shorts. Verdadeiras preciosidades refinadas, os vestidos, pontuados com flores e borboletas, adornam o tombolo, um precioso bordado tradicional perpetuado por Marilena Sparasci. Emblemas da rica herança da região da Apúlia, fonte de inspiração infinita.
 
- Foto: cristian dior/divulgação 
 
A coleção é um trabalho que celebra a memória e os valores, a cultura e o futuro do trabalho artesanal excepcional. Uma expressão experimental do savoir-faire ancestral, os tecidos da Fundação Le Costantine adornam uma série de casacos, incluindo o emblemático Bar. O lema desse lugar único, “Amando e cantando”, é tecido na parte de trás das saias. Essa coleção é um exemplo da inteligência coletiva que a diretora criativa busca, combinada com o extraordinário poder de ritmos e rituais, música e dança, como forma de transcender a si mesmo. Como a Maison Dior apoia a cultura pluralista e preciosa do tecelão artesão, decidiu prestar uma homenagem aos artífices, à natureza e às paisagens únicas a Itália.

FUNDAÇÃO LE COSTANTINE Fundada em 1982 pelas irmãs Giulia e Lucia Starace, juntamente com a prima Lucia De Viti de Marco, dando continuidade à mentalidade e às convicções de suas mães, a Fundação Le Costantine promove a região da Apúlia, preservando seu patrimônio vivo por meio do ensino do artesanato tradicional e da cultura responsável. Com o nome “Amando e cantando”, o ateliê Le Costantine presta uma homenagem às canções tradicionais cantadas ainda hoje pelas tecelãs, que perpetuam essas artes têxteis há gerações, impulsionadas por uma ode à alegria de viver e à paixão criativa.
O local abriga os teares preciosos nos quais os tecidos ganham vida usando técnicas ancestrais, presentes no desfile da coleção Cruzeiro 2021, em designs bicolores, em várias peças.
 
- Foto: cristian dior/divulgação 

AGOSTINO BRANCA Artesão e mestre ceramista, estabelecido no coração da região da Apúlia, na Itália, é especialista em técnicas tradicionais da península de Salento. Fundou seu próprio ateliê em Lecce, chamado de Dipinto a Mano (literalmente, pintado a mão). Tal como obras de arte, seus objetos são exibidos em toda a Itália e viajaram até Nova York e Pequim. Para a coleção Croisière 2021 de Maria Grazia Chiuri, o artista projetou uma série de pratos inéditos que reinterpretam as cartas do tarô e seus temas, como o Sol e a Temperança, e também os combinou com flores silvestres, trigo e ervas emblemáticas do Sul da Itália e de Salento.

MARILENA SPARASCI O tombolo, um estilo de renda extremamente delicado, foi criado na Itália no século 15 e se espalhou por toda a Europa durante o século 16. Especialmente predominante no Sul da Itália, esse bordado, que corre o risco de desaparecer, é feito a mão usando gestos rigorosamente meticulosos, preciosamente transmitidos de geração em geração. O motivo é desenhado primeiramente em um pedaço de papelão ou papel antes de ser fixado em uma pequena almofada tipicamente cilíndrica e, então, reproduzido como um bordado.
Específicos desse processo, os carretéis de madeira, chamados de “fuselli” em italiano, cujas quantidades refletem a complexidade da criação, são usados para amarrar, torcer ou enlaçar os fios. A renda ganha então vida, assim como as flores e borboletas criadas para a Coleção Dior 2021, que exigiram até 15 horas de trabalho. Verdadeiros tesouros de elegância, esses adornos, criados em colaboração com Marilena Sparasci, uma das últimas bordadeiras a praticar e ensinar essa técnica, florescem graciosamente nos vestidos.

PIETRO RUFFO Pietro Ruffo faz desenho, aquarela e escultura, além de obras complexas e minuciosamente detalhadas, fruto de um meticuloso processo criativo. Por meio de sua arte, Pietro Ruffo explora um vasto conjunto de questões sociais, éticas e políticas, incluindo natureza e liberdade, que estão no centro de seu processo conceitual. Para a criação de cinco motivos florais que integram a coleção, ele produziu mais de 250 ilustrações ao longo de três meses, inspirando-se no livro De florum cultura, publicado por Giovanni Battista Ferrari, em 1638. 
 
 
O grande mestre
 
O estilista francês Christian Dior nasceu em 1905, em Granvelle, na França, filho de um comerciante, e teve uma vida tranquila.
Faleceu durante suas férias na estação termal de Montecatini Val di Cecina, na Itália, em 1957. Ele fundou uma das mais famosas empresas de moda do mundo, a Christian Dior S.A.
 
Interessado por atividades artísticas, começou a frequentar ateliês de pintura e desenho. Por imposição do pai, estudou relações internacionais, em Paris, com o objetivo de seguir a carreira diplomática, porém, em 1927, abriu uma galeria de artes em sociedade com Jacques Bonjean.
Em 1935, Dior começou a desenhar croquis para a seção de alta-costura do jornal parisiense Figaro Illustre. Depois de vender uma coleção de desenhos de chapéus, começou a fazer croquis de roupas e de acessórios para várias maisons de Paris. Em 1938, começou a trabalhar como assistente do estilista suíço Robert Piquet.
 
Em 1939, Dior foi convocado para servir na Segunda Guerra. Dois anos depois, fez parte da equipe da maison de Licien Lelong, e entre 1941 e 1946 criou coleções com a colaboração de Pierre Balmain.
Ainda em 1946, com a ajuda do empresário da indústria têxtil Marcel Boussac, criou sua própria maison, na Avenida Montaigne, 30, em Paris, e em 12 de fevereiro de 1947 apresentou sua primeira coleção, que causou uma revolução na moda pelo luxo e elegância de suas peças.
Quando os modelos de Christian Dior foram apresentados, Carmel Snow, a redatora da revista americana Harper’s Bazaar, exclamou: “This is a new look!”. A coleção, que tinha o nome Ligne Corolle, passou a ser conhecida como New Look.
 
Nasceu ali o novo conceito de moda, carregado de luxo, mudando toda a praticidade e simplicidade das roupas femininas, após anos de restrições causadas pela guerra.
Christian Dior lançou modelos femininos luxuosos, sofisticados, com saias amplas e cinturas bem marcadas. Apesar das críticas, pela grande quantidade de tecidos usados em cada modelo, rapidamente suas roupas foram copiadas em todo o mundo.
 
O modelo que se tornou o símbolo do New Look foi o tailleur Bar, um casaquinho de seda bege bem-acinturado, com ombros naturais e ampla saia preta plissada quase na altura do tornozelo. Acompanhava o look luvas, sapato de salto alto e chapéu, tudo impecável. A Dior passou a fazer roupas e artigos masculinos a partir de 1970.
 
A marca Christian Dior abriu sucursais de luxo em diversos países.
Dior assinou vários produtos, como gravatas, meias, perfumes, echarpes, lenços, luvas, bijuterias, lingeries etc. Em 1957, possuía um verdadeiro império de luxo, com 28 ateliês e 1,2 mil empregados.
 
Este ano, a Dior completa 75 anos com centenas de vestidos confeccionados, além de vários outros produtos como perfumes, chapéus, sapatos, bolsas, maquiagens, gravatas etc. Dior teve fãs famosos espalhados pelo mundo, entre eles as atrizes Brigitte Bardot, Marlene Dietrich, Jennifer Lawrence, Natalie Portman, as cantoras Edith Piaf e Rihanna, as princesas Grace, de Mônaco, e Diana, etc.
 
- Foto: cristian dior/divulgação 

BOLSAS A grife produziu duas bolsas que são desejo de consumo das mulheres elegantes. A primeira é a Lady Dior. O acessório foi criado e batizado, em 1994, como “Chouchou”, porém, dois anos depois do lançamento, a princesa Diana ganhou uma bolsa Dior e o encanto dela pela peça foi tão grande que acabou comprando toda a coleção. A marca decidiu mudar o nome da bolsa em homenagem à saudosa integrante da família real. Passou a chamar Lady Dior. O acessório é feito em diferentes tamanhos, em couro leve e sofisticado. Os berloques com as iniciais, assim como a bolsa, são feitos a mão. A segunda bolsa queridinha é a Dioríssima, também em estilo clássico, porém mais esporte, para o dia a dia. Feita em couro, com alça de mão dupla e alça longa. 
.