De um lado, profissionais em busca de itens para incluir em projetos. Do outro, marcas interessadas em divulgar seus produtos. Idealizado por três jovens mineiros, o Casoca uniu as duas pontas do mercado de arquitetura e decoração com uma proposta inovadora. A plataforma disponibiliza, gratuitamente, informações sobre produtos brasileiros, incluindo arquivo 3D, fotos e especificações técnicas.
Quatro anos depois de ser lançado, o Casoca é o terceiro site mais relevante do Brasil na categoria mobiliário, segundo dados da empresa que analisa tráfego on-line Similarweb, com mais de sete mil acessos por dia. Hoje a plataforma reúne 135 mil profissionais de todo o país, 10 mil produtos e 170 marcas, mas amanhã os números já não serão mais os mesmos, pois crescem exponencialmente.
“Somos o intermediador entre arquitetos e marcas, e isso facilitou a vida de todo mundo”, aponta a arquiteta Mariana Macedo, de 27 anos, que nesta entrevista conta como surgiu a ideia e revela planos de chegar a outros países.
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“Somos o intermediador entre arquitetos e marcas, e isso facilitou a vida de todo mundo”, aponta a arquiteta Mariana Macedo, de 27 anos, que nesta entrevista conta como surgiu a ideia e revela planos de chegar a outros países.
Para começa, fale sobre a sua relação com a arquitetura.
Sempre quis fazer arquitetura, desde pequena. Nem considerei outra profissão. Sempre gostei de tudo relacionado a casa, achava o máximo folhear revista de decoração. A minha única referência era a mãe da minha melhor amiga. Passei no vestibular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) de cara e fui fazer o curso muito feliz e animada. Amei os primeiros períodos, mas ao longo do tempo fui me decepcionando, porque a minha expectativa era muito alta. Então, me inscrevi no programa Ciência sem Fronteiras e fui fazer intercâmbio na Parsons, em Nova York. Era a realização de um sonho e pensei: estou indo para a melhor faculdade de design dos Estados Unidos, não vou só pegar matéria de arquitetura. Lá podia escolher qualquer matéria e fui fazer marcenaria, serralheria, desenho de mobiliário, empreendedorismo, e isso foi abrindo a minha cabeça, em vários sentidos. Os professores, em geral, achavam os brasileiros incríveis, porque a gente se esforçava muito, e esse ambiente me fez ir mais longe. Ganhei um concurso de azulejo, com um desenho inspirado nas casas antigas de Minas. Já tinha feito azulejaria e cerâmica na Escola Guignard, logo antes de ir para NY. Sempre gostei de artes manuais, pintura, bordado, tricô, e a faculdade incentivava muito a parte criativa. Depois desenhei e fiz com as minhas próprias mãos uma cadeira toda de madeira. O desenho dela foi pensado para desmontar e caber na mala para trazer para o Brasil. Assim, fui entendendo o que era design e o meu potencial.
Em que momento você descobriu seu lado empreendedor?
Tive um choque de realidade na volta para a faculdade. Estava tendo greve na época e fiquei muito decepcionada e deprimida. Pensei até em desistir do curso, tinha me apaixonado pelo design, mas nisso abri a Candê, minha primeira empresa, com uma amiga de faculdade, que também tinha voltado de intercâmbio. A gente compartilhava a paixão pelas artes manuais. Resolvemos fazer vasinhos de concreto com suculentas. Desenhávamos e produzíamos tudo, era de fato um trabalho mão na massa. Aquilo foi a minha salvação. Nisso comecei a gostar de empreender, de criar, de vender, de entender as necessidades das pessoas. Fiz estágio em escritório de arquitetura, mas via que não era aquilo o que queria fazer. Quando chegou o trabalho de conclusão de curso (TCC), quis estudar a minha empresa. Ao mesmo tempo, estava procurando alguém para produzir a minha cadeira e comecei a ver as dificuldades de quem tem um produto para fabricar e vender. Fui descobrindo várias dores do mercado. Aí entrei em um programa de TCC de empreendedores na Universidade de São Paulo (USP). Achei legal que lá eles falam: TCC deveria ser começo de carreira, e não fim de curso. Aprendi muito sobre empreendedorismo científico, testar hipóteses e validar dores do mercado.
Como surgiu a ideia do Casoca?
Para fazer o meu TCC, entrevistei mais de 100 pessoas, entre designers e arquitetos, e percebi que as dores que eles sentiam eram as mesmas de quando eu era estagiária de escritório e não sabia onde achar as informações dos produtos que queria usar no meu projeto, as fotos, os preços, os arquivos 3D. Aí fui chegando à ideia de uma plataforma que reunisse todas essas informações, que fosse boa tanto para o designer que tem um produto quanto para o arquiteto que está buscando um produto no mercado brasileiro. Até então, você tinha que sair para procurar os produtos e, quando voltava para o escritório, tinha dificuldade de reproduzi-los em um projeto 3D. Na época, entrevistei o Marcelo, que era aluno da faculdade e hoje é um dos meus sócios. Contei sobre o programa, ele achou muito legal e resolveu fazer o TCC junto comigo. Decidimos que seria um site com informações dos produtos, inclusive arquivo 3D, que chamamos de bloco 3D. Nisso conhecemos o Matheus, economista, que tinha a plataforma Casoca, mas era um site para compra e venda de móveis e decoração. Falamos que ele precisava estar dentro da plataforma com os arquivos 3D dos produtos e ele nos contou que era isso o que precisava, porque o arquiteto entrava no site para pegar as informações dos produtos, mas a venda era presencial, ninguém comprava nada on-line. Acabamos juntando as duas ideias. O nome Casoca veio dele e a proposta da plataforma veio do nosso TCC.
Como você explica o que é o Casoca?
O Casoca é uma plataforma de informações de produtos do mercado brasileiro. Reunimos num só lugar fotos, medidas, especificações técnicas, descrição, tudo o que o arquiteto precisa para encontrar o produto ideal para o seu projeto. É um catálogo bem completo. Mobiliário é bem forte, mas também temos produtos de iluminação, revestimento, peças de banheiro, decoração, tapete etc.
Por que a plataforma cresceu tão rapidamente?
Foi muito pela questão da praticidade. Identificamos a dificuldade do arquiteto de encontrar as informações dos produtos que ia usar nos projetos e criamos uma solução simples. Nós fazemos a busca pelas informações para facilitar a vida dele. Antes eles tinham que ir ao site de cada empresa para buscar as informações. Agora encontram tudo o que precisam em um só lugar. Os arquitetos começaram a se inscrever muito rapidamente e no boca a boca fomos ficando conhecidos. Descobrir o Casoca era a maior felicidade da vida deles. O crescimento foi orgânico e espontâneo. Quando veio a pandemia, e ninguém podia sair de casa, o número de acessos cresceu muito. Lá no começo, muita gente falava: vocês têm que cobrar. Mas nunca acreditamos nisso e o acesso sempre foi gratuito. Queremos que as pessoas usem o máximo possível, e quem paga são as marcas. Aqui é um espaço de troca de informações, e acho que isso aproximou ainda mais o público. Temos focado muito em conteúdo, como vídeos informativos que tiram dúvidas, ensinam a usar produtos, mostramos visitas às fábricas. Organizamos concursos, mostras virtuais de decoração e temos um podcast em que entrevistamos arquitetos. O Casoca está virando um hub de conteúdo e informação do mercado de casa e decoração.
Como se divide o público do Casoca?
A maioria dos acessos são de profissionais: 51% são arquitetos e 13% são designers e decoradores. Fora isso, 26% são estudantes (inclusive, ficamos sabendo que professores nas faculdades ensinam os alunos a acessar o Casoca para que aprendam a usar o produto real nos projetos) e 10% são consumidores e lojistas.
Qual é a vantagem para as marcas de estar na plataforma?
Tem muito a ver com relacionamento e comunicação. Estar no Casoca é uma forma de mostrar o seu produto na hora em que o arquiteto está procurando. Ou seja, a marca está no momento e no lugar certo. Não precisa ficar convidando para ir à loja conhecer os lançamentos. Arquiteto novo não tem tempo de ir à loja fazer orçamento, quer praticidade. No começo, produzíamos os blocos 3D dos produtos, porque vimos que as marcas não tinham, mas esse não é mais o nosso foco.
Vocês tiveram alguma dificuldade de captar as marcas no início?
Tivemos o trabalho de mostrar para as marcas que o arquiteto precisava de uma ferramenta para facilitar a vida dele dentro do escritório. Não era eficiente chamá-lo para tomar um café na loja. Como sou arquiteta, contava nas reuniões da dificuldade de encontrar as informações de um produto e acabava optando por usar outra marca. Além disso, fomos mostrando que o escritório do arquiteto famoso não tem só ele. Esse arquiteto fica sabendo dos lançamentos, mas lá dentro trabalham mais 10 arquitetos que efetivamente fazem os projetos no dia a dia e não estavam tendo contato com a marca. Eu era essa pessoa quando fiz estágio em escritório. Falávamos que o mercado estava mudando e que o digital era muito importante. Com o tempo, fomos criando uma relação de confiança.
Ainda existe alguma barreira em relação à divulgação de informações, como preço?
Sim, até hoje colocamos a faixa de preço dos produtos e, mesmo assim, a maioria das marcas não deixam divulgar essa informação. Explicamos que isso é importante para o arquiteto, mas ainda existe uma resistência muito forte. Acho que a internet quebrou muitos paradigmas desse mercado e a pandemia nos ajudou a virar a chave das marcas de querer segurar informações. Aqui não trabalhamos com exclusividade. Acreditamos que, quanto mais informações compartilharmos, melhor. Queremos que o produto seja escolhido porque é realmente bom, não porque a pessoa desconhece o outro. Estamos quebrando isso também. Há até pouco tempo, os lojistas mudavam o nome do produto para o cliente não saber que era o mesmo da outra loja. Não tínhamos abertura com eles. Mas agora, depois de quatro anos, estamos num momento de incluir as lojas. Vimos a possibilidade de trazer algo mais regional para a plataforma com as lojas, mostrando onde encontrar os produtos em cada cidade. Assim, o arquiteto não precisa entrar em contato com a marca para perguntar onde comprar. Existem muitas lojas multimarcas e elas vão poder montar um catálogo virtual delas.
Qual é a o ganho para os arquitetos de ter acesso fácil às informações dos produtos?
Acontecia muito de o arquiteto entregar o projeto e o cliente falar: legal, quero comprar esses produtos. Mas aí ele tinha que explicar que aqueles produtos não existiam, que o projeto não ficaria exatamente igual e que teriam que sair para escolher juntos algo parecido. O cliente ficava totalmente decepcionado. Imagina, o arquiteto cismava com um sofá curvo que não existia ou escolhia um sofá que custava R$ 30 mil e o cliente só queria gastar R$ 3 mil. Era uma frustração tanto para o cliente quanto para o arquiteto, que tinha que refazer o projeto dele. O Casoca deixa o projeto mais real. Antes a gente escolhia entre três cadeiras, agora temos mais de 300 opções na plataforma e não corremos o risco de repetir o mesmo produto em vários projetos. Fora que atualizamos constantemente a lista de produtos. Toda semana, entram 200 produtos novos. Temos um time de oito pessoas que cadastram novos produtos, e ainda é pouco. No total, são mais de 10 mil itens. Somos o intermediador entre arquitetos e marcas, e isso facilitou a vida de todo mundo.
Você imaginava que usaria seu conhecimento de arquitetura para fazer algo tão inovador?
Consegui juntar três áreas que amo – arquitetura, design e empreendedorismo –, resolvendo uma dor real de arquitetos e designers. Falo muito que arquiteto desenha solução para espaços, e eu desenhei uma solução para o arquiteto. Sempre gostei de pensar em soluções que impactam a vida das pessoas e estou bem feliz com esse meu caminho. Isso tem tudo a ver comigo. Não impactei um cliente só, consegui impactar uma comunidade de arquitetos, que estão fazendo projetos com muito mais rapidez.
Como você enxerga seu percurso como empreendedora?
Empreender me fez crescer muito como pessoa. Dolorosamente, mas com muita rapidez. Aprendi errando feio, mas aprendi. Amo colocar a mão na massa. Agora estou aprendendo a delegar e me colocar em uma posição de estratégia e gerenciamento. O trabalho é intenso demais, mas o Casoca é o negócio da minha vida.
Quais são os próximos desafios?
No ano passado, focamos no crescimento e na estruturação da equipe. Passamos de 10 para 22 pessoas, que estão espalhadas pelo Brasil todo. Agora queremos expandir para a América Latina. Na verdade, o nosso objetivo é ser global. Está nos planos crescer em alcance, número de marcas e equipe.
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