A pandemia configurou o setor da moda em Belo Horizonte e, ao que tudo indica, a vocação da cidade, no momento, são os negócios na pronta-entrega. Se isso já estava bastante delineado, pouco antes da crise sanitária, acentuou-se de forma definitiva com a realização da 19ª edição do BH à Porter, um movimento criado pela Coopermoda, associação cooperativista que reúne um grupo de profissionais do setor em ação na capital mineira.
O objetivo, desde o começo, foi destacar a produção feita para a entrega imediata, modelo predominante nos showrooms que se localizam no Prado e regiões próximas. Enquanto o Minas Trend também se reconfigura para atender as demandas de um mercado que encolheu e tem evitado a comercialização via pedidos, as principais instituições que governam os rumos dessa engrenagem vêm buscando uma solução que engrosse o maior salão de negócios do Brasil, realizado, agora, no Minascentro. Na última edição, a maioria das marcas participantes era especializadas em moda festa. Conforme as conversas avançam, tudo indica que a pronta-entrega também terá lugar no Minastrend.
O que se percebe é que, ao longo do tempo, o BH à Porter ganhou terreno e as duas edições, acontecidas depois da pandemia, são uma radiografia certeira de como o evento cresceu e se profissionalizou. Mais do que isso, se antes os responsáveis tinham de convencer as empresas sobre a sua importância, atualmente há um consenso: ele é vital para a saúde econômica das marcas que, por sua vez, preparam coleções especiais para receber os compradores.
Ivete Dantas, atual presidente da Coopermoda, que sucedeu à Nalva Santos, deu continuidade ao projeto e o expandiu. Hoje, ela divide o comando da associação com as colegas Eliane Silveira, responsável pela área administrativa, e Jeanne Aguiar, que cuida do financeiro.
Se você chegar à sede da instituição, na Rua Cura Dars`, no Prado, vai encontrar uma casa agradável e bem ambientada, com salas específicas para cada núcleo, inclusive um local para expediente das mercadorias que as consultoras despacham para os lojistas de fora de BH. Além de ser um ponto de parada entre um atendimento e outro. “É uma casa de todos”, garante Ivete.
As associadas contam ainda com um departamento jurídico a que podem recorrer em caso de pendências. Para completar, a Coopermoda investe em parcerias com profissionais e empresas qualificadas e investe em cursos de capacitação, workshops e palestras.
Existe um clima de organização na cooperativa, que hoje conta com cerca de 60 membros, um negócio praticamente de mulheres, por sua vez organizadas e coesas. O último BH à Porter, realizado de 6 a 10 de março no Novotel, revelou a potência do segmento de pronta-entrega, trazendo a Belo Horizonte 134 lojistas de todo o Brasil com passagem e hospedagem pagas. Outros 20 vieram de forma espontânea para conferir de perto as novidades das coleções inverno 23.
Quase 50 showrooms do Prado participaram do evento e 21 marcas estiveram presentes no showroom coletivo montado no hotel, com a intenção de ficarem mais perto dos clientes ali hospedados. Também faz parte da programação do BH à Porter um conteúdo intelectual com foco no business oferecido a cada edição. São palestras dirigidas, principalmente, aos compradores do interior, que vão de como melhorar a performance das suas lojas nas redes sociais à visual merchandising.
Dessa vez palestraram Moisés Guedes, stylist e visual merchandising, que falou sobre a importância do VM nas estratégias de vendas. Janaina Ortiga, conhecida por seu trabalho à frente de “O lojista de sucesso”, abordou o tema “Como garantir vendas o ano todo com lucro”. E Samantha Malheiros, da Escola de moda Denise Aguiar, enfatizou as tendências do varejo de moda para o ano de 2023.
No BH à Porter, praticamente todas as despesas são bancadas pelas marcas participantes e pelas consultoras de moda, além de alguns patrocínios. Os números demonstram a característica do setor da moda que, ao longo do tempo, acostumou-se a bancar seus próprios projetos, independentemente de ajuda do poder público.
Consolidação “O evento está consolidado”, afirma Ivete, que já tem data marcada para o próximo: 6 a 10 de agosto. “Os empresários já contam com o resultado financeiro do evento, que movimenta a cidade promovendo também o turismo de negócios. Os estoques das fábricas foram praticamente finalizados”.
Apesar das possibilidades trazidas pela internet e coadjuvantes importantes na comercialização, as diretoras da Coopermoda consideram que é importante os lojistas virem à Belo Horizonte no mínimo duas vezes ao ano. “Eles ficam impactados pelas coleções, podem ver e tocar as peças, conferir a modelagem, o acabamento, as ofertas de produto”, argumenta Eliane.
Elas enfatizam ainda que o público convidado fica entre o A e o B. “São boas boutiques que podem pagar pela beleza, qualidade e diferenciação das coleções”, acrescenta Jeanne Aguiar. Se algumas marcas fecharam as portas, outras foram surgindo para ocupar o espaço. Entre elas, podem ser citadas a Débora Carvalho, Annie Pestana, NC Brand, Mani, Amitee, Sarah Santos, Arbour, entre muitas que abriram durante a pandemia. “Nós procuramos dar força também a essas pequenas empresas para que elas possam prosperar”, afirma o trio.
A NC Brand, por exemplo, foi uma das que surgiram nesse período e segue em frente oferecendo um estilo casual com pitada de sofisticação, que alcança mulheres executivas que apreciam o fashion. “Participamos pela terceira vez do BH à Porter e essa foi a melhor edição em termos de resultados. Batemos nossa meta”, observa a empresária Nina Campos. Há dois anos no mercado, a grife já comercializa pronta-entrega para 16 estados do Brasil.
A Amitee é outra empresa presente no evento desde que abriu as portas um pouco antes da crise sanitária e vem conquistando clientes com o diferencial dos bordados. “Contamos com esse calendário para acelerar nossas vendas”, acentua Valéria Mendes. A veterana UH Premium, por sua vez, sempre investe em coleções atraentes na época tirando partido do DNA influenciado pela estética indiana.
E a Bôhho estreou no BH à Porter com o objetivo de conquistar clientes no atacado. Jéssica Santos, dona da marca, explora tecidos especiais, como a seda pura e sarjas encorpadas, e acredita em uma roupa atemporal, na sustentabilidade e no lixo zero. “Foi uma experiência muito gratificante. Fiz um network muito bom e estou à espera de bons resultados”, reforça.
Legalizado Outro aspecto relevante na história da Coopermoda, segundo as diretoras da associação, é a legalização dos negócios no setor. “O mercado foi regulamentado, todos os profissionais atualmente têm CNPJ, tiram notas fiscais e pagam impostos”, reiteram. A oficialização trouxe maior agilidade dentro da instituição. O departamento financeiro, por exemplo, teve que crescer para atender essas demandas.
A agilidade também se revela na expedição de compras: o Correio faz recolhimento duas vezes ao dia, há intenso trânsito terrestre e aéreo das mercadorias que saem do escritório. Em determinado momento, a realização do BH à Porter exigiu a contratação de uma agência especializada na emissão de passagens e hospedagens, já que o número de convidados aumentou.
Conforme o negócio expande, aumentam também as responsabilidades na excelência do atendimento aos clientes, já que são as consultoras que os guiam e os auxiliam no momento das compras. “Temos que ter bons carros, algumas contam com motoristas, se o caso é de Uber ele tem que ser o black. Nós criamos uma rotina que fez com que eles ficassem cada vez mais exigentes”, entregam.
Outra situação criada em função da necessidade de trazer os compradores à cidade é que hoje eles, praticamente, só aceitam os convites para os eventos de moda se os organizadores garantirem as passagens de avião, hospedagem e traslados. São os ossos do ofício, mas, em uma avaliação geral, o trabalho tem valido a pena e beneficiado a moda mineira.
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