" "A moda mineira precisa ser encarada e divulgada como a potência que é e que pode ser ainda mais"
Marcelo Souza e Silva ,presidente do Sebrae\MG e do CDL\BH
Com cerca de 224 mil estabelecimentos dedicados a setor de moda, o varejo fashion possui 25% do total deste segmento em Minas, entre aqueles situados na faixa das MPEs (Médias e Pequenas Empresas) e do MEI (Micro Empreendedor Individual) – e aponta um crescimento expressivo após o período de pandemia. Só na capital, são quase 30 mil negócios ligados a produção & vendas de artigos de moda. Os números são animadores e os planos para o setor estimulantes.
As boas noticias para esse tipo de comércio, essencial para a nossa economia, devem ser ainda mais ampliadas pela positiva conjunção de forças que, neste momento-chave, levou um atuante líder setorial, o empresário Marcelo Souza e Silva, à presidência do Conselho Deliberativo do Sebrae \MG – agregando ali sua experiência como presidente do CDL-BH (Câmara de Desenvolvimento Lojista) no sentindo de impulsionar e aprimorar nosso fashion retail.
Sua interação com o comércio e seus inúmeros desdobramentos, começou, aos 22 anos, quando concluiu a Faculdade de Administração (pela FUMEC) e montou uma loja de aviamentos para confecções de vestuário na Savassi – fato que contribuiu para apurar seu olhar em relação à industria & comércio de moda. Pode-se dizer, assim, que é uma das lideranças com maior sensibilidade para detectar, compreender e buscar metas adequadas ao fortalecimento do setor.
Algumas dessas propostas são apresentadas nessa entrevista.
Pode falar um pouco da sua trajetória como empresário e líder empresarial?
Comecei na vida empresarial muito cedo. Com apenas 22 anos, abri uma pequena loja de aviamentos, a Ponto Zíper. Depois, tive outros empreendimentos. Como liderança de classe, desde 1997 participo de todas as gestões da CDL/BH ocupando diversas vice-presidências. Sou Conselheiro Titular do Sebrae \ Minas há 24 anos. Em 2007, fui diretor da Junta Comercial, onde tive a felicidade de implantar o Minas Fácil, um programa que permitiu aos empreendedores abrirem empresas em tempo recorde.
Você teve outras atuações na vida pública?
Na Prefeitura de Belo Horizonte tive duas experiências muito positivas também muito próximas do mundo empresarial. Fui Secretário de Desenvolvimento Econômico e Secretário da Regional Centro-Sul. Atualmente, além das presidências da CDL/BH e do Sebrae, também atuo em outras instituições. Sou presidente da Junior Achievement Minas Gerais desde 2022, Conselheiro da Cruz Vermelha – Filial Minas Gerais, Presidente do Conselho Curador do Convention & Visitors Bureau de BH, Conselheiro Regional Efetivo do Conselho Regional de Administração de Minas Gerais, Conselheiro do Conselho Estadual de Turismo de MG e do Conselho Municipal de Turismo de BH.
Qual o percentual do varejo fashion (em comparação com o total do setor) em BH e em Minas?
Em Minas Gerais, são 224 mil pequenos negócios – entre micro e pequenas empresas (MPE) e microempreendedores individuais (MEI) ligados ao mercado da moda. Desses, 47,5 mil são MPE, sendo 75% da indústria e 25% do varejo, e representam 6% do total de estabelecimentos gerais do estado. Em 2022, entre os pequenos negócios que abriram e fecharam as portas no período, o saldo foi de 12 mil empreendimentos.
Já em Belo Horizonte, são 29 mil pequenos negócios ligados ao segmento, desses 6 mil são MPE, sendo 20% da indústria e 80% do varejo, e representam 4% do total de estabelecimentos na capital mineira. Em 2022, entre os pequenos negócios que abriram e encerraram suas atividades no período, o saldo foi de 1.165 mil empreendimentos.
Recentemente. você assumiu a presidência do Conselho Deliberativo do Sebrae \ MG. No âmbito dessa entidade, quais ações destacaria como as mais relevantes para o setor de moda?
O grande objetivo de atuação do Sebrae Minas na moda é destacar e valorizar a diversidade e as expertises dos diferentes polos do estado. Para isso, queremos dar espaço aos pequenos negócios, impulsionando o empreendedorismo e fortalecendo diversos segmentos da cadeia produtiva da moda em Minas Gerais. Temos como estratégia para o segmento no estado o Integra Moda, que inclui uma série de programas, eventos e iniciativas de promoção e capacitação a diversos segmentos da moda e ativando vocações locais.
Alguns dos programas que compõem o Integra Moda, são o ‘Minas Moda Autoral’ - que identifica e alavanca novas marcas no estado que reúnam originalidade e potencial para expandir no mercado. O Mãos à Moda, que tem como propósito resgatar o saber local, por meio de técnicas, vocações e matéria-prima de origem, para o desenvolvimento de produtos com identidade e valor agregado, conectados à produção de moda. Ele foi iniciado em janeiro deste ano e a previsão é que este projeto piloto tenha duração de dois anos. Temos a expectativa de inserir o Jequitinhonha na rota da moda autoral no Brasil.
Outra ação do programa é o Trend Connection, evento que está sendo realizado em várias cidades do interior do estado. A iniciativa pretende levar informações para pequenos negócios sobre as principais tendências do mercado da moda, para que possam se diferenciar e se tornar mais competitivos.
Pode citar outros programas?
Há também o Moda Brechó, que atende empreendedores do mercado de usados de todo o estado, interessados em se capacitar e melhorar os processos e a divulgação dos negócios no ambiente digital. Cerca de 130 negócios de Belo Horizonte e região metropolitana já receberam apoio para aprimorar habilidades empreendedoras e aprender sobre gestão do negócio e melhoria dos processos.
Importante citar o apoio aos polos de confecção, que é um trabalho de interiorização da moda e fortalecimento dos polos do segmento é voltado para o aprimorar da gestão dos pequenos negócios e incentivo à criação de políticas públicas que beneficiem o setor. Atualmente, Minas Gerais possui 27 polos ligados à moda, entre eles, os de moda íntima em Juruaia, Nova Resende, Monte Belo, Taiobeiras e São João do Manteninha.
Como está a situação dos Arranjos Produtivos Locais (APLs)?
O Arranjo Produtivo Local (APL) do Vestuário Belo Horizonte e Região Metropolitana, que tem como objetivo produzir conhecimento e caracterizar as empresas que constituem a APL Moda nas 35 cidades da Região Metropolitana e, também, em Sete Lagoas, está traçando um perfil básico que forneça um panorama para entendimento de demandas e alinhamento do Plano de Ação da Governança da APL.
Até o momento, as duas maiores subclasses da APL são comércio varejista de artigos do vestuário e acessórios e confecção de peças de vestuário, exceto roupas íntimas e confeccionadas sob medida. Detectamos que 97% das empresas deste APL possuem faturamento anual de até R$ 360 mil e têm, em média, 15 anos.
Do ponto de vista do Sebrae, observamos que existem muitas oportunidades a serem exploradas como e-commerce, marketplace, organização da cadeia produtiva e dos eventos. Notamos que a mão de obra qualificada ainda é um fator delicado e que os calendários de varejo e atacado não possuem sinergia. Nosso objetivo é fortalecer o APL para que os empreendedores de moda do estado tenham melhor compreensão do mercado, estejam abertos às mudanças e possam se capacitar.
E sob a visão da CDL/BH?
Sob a visão da CDL/BH, que é mais voltada para o comércio varejista, percebemos que o varejo de moda da cidade não compra da indústria local, o que gera pouco aproveitamento das oportunidades no próprio território. Isso mostra que a moda produzida aqui, em sua maior parte, é absorvida pelo varejo de outros estados e países. Além disso, temos a forte concorrência de preços menores vindos de outros estados como São Paulo e Goiânia, há também os produtos pirateados e modelos de negócios que precisam ser atualizados. Todas essas informações foram levadas ao Conselho CDL Negócios - Moda que, frequentemente, tem se reunido para estudar esses dados e buscar soluções efetivas para esses gargalos.
O visual merchandising voltou à moda. Quais outras inovações considera relevantes para estimular vendas?
O velho normal voltou à moda e os consumidores estão resgatando os hábitos de compra em lojas físicas. Entramos na era do “figital” (vendas físicas + digitais). Por isso, é importantíssimo que o lojista invista em uma ambientação diferenciada. O visual merchandising torna a jornada de compra mais atrativa e assertiva, já que 70% das decisões de compra são definidas dentro da loja. E engana-se quem pensa que essa estratégia é privilégio das grandes redes. Pequenos e médios estabelecimentos também podem se valer do visual merchandising. Na CDL/BH, por meio do programa Varejo Inteligente, temos lojistas que aumentaram o faturamento em 30% com simples ações de merchandising que aplicaram em seus negócios.
Além do visual merchandising, acredito que atendimento de qualidade, comprometimento e respeito com o cliente, agilidade na prestação de serviços e adaptação aos novos cenários de consumo são essenciais para estimular as vendas. Um lojista precisa entender e praticar esses fundamentos antes de pensar em qualquer tecnologia. As relações de compra e venda são pautadas em um relacionamento humano.
Na sua visão, quais foram as principais inovações no varejo assinaladas na NRF \ NY 2023?
Estive presente nesta edição da NRF, em Nova York (maior evento internacional do setor), juntamente com outros vice-presidentes da CDL/BH e da equipe técnica, onde fizemos uma imersão muito produtiva. Percebemos que o mercado está se digitalizando cada vez mais, mas as lojas físicas são onde a magia acontece. Os consumidores ficaram imersos no mundo virtual por muito tempo, agora eles querem voltar à vida real, onde o físico proporciona emoções e experiências. Este foi um dos principais pontos discutidos na feira. Falou-se também na importância de não subestimar assuntos importante como fluxo de caixa, controle de estoque, cadeia de suprimentos e atenção à moda de obra. É preciso manter-se a realidade do seu negócio.
Como a tecnologia está melhorando o varejo?
Na minha percepção, a tecnologia, quando bem aplicada, é capaz de elevar o faturamento de uma empresa sem ocupar o lugar de pessoas. Temos visto ao redor do mundo (como na China, Japão e Estados Unidos), o quanto a tecnologia tem transformado a experiência de compra. No Brasil, os super aplicativos transformaram o sistema de delivery de lojas e supermercados. Mas é preciso pensar que isso não significa a substituição do ser humano e nem é a realidade de todos os varejistas. Ainda existem realidades muito distintas, temos regiões do estado, por exemplo, em que a cobertura de internet não é tão eficiente, o que dificulta a adoção de algumas tecnologias. É preciso, também, identificar quanto e qual tecnologia é melhor para cada um.
Uma pesquisa nacional apontou crescimento de 23% no número de lojas físicas de 2021 para 2022. Em Minas e BH refletiu-se isso?
Ao longo do último ano, as pesquisas de datas comemorativas mostraram que as lojas físicas recuperaram a preferência do consumidor, após o boom do virtual durante a pandemia. Como as pessoas voltaram às ruas, ao trabalho presencial e à vida social, o comércio físico foi diretamente impactado. A internet não perdeu sua força, mas agora ela compartilha a escolha de compra do consumidor com o varejo de rua, com os shoppings e com as galerias. O cliente pesquisa um produto na internet e finaliza a compra na loja física, o que abre espaço para que o comerciante amplie a venda com outros produtos. Mas ainda temos muitas lojas fechadas – a região Centro-Sul de BH nos mostra isso. É um engano dizer que é o contrário, até mesmo porque fomos a capital onde o comércio permaneceu mais tempo fechado na pandemia e isso trouxe graves consequências. Porém, o varejo físico mantém sua força e importância.
Com o quadro econômico atual, que medidas considera mais urgentes para ajudar o comércio em geral?
O quadro econômico é desafiador, pois a taxa Selic está bem acima do ideal, a inflação diminui o poder de compra das famílias e impacta os comerciantes em diversas formas como aumento do custo de crédito, diminuição dos prazos de pagamento, repasse de valores para o consumidor e vários outros fatores. Entendo que, na atual situação, o mais urgente é o fim do aperto monetário e a adoção de um sistema de controle da inflação mais moderno, que leve em conta que o Brasil é um país em desenvolvimento e ,portanto, ainda demanda muitos investimentos públicos em infraestrutura, educação, saúde e crédito. A recente divulgação do arcabouço fiscal do atual governo pode ser encarado como um sinal positivo de mudança.
Você tem defendido a união/integração efetiva de todos os segmentos produtivos da moda mineira para seu fortalecimento. Como considera que isso pode ser feito?
Minha trajetória na CDL/BH, no Sebrae Minas e na administração pública me ensinou que a colaboração entre os setores e, principalmente, a união entre atores de um mesmo cenário, são os melhores caminhos para se alcançar desenvolvimento. A moda mineira já caminhou bastante neste sentido, temos boas entidades como o Instituto AMEM, a A.Criem, a Ascobap. Mas sinto que ainda falta sinergia e diálogo mais assertivos entre os representantes do segmento, entre os que fazem a moda ser uma realidade. A moda mineira precisa ser encarada e divulgada como a potência que é e que pode ser ainda mais. O segmento movimenta milhões de reais, gera centenas de empregos, mas ainda precisa expandir sua representatividade junto ao poder público, aos investidores e, até mesmo, ao público em geral. Acredito que um plano de ação entre as associações e criadores, uma análise crítica das potências, fraquezas, forças e oportunidades é um passo importante para o entendimento.