Jornal Estado de Minas

Mirantes de BH são locais onde é possível respirar ar puro e contemplar a cidade

Flávia Ayer

Turista sérvio, Vladimir Tirimic passeia pelo Mirante da Mata - Foto: Cristina Horta/EM/D.A Press.

“Belo Horizonte parece antes uma exclamação que um nome.” Ao escrever essas palavras, o genial Machado de Assis (1839-1908) provavelmente não contava que, na cidade fundada aos pés da Serra do Curral, haveria também lugar para interrogação. Vista do alto, a capital mineira põe em xeque o nome de batismo e mostra que, talvez, não seja apenas bela, mas mereça, assim como o Rio de Janeiro, ser chamada de maravilhosa. Possivelmente, o escritor também não contasse que a visão mágica dessa terra de montanhas se esconde, muitas vezes, atrás da falta de segurança, da estrutura precária e até mesmo da pouca divulgação dos mirantes de BH, impedindo a contemplação plena por moradores e turistas. O Estado de Minas percorreu oito mirantes, entre oficiais e informais, em busca de horizontes espetaculares e da razão pela qual acabam se restringindo a olhares de poucos admiradores, o que, para especialistas, trata-se de um grande potencial jogado às nuvens.

Embora no ano passado a prefeitura (PBH) tenha lutado contra os outdoors, em defesa da paisagem da cidade, a empresa municipal de turismo, Belotur, reconhece apenas dois pontos na capital como espaços oficiais para desfrutar da vista: o Mirante da Mata, no Parque das Mangabeiras, e o Mirante do Mangabeiras, na Praça Doutor Efigênio Sales, ambos no bairro homônimo, na Região Centro-Sul. O edifício comercial Torre Altavila, com mais de 100 metros de altura, em Nova Lima, é o terceiro do circuito oficial.

O mais famoso desses “pontos altos” de BH, o Mirante do Mangabeiras, atrás do Palácio do Governador, voltou a ser alvo da queixa de moradores. Segundo eles, o cenário deslumbrante virou, nas madrugadas dos fins de semana, pano de fundo para drogas, sexo e funk. Além de dar margem à discussão sobre a imposição de um horário de funcionamento para a área, a polêmica levou a Polícia Militar a intensificar a presença de patrulhamento no local e na vizinha Praça do Papa, palco de badernas. Mas a crítica quanto à falta de segurança é compartilhada por vizinhos de outros mirantes da capital, como no Bairro Tupi, na Região Norte.

Sobrevoo

Problemas à parte, é possível desfrutar, e muito, desses espaços. Nos oito mirantes, espalhados por várias regiões de BH, a sensação é de poder sobrevoar a cidade, sem a necessidade de avião, helicóptero ou parapente. O relevo ajuda a explicar o porquê. Situada a cerca de 850 metros acima do nível do mar, a capital se formou na encosta da Serra do Curral, cujo ponto mais alto, o Pico Belo Horizonte, tem altitude aproximada de 1,5 mil metros. “Há desníveis de 700 metros numa distância pequena”, ressalta o professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o geólogo Edézio Teixeira de Carvalho, autor de estudo sobre a capital. “Apesar do relevo menos marcante, há também elevações muito significativas no outro extremo, nas regiões Norte e Venda Nova, onde havia muitas pedreiras”, destaca.

A explicação de Teixeira é acompanhada de lamento: “O turismo contemplativo é pouco explorado em Belo Horizonte.” Sentimento compartilhado pelo professor da Escola de Arquitetura da UFMG, Leonardo Barci Castriota. “BH é descrita como uma capital nas montanhas, mas o poder público não incentiva isso. Uma pesquisa feita na cidade mostra que o Complexo da Pampulha e o Mercado Central são as principais atrações, deixando de fora uma marca da cidade. Santiago, no Chile, fez o oposto e transformou seu único morro (Cerro Santa Lucia) num dos principais pontos turísticos”, afirma.

Defensor da implantação de um teleférico na cidade, Castriota é categórico: “Morar numa cidade de montanhas e não apreciar sua vista é como morar perto do mar e não ir à praia. A paisagem é uma síntese do município, pois traz a marca das transformações do homem na natureza”. E, se o visual é a praia do belo-horizontino, opções não faltam. Visto do deck do pouco conhecido Parque Municipal Amílcar Vianna Martins, no Bairro Cruzeiro, na Zona Sul, o degradê de cores do pôr do sol envolve o centro urbano. No Mirante do Comiteco, na mesma região, a brincadeira é identificar os prédios da cidade.

Bênção

À noite, no Mirante 2 da Serra do Curral, no Jardim Taquaril, na Região Leste, o chão parece se transformar num céu de estrelas. Na mata do Parque das Mangabeiras, a impressão que se tem é de que a paisagem repousa sobre as árvores. “Se soubesse da beleza, teria trazido uma cadeira para ficar aqui o dia todo, só contemplando”, diz o turista sérvio Vladimir Jirimyc, de 37 anos. São lugares abençoados pela natureza e, no caso do mirante do Bairro Milionários, no Barreiro, também pelo Cristo Redentor.

Mas, apesar de todo esse potencial, a Belotur não cogita a criação de um roteiro turístico com enfoque nos mirantes de Belo Horizonte. A ideia é destacar pontos de contemplação da vista dentro do projeto do Complexo Ambiental Serra do Curral, uma das principais apostas da prefeitura para alavancar o turismo durante a Copa do Mundo de 2014. O circuito vai interligar os parques das Mangabeiras, Serra do Curral, previsto para ser inaugurado no segundo semestre, o Estadual da Baleia, na Região Leste, e o Fort Lauderdale, no Bairro Sion. “Existe uma preocupação em mostrar a cidade, mas a partir de um tema. Esperamos a conclusão do projeto com diretrizes preliminares em julho”, explica a gerente de Atração de Investimentos e Turismo do Comitê Executivo Municipal da Copa de 2014, Stella Kleinrath, afirmando que o projeto vai avaliar a viabilidade de um teleférico no complexo.

Sombra e incentivo ao descanso no Comiteco: poucos o conhecem - Foto: Cristina Horta/EM/D.A Press.