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Estado de Minas

Tradicionais praças de BH sofrem efeitos da criminalidade, mas ainda são patrimônio


postado em 01/05/2011 07:24 / atualizado em 01/05/2011 07:39

Praça da Liberdade: Lazer e natureza se mesclam a cultura e poder na capital(foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)
Praça da Liberdade: Lazer e natureza se mesclam a cultura e poder na capital (foto: Marcos Michelin/EM/D.A Press)

... da liberdade

Os espaços tradicionais que são oásis verdes para pedestres, praticantes de esportes, manifestantes e namorados em meio ao mar de concreto de BH

... da história

O perfil de quatro estruturas projetadas por Aarão Reis em diferentes pontos do perímetro da Contorno revela como a cidade trata suas áreas de convivência

... do desrespeito

Os excessos, abusos e crimes que desafiam autoridades e amedrontam frequentadores, especialmente com o cair da noite, nas áreas em pleno coração da capital


Cidade sem praça é cidade sem vida. Espaço do povo em que o preconceito não é bem-vindo, seja onde for, ela é lugar do encontro, da diversão, mas também palco de lutas e problemas sociais. Belo Horizonte não foge à regra. Em busca da essência dessas ilhas democráticas, repórteres do Estado de Minas se sentaram nos bancos de quatro das principais praças nos limites da Avenida do Contorno. Desde o início da manhã até altas horas da noite, diante das equipes desfilaram razões que fazem desses locais atrações turísticas cobiçadas, assim como os desencantos que lhes tiram o brilho e desafiam autoridades. Em comum, além de serem bens tombados e marcos da história de BH, previstos na planta arquitetônica projetada por Aarão Reis, as praças da Estação, oficialmente batizada como Rui Barbosa, da Liberdade, Carlos Chagas (da Assembleia) e Raul Soares representam um dilema para a cidade, ao se transformar em endereço fixo para a população de rua.

Antigo portal de entrada da capital, a Praça da Estação, no Centro, ao mesmo tempo em que ostenta o título recente de reduto cultural, sofre a ameaça de enveredar pelos trilhos do crack e de outras drogas. Da sacada do Edifício Central, a vista exuberante integra uma esplanada com jardins franceses, rodeados de casas de cultura, como o Museu de Artes e Ofícios, o Centro Cultural da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e o Espaço 104. Mas, um olhar atento identifica cenas que têm inquietado moradores e comerciantes da região. Há cerca de cinco meses, as imediações da praça passaram a concentrar cada vez mais consumidores de entorpecentes. Frequentadores relatam que os usuários não se intimidam com a luz do dia e, à tarde, é possível vê-los acendendo cachimbos de crack, preferência de quem frequenta o ponto.

Desembarcamos na Estação e subimos 15 quarteirões pelos eixos das avenidas Amazonas e Olegário Maciel, até encontrar a Praça da Assembleia, no Santo Agostinho, em sua espera solitária por reforma – ao contrário das demais, que estão em bom estado de conservação. Apesar de recomendação do Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, a restauração não tem data para sair do papel. Mesmo assim, o espaço é palco de atividades culturais e esportivas. A estrutura do playground e as árvores são usadas por um grupo de amigos praticante do le parkour, método natural para treinar o corpo e torná-lo capaz de mover-se com agilidade, transpondo obstáculos naturais e urbanos. “Treinamos aqui desde 2004, pois o espaço e os equipamentos da praça são ideais. Só acho que está faltando um bebedouro”, diz Arthur Barros, de 26 anos, adepto da modalidade.

De um centro de poder a outro, pegamos o tobogã da Rua Antônio Aleixo para chegar àquele que talvez seja o endereço mais charmoso e marcante da cidade, onde história, política e cultura se misturaram para dar os contornos de um marco da mineiridade. Com suas palmeiras-imperiais exuberantes, a Praça da Liberdade, no Bairro Funcionários, expressão do poder político e novo point da cultura, não se livra dos contrastes. Canteiros bem cuidados, com 14 tipos de flores, fontes exuberantes, edifícios históricos e circuito cultural. Juntos, esses elementos elevam a praça à condição de um dos mais belos cartões-postais da cidade. Os encantos fazem do lugar atração turística e ponto de encontro dos belo-horizontinos, que, antes das 7h, já fazem a vida pulsar na área verde cercada de cidade por todos os lados. Tanta beleza, no entanto, tem seus contrastes, como o mau uso de frequentadores, que insistem em pisar na grama e jogar lixo no chão, ou a interdição do coreto, cujo teto ameaça ruir.

Se de dia há liberdade para correr, descansar e contemplar a praça, à noite, frequentadores reclamam de casais de namorados e turmas de jovens que se veem livres para extrapolar limites da boa convivência. Outro incômodo é o pesado trânsito que cerca o oásis contornado por asfalto e concreto em pleno coração da cidade. “Há cenas protagonizadas por jovens aqui que ofendem a moral. Dia desses, um rapaz abaixou a calça na nossa frente e os policiais nem se mexeram. É inconcebível uma coisa dessas em um local bastante frequentado por idosos e crianças”, reclamou Sulamita Oliveira, de 77 anos, que sempre vai à praça acompanhada das amigas Terezinha Maria Inácio, de 81, e Daisy Chaves, de 79.

Depois de respirar os ares da Liberdade, nosso roteiro nos leva a descer a Avenida Bias Fortes para chegar à maior confluência de grandes avenidas da cidade. Revitalizada há quatro anos, a Praça Raul Soares, no Barro Preto, é a prova viva de como o cuidado com o patrimônio pode operar milagres terrenos. De ponto de referência para assaltos e criminalidade em geral, o lugar, que por muitos anos se limitou a ser uma rotatória para o tráfego frenético de veículos, alia hoje funções como pista de caminhada, jardim para descanso e espaço para contemplação, com música ambiente. Se você não conhece, acredite: a água brinca na fonte da praça ao som de trilha sonora clássica. Essa reviravolta teve como motivo a revitalização, em 2006, do local um dia pensado para ser o ponto central da capital. “Acho adorável essa coisa musical, além das rosas que enfeitam os jardins. É um ambiente democrático, até promíscuo, mas que não ultrapassa o limite do tolerável”, avaliou o psicanalista chileno Oscar Vidal, de 56, que mora no Barro Preto há dois anos, referindo-se aos excessos de alguns casais.

Apaixonados como ele por essas ilhas verdes no mar cinzento da metrópole convidam a um passeio, nas próximas páginas, por quatro praças da fundação de BH. Nele, vamos descobrir o perfil de cada uma e como elas mudam de cara e de vocação com os primeiros raios de sol ou quando os tons avermelhados no céu anunciam a chegada da noite.


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