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Estado de Minas

Moradores do Santa Amélia relatam abandono das pessoas em situação de rua no bairro


postado em 16/05/2011 06:58

O envenenamento de oito moradores de rua que viviam há quase dois anos na Praça Iron Marra, no Bairro Santa Amélia, Região da Pampulha, movimentou a Polícia Militar e muitas equipes médicas ontem de manhã. Os mendigos foram intoxicados ao ingerir cachaça misturada com uma substância granulada preta que pode ser chumbinho (veneno usado para matar ratos). Moradores que ajudaram a socorrê-los contaram que os mendigos encontraram a garrafa de cachaça largada na grama, no início da manhã de ontem, e consumiram a bebida. Todos estão em estado grave. Eles foram socorridos pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e levados para quatro unidades de Pronto Atendimento (UPA) e para o hospital Risoleta Neves, em Venda Nova, e Pronto-Socorro João XXIII, no Centro de Belo Horizonte.

Policiais que registraram a ocorrência avaliam a hipótese de que o responsável pela tentativa de homicídio tenha deixado a garrafa com a bebida envenenada durante a madrugada, para evitar ser visto e dificultar sua identificação. Habitantes da região contaram que não foi a primeira vez que alguém tentou matar os mendigos. Há alguns meses, alguém deixou comida envenenada na praça, mas os moradores de rua desconfiaram e não consumiram o alimento. Um cachorro comeu e morreu.

Os primeiros a perceber que havia algo grave com os mendigos, sete homens e uma mulher com idades entre 21 e 33, foram pessoas que moram nas proximidades. A aposentada peruana Júlia Bernuv, de 66 anos, contou que encontrou o grupo agonizando por volta das 7h. “Não consigo esquecer o rosto deles de agonia, gritando de dor. Eles olhavam para mim pedindo socorro. Todos estavam vomitando, evacuando sangue. As pessoas olhavam aquilo tudo e não faziam nada. Até os bombeiros duvidaram de mim, quando liguei, dizendo que não iam atender mendigos bêbados de cachaça. Expliquei que eles tinham sido envenenados por chumbinho”, disse ela.

Na praça, vasilhas de plástico, pedaços de papelão, um pequeno fogareiro feito com tijolos, garrafas de bebida, guimbas de cigarro e cobertores mostravam um cenário de abandono, no qual os mendigos viviam desde 2009. Moradores do bairro afirmam que a praça está em péssimo estado há anos. A prefeitura, segundo eles, chegou a retirar os bancos para evitar que a população de rua se instalasse no local, o que não adiantou. Apesar do mau cheiro, das cenas de sexo, gritaria, sujeira e incômodo, a atitude desumana de quem cometeu o crime foi rechaçada pelos moradores.

O jornaleiro Maurício Pereira, de 44, acompanhou tudo de perto. Com a banca instalada no local, ele disse que os moradores de rua começaram a passar mal depois de beber o conteúdo da garrafa de vidro. “Quando abri a banca, por volta das 6h30, dois já estavam vomitando. Os outros estavam sentados em volta de uma árvore, bebendo também. Meia hora depois, eles passaram a reclamar de dor na barriga”, contou. “Em outubro faz dois anos que esse grupo dorme sob as marquises e passa o dia inteiro na praça. Usam drogas, brigam entre eles, pedem dinheiro e fazem a porta dos moradores de banheiro, o que causa incômodo em todo mundo. Mas daí a dar veneno, é demais”, lamentou o jornaleiro.

A dona de casa Maria de Fátima Cardoso, de 54, ia comprar ração para seus cães,quando ouviu uma vizinha gritando por socorro. Ela ajudou a socorrer as vítimas de envenenamento e lembra que esta não foi a primeira vez que tentaram “exterminar” a população de rua que vive na praça. “Há uns meses, misturaram chumbinho em pratos de comida e espalharam pela grama. Quem passou mal foram os cachorros deles. Desta vez, conseguiram fazer essa maldade. Eles estavam trêmulos, uivando de dor. O governo não toma nenhuma atitude , eles também não querem sair das ruas e eu acabo ajudando. Sei que as pessoas se incomodam com essa situação, mas ninguém tem o direito de tirar a vida”, alegou a moradora.

Os oito moradores de rua chegaram às unidades médicas com diarreia, náuseas, vômito, dores abdominais e sonolência. A garrafa com um resto de líquido e substância granulada preta foi recolhida por policiais militares, que registraram o caso na 7ª Delegacia Seccional de Venda Nova. À tarde, o material foi encaminhado ao Instituto de Criminalística para análise.


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