Símbolo da arquitetura moderna de Belo Horizonte e da ousadia estética da década de 1940, o conjunto habitacional IAPI, no Bairro São Cristóvão, na Região Noroeste, começa a deixar para trás os últimos 30 anos de abandono. A revitalização dos nove prédios que integram o complexo, com a pintura das paredes externas, está adiantada e já contribui para melhorar a autoestima dos moradores. “Tudo aqui está mais alegre”, diz Francisco Braga, de 78 anos, morador desde 1980.
Quem passa pela Avenida Antônio Carlos ainda não percebe as mudanças, mas basta entrar no conjunto para senti-las. Dos nove prédios que compõem o IAPI, dois já estão com as fachadas pintadas e os moradores, entusiasmados, também investem em obras, recuperando os apartamentos internamente e trocando as antigas janelas por esquadrias de alumínio. “Todos procuram melhorar ainda mais o astral”, diverte-se Francisco, animado com o que chama de “IAPI de cara nova”.
A iniciativa de pintar o conjunto, que está contribuindo para revigorar o ânimo da comunidade, é resultado de parceria entre a prefeitura, o Sindicato do Comércio Varejista de Material de Construção (Sindimaco), a fabricante de tintas AkzoNobel e seis empresas do setor de construção civil. Projetos semelhantes são desenvolvidos em outras capitais. Com custo estimado em R$ 700 mil, é a primeira ação do programa Adote um Bem Cultural, da prefeitura, que busca apoio da iniciativa privada para restaurar o patrimônio da cidade.
Quando o projeto foi lançado, em abril, a primeira ideia era pintar o conjunto de azul, um tom inspirado na paleta de cores do artista plástico Cândido Portinari, que tem grande identificação com Belo Horizonte por suas obras na Igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha. “Era uma proposta que não foi aprovada pelo Conselho Deliberativo Municipal do Patrimônio nem pelos moradores. Então, com o tema, riquezas de Minas, escolhemos tons que representam o ouro, minério e ferro”, explica Júlio Gomes, sócio da Casa & Tinta, parceira da proposta.
Memória
Os novos ares do conjunto reavivam na memória de Ada Rabelo, de 86 anos, o começo de sua vida no IAPI. Uma das moradoras mais antigas, ela conta que, aos 22, quando se casou, mudou-se para lá. “Na época, os edifícios estavam sendo erguidos aos poucos. Havia um único morador em meu prédio. Lembro-me que vi todas as paredes serem pintadas”, conta, acrescentando que, pela segunda vez, vê o conjunto ganhar cores. “Aqui sempre foi alvo de preconceito. As pessoas acham que é local de drogas, mas não é. Há tranquilidade e respeito em nossos lares e, por isso, ao ver as paredes pintadas, aposto que os antigos preconceitos vão desaparecer.”A festa junina dos moradores, no mês que vem, promete ser a mais animada dos últimos anos. É o que espera Kátia Santos. “Nossa quadrilha, com certeza, será maravilhosa com este novo visual”.
A expectativa dos moradores é de que a restauração seja concluída até o fim do ano, mas Júlio Gomes afirma que, em princípio, está mantido o prazo de 12 meses. “Estamos começando a pintar edifícios com menos problemas”, informa, acrescentando que, além da pintura na fachadas, é feita uma mistura de tintas. “É um produto especial. Vamos pintar também a área de lazer. O projeto é custeado pela iniciativa privada e pela comunidade, que fez um rateio”, conta Júlio. Segundo ele, projeto semelhante foi executado nos arcos da Lapa, no Rio de Janeiro. “Mas o do IAPI é maior. O conjunto foi escolhido por se tratar de um marco da capital mineira.”
História
Um dos símbolos da industrialização da capital, o IAPI foi construído pela prefeitura em parceria com o Instituto dos Industriários. As obras foram iniciadas em 1944 e os prédios, inaugurados em 1947 pelo então prefeito Juscelino Kubitscheck, logo depois do conjunto arquitetônico da Pampulha. Foi consequência da principal obra do governo JK na capital. Na época, a prefeitura iniciou a construção da Avenida Pampulha, hoje Antônio Carlos. Além da abertura da via, JK vislumbrou a construção do conjunto, incorporando a verticalização de prédios à cidade para reduzir problemas habitacionais. Foi o primeiro empreendimento a usar blocos verticais na capital e trazia como novidade as pontes flutuantes, permitindo a circulação entre os edifícios. O projeto é do arquiteto White Lírio Martins. Em 2007, o conjunto foi tombado pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de BH.