Vozes em defesa do bem natural mais precioso do planeta, a água, ecoaram neste sábado pelos quatro cantos de Belo HorizonteUm colorido desfile pelas ruas do Bairro Serra, na Região Centro-Sul da capital, deu vida à beleza natural e à riqueza histórica e cultural do Rio São FranciscoUma cobra d’água de 30 metros de comprimento, bonecos gigantes e figuras representando peixes e carrancas puxaram o cortejo ao som de canções popularesÀs margens do Ribeirão do Onça, na Vila Fazendinha, Região Nordeste da capital, moradores pediram socorro para o afluente considerado o maior poluidor do Rio das Velhas.
“Deixem o Onça beber água limpa”O pedido dos moradores da Vila Fazendinha diz tudo sobre a realidade do ribeirão, que padece com a sujeira e a degradação e marca a vida da comunidade com enchentes e tragédias, como a que provocou a morte de uma pessoa em novembroTrinta e uma entidades parceiras – escolas, associações de bairros e organizações não-governamentais – se uniram nas ruas do bairro para cobrar providências para os principais problemas do curso d’água, que tem apenas 60% do esgoto tratado e 1,7 mil famílias em áreas de risco e inundação ao longo da Bacia do Onça, segundo dados da Prefeitura de Belo Horizonte.
Exposições, palestras e estandes contaram parte da história do ribeirão, o principal afluente do Rio das VelhasFormado pelas águas dos córregos Cachoerinha e Pampulha, que se encontram na Avenida Cristiano Machado, o Onça acumula lixo e esgoto, mas também conta com o carinho dos moradores que sonham em um dia poder voltar a nadar em suas águas e brincar em suas tímidas e poluídas cachoeiras.
“Queremos chamar a atenção para a situação de calamidade em que se encontra o ribeirãoMuita gente que passa aqui nas margens apenas tapa o nariz e fecha os olhos para não ver o problema, mas precisamos de uma solução urgentePor isso, organizamos essa ação de requalificação socioambiental no Onça”, explica o organizador do movimento e presidente do Conselho Comunitário Unidos pelo Ribeiro de Abreu (Comupra), Itamar de Paula.
A ação foi marcada também pelo plantio simbólico de árvores nas margens do ribeirão, distribuição de mudas e apresentações culturais, como a esquete teatral Nas rodas da lavação, do grupo da Superintendência de Limpeza Urbana (SLU)Com uma muda de hortelã nas mãos, a técnica em enfermagem Cleusa Ferreira, de 44 anos, engrossou o coro de socorro ao Onça“Tenho dó de ver o ribeirão nessa sujeira
O secretário municipal de Administração Regional Nordeste, Jorge Espeschit, reconheceu os desafios, mas afirma que as intervenções já em curso em BH e em Contagem vão culminar com a melhoria da qualidade das águas“Hoje 85% do esgoto da Bacia do Onça é coletado em BHA estação de tratamento do ribeirão trata 60% desse material, o que equivale a 1,1 mil litros por segundoEssas ações de saneamento vão trazer resultado para a despoluição”, disseSobre as 1,7 mil famílias em área de risco e inundação – 320 delas em locais considerados de alto risco –, o secretário garantiu que há estudos em andamento para dimensionar o valor necessário para as remoções.
Velho Chico
Com o tema Nadando nas águas do menino Francisco, mais de 400 alunos e professores da Escola da Serra tomaram parte da Rua do Ouro e da Avenida Bandeirantes, no Bairro Serra, num cortejo sobre a história do Rio São FranciscoPescadores, lavadeiras, peixes, cobras d’água, orixás, barquinhos, lendas e personagens típicos do conhecido rio da unidade nacional marcaram o desfile que pedia pela preservação ambiental e resgate das tradições.
“O cortejo é resultado de seis meses de pesquisas sobre o rio, que envolveu todas as matérias para estudar a cultura, os peixes, os hábitos alimentares das populações ribeirinhas, a história, a geografia e os textos de Guimarães RosaOs alunos foram divididos em sete alas, como numa escola de samba, e estamos dando vida ao rio com canções populares cantadas ao vivo”, explica a coordenadora de artes da escola, Juliana PalharesPara Pedro Gomes, de 10, aluno do 5º ano do ensino fundamental, a festa foi se vestir de viajante do rio
Herói da Fazendinha
Depois de acordar moradores de 21 casas da rua onde morava na Vila Fazendinha, no Bairro Ouro Minas, Região Nordeste da capital, e de salvar o cão de estimação que se afogava dentro de casa, o entregador de gás Edgar Bispo dos Santos, perdeu a vida aos 36 anos de idade, quando retornava para salvar suas galinhasConhecido pelo apelido de Saruê, Edgar morreu afogado em 23 de novembro do ano passado e entrou para a história como a primeira morte provocada pelas chuvas em Minas, em 2010.
Sujeira e degradação
Para compor o cenário de sujeira e degradação do Ribeirão do Onça, uma rede de esgoto estourou, nesta manhã, na rua de acesso ao evento “Deixem o Onça beber água limpa”O mau cheiro se espalhou rapidamente e todos os participantes – sem exceção – sujaram os pés na água turva e fétida que se espalhou pelas vias da Vila Fazendinha.