Jornal Estado de Minas

Morte no Peru interrompe planos de brasileiros

Mineiro e paulista mortos no Peru deixam para trás sonhos, como a comemoração de 90 anos do pai, e viagem internacional à Europa com a mulher, programada para a próxima semana

Paula Sarapu

O comerciante Augusto Ribeiro Neto, cunhado do geólogo Mário Guedes, se revoltou com noticiário peruano: "A família está sofrendo muito" - Foto: Jair Amaral/EM/D.A Press

Um dos últimos sonhos do engenheiro Mário Bittencourt, de 61 anos, encontrado morto quarta-feira no Peru, era o desejo de comemorar no próximo sábado o aniversário de 90 anos do pai, o bancário aposentado Milton Pimentel BittencourtA família se preparava para o evento e o aposentado chegou a reformar um sítio para a celebraçãoMário era aguardado pela família na quarta-feira, quando chegou a confirmação da sua morte

O irmão dele, o também engenheiro Cláudio Antônio Soares Bittencourt, de 58, afirma que Mário era a “nata” da empresa onde trabalhava, a Leme Engenharia, e que há cerca de dois anos recebeu um prêmio em Paris por uma barragem feita no Rio Madeira, em Rondônia, no Norte do Brasil“A empresa dele ganhou a concorrência graças a um estudo feito por ele”, disse o irmão“Ele coordenava todos os projetos e gostava de ir ao local para fazer estudosFez barragens no Panamá, Costa Rica, Equador e no ChileMuito prestigiado.” Mário era muito ligado à família, reforça o irmãoEra o segundo dos três filhos

O sobrinho Felipe Ribeiro Bittencourt, de 29 anos, também engenheiro civil, conta que tinha adoração pelo tio – pessoal e profissionalmente Destaca a experiência de vida dele e a competência profissional
“Estamos todos abalados emocionalmente”, disse Felipe, ao falar do sofrimento da mulher de Mário, a dona de casa Fátima Guerra, e dos filhos, Mariana, de 21, e Bruno, de 18“Eles perderam a noçãoPara os filhos, o pai era tudoMeu tio era a base real da família”, acrescentou.

Mário morava ao lado da casa dos pais, em Belo Horizonte, e  era extremamente dedicado à família, segundo o sobrinho “Todos alimentaram a esperança de encontrá-lo vivo, até chegar a notícia da sua morte, às 10h30 de quarta-feiraEu tinha a certeza de que iria encontrá-loSou engenheiro e vivia ao seu ladoEle era muito experiente, profundo conhecedor da naturezaDe topografia entendia tudoEle sabia onde tinha rio, onde tinha água
Mesmo se estivesse perdido, não seriam dois dias que iriam matá-lo de fomeDisseram que acharam todos os pertences dele, mas um engenheiro e um geólogo sempre andam com papel e caneta para fazer anotações de como o projeto seria Se estivessem morrendo por algum motivo, teriam deixado uma carta”, disse Felipe.

Amor a Minas

Nos últimos diálogos que teve com a família, pelo computador, Mário Gramani Guedes não escondeu sua expectativa para o fim do trabalho de campo na região da floresta amazônica do Peru: “Fériaaaaasss”, ele escreveu no bate-papo, contando os dias para a viagem que faria com a mulher pela EuropaEles tinham 30 anos de união e embarcariam na segunda-feira, viajando por 18 diasO geólogo Guedes era paulista, mas adotou com amor a cidade de Uberlândia, no Triângulo Mineiro, onde morava desde 1987A mudança foi por causa da profissãoOs encantos do município, no entanto, acabaram conquistando o coração do corintiano.

“Ele adorava Uberlândia e queria envelhecer aquiDesde 2000, meu pai morava em Belo Horizonte durante a semana, mas não deixava de vir para casa toda sexta-feira, para passar o fim de semana com a genteEle fazia muita questão de estar com a família e o amor da vida dele era nosso cachorrinho de estimação, o maltês PeticoEsta viagem ao Peru era o último trabalho antes das férias e ele estava ansioso porque planejou uma viagem com minha mãe para a EuropaEles iam conhecer a Alemanha e a Holanda e visitar uma amiga em Londres, cidade de que ele gostava e que queria rever”, contou a filha Júlia, de 30 anos, com dificuldade de usar os termos no passado

O comerciante Augusto Ribeiro Neto, de 63, cunhado do geólogo Mário Guedes, conta que ele deixou dois filhosAlém de Júlia, que é médica, Márcio Guedes, de 26“Sou casado com a irmã de Mário GuedesA família está sofrendo muito”, disseAugusto conta que os familiares ficarem revoltados com um jornal peruano que publicou a foto de duas vítimas de acidente de carro identificando-os como se fossem os brasileiros“Chocou profundamente a famíliaO jornal noticiava um fato e colocou a fotografia de uma caminhonete com os corpos, sangrandoSó que, quando fomos verificar, tinha uma carreta tombada ao lado, que não tinha a ver com o caso”, disse Augusto.

 

Sem data,  corpos vêm em avião

 

A Leme Engenharia, empresa na qual trabalhavam dois brasileiros, mandou um avião para resgatar os corpos na cidade peruana de Baguá Grande e levá-los para o BrasilA data de traslado, porém, não foi definidaO embaixador brasileiro, Carlos Alfredo Lazary Teixeira, acompanha o caso, mas nessa quinta-feira ainda não havia informações sobre a liberação dos corposO geólogo Mário Gramani Guedes, de 57 anos, e o engenheiro Mário Augusto Soares Bitencourt, de 61,  trabalhavam no pré-projeto de construção da hidrelétrica de Vera Cruz

- Foto: Soraia Piva/EM/DA PressTeixeira evitou comentar especulações de que os dois brasileiros teriam sido assassinados por habitantes da região contrários à instalação da usinaEle reafirmou que não há sinais de violência nas vítimas e que eles foram encontrados próximos um do outro, com os pertences, máquinas fotográficas, rádios e celulares

LEME Em nota oficial, a Leme Engenharia declarou estar fazendo todos os esforços tanto para a execução, mais rapidamente possível, do traslado dos corpos para o Brasil quanto para o fornecimento de todas as informações disponíveis aos familiares de Mário Bittencourt e Mário Guedes

Na noite dessa quinta-feira, de acordo com o informe, um representante da empresa se dirigiria a Chiclayo, para onde os corpos seriam encaminhadosA Leme contratou um médico-perito particular, para a coleta de amostras suplementares a serem enviadas para o Brasil.

Mário Bittencourt e Mário Guedes são descritos como profissionais preparados para missões como a que era desempenhada no PeruEles trabalhavam na região de Jaén, a aproximadamente 800 quilômetros da capital, LimaA área é de formação montanhosa com altitudes variando entre 600 e 1,4 mil metros,  com temperaturas entre 8° e 18°.  A equipe, conforme a Leme, utilizava estradas e trilhas pré-existentes e profissionais condutores