O tempo ainda não conseguiu transformar a dor em saudadeFaz apenas 22 dias que Gaudêncio Faria de Almeida e Lenice Aparecida Nunes de Almeida, ambos com 55 anos, foram obrigados a se despedir do filho Gaudêncio Nunes Almeida, de 21, o GaudencinhoO universitário e dois amigos estão na lista das 40 pessoas que morreram em rodovias federais que cortam Minas Gerais apenas este mêsEles perderam a vida na BR-262, entre os municípios de Campo Florido e Uberaba, no Triângulo Mineiro, quando voltavam de uma festaO acidente ocorreu três dias depois de o Ministério dos Transportes, com a explosão da crise envolvendo suspeita de superfaturamento de obras, suspender dois editais que previam a melhoria da via.
Os processos de licitação, interrompidos e sem data para serem reabertos, preveem a elaboração de estudos técnicos, além de obras de restauração e duplicação em 9,9 quilômetros de pista, entre a entrada do município de Bom Despacho, no Centro-Oeste, e a MG-423, no Triângulo MineiroEmbora não trate especificamente do trecho de pista simples pelo qual passou Gaudecinho, a notícia da paralisação dos editais aumenta a dor da família“Não se pode conceber e permitir que mais vidas sejam ceifadas pelo descaso das autoridadesSabemos que, muitas vezes, a culpa é realmente do péssimo estado de conservação de nossas estradas”, afirma Gaudêncio, emocionado.
O filho era um dos passageiros do veículo que bateu numa árvore“Há notícia de que eles teriam bebido, uma tragédia indescritível, imensurável, dessas que, infelizmente, ocorrem a toda horaA pista onde ocorreu o acidente está em boas condições de conservação, mas não tem acostamento, não tem sinalização”, conta o pai, acreditando que estradas melhores podem equilibrar a imprudência de motoristasNatural de Campina Verde, no Triângulo, Gaudencinho cursava o 5º período do curso de engenharia ambiental e havia acabado de ser promovido no emprego.
DESCASO HISTÓRICO
As histórias de perdas em acidentes durante julho são recorrentes nas estradas mineiras, o que reforça a percepção de que o descaso não reflete apenas a atual crise no Ministério dos Transportes
RECOMPOSIÇÃO AGUARDADA
Esvaziado desde o início da crise, o Dnit teve exonerados seis dirigentes, responsáveis pelo setor de gestão dos programas de infraestrutura nas estradas federaisNa sexta-feira, a presidente Dilma Rousseff assinou decreto que determina ao conselho administrativo do órgão a escolha dos nomes que devem substituir provisoriamente os diretores afastados após denúnciasO objetivo do governo federal é assegurar condições de trabalho no departamento e evitar que a paralisação das obras geridas pela pasta se arraste por mais tempo.
O superintendente regional do Dnit em Minas, Sebastião Donizete, afirmou nesta semana que o órgão sabe da importância das obras para o estado e que os processos licitatórios previstos para as rodovias mineiras estão em andamento em Brasília na sede do departamento, aguardando autorização do ministro dos Transportes para ser retomadasOntem, a assessoria da superintendência mineira informou que os editais devem ser retomados assim que o prazo de 30 dias de suspensão se encerrar, em 5 de agosto, e que novos adiamentos não estão previstos.
Precariedade no asfalto
Quatro pontos, em síntese, representam os principais problemas das rodovias que cortam o estadoA fiscalização é falha: há precariedade de pontos de pesagem de caminhões; falta controle de consumo de bebidas e psicotrópicos; não há radares e, quando há, o motorista é informado sobre o ponto onde o aparelho está, o que é um equívocoAlém disso, o nível de manutenção da pavimentação e sinalização no Brasil é deficiente e, em Minas, que tem a maior parte da malha viária, essa combinação é cruelO terceiro ponto, que pode estar no topo da lista, é o fato de as estradas, tanto em número de faixas quanto em raios de curvas, não ser adequadas ao tipo de tráfego