Levantamento da empresa que administra o trânsito da capital mostra que as 175.562 infrações registradas por radares de excesso de velocidade renderam R$ 8,43 milhões, apenas no primeiro trimestre. Os números representam um aumento de 281% em autuações e de 112,8% em arrecadação, em relação ao mesmo período do ano passado, quando 55.123 infrações somaram R$ 3,91 milhões em multas.
Especialistas em transporte e trânsito, no entanto, repudiam a interferência política do Legislativo numa questão que consideram técnica.
Pelo Projeto de Lei 1.766/11, de autoria do vereador Paulinho Motorista (PSL), nenhum radar poderá ser instalado pela BHTrans sem que a empresa justifique a necessidade à Câmara Municipal, por meio de estatísticas de atropelamentos, acidentes ou fluxo intenso de veículos. “Há uma porção de radares instalados em locais onde nem cabritos passam. Isso só serve para multar”, justifica o vereador.
O presidente da comissão que avalia o transporte e trânsito na Câmara, vereador Preto, vai além. Ele quer instituir, pelo Projeto de Lei 1.757/11, regras que, na avaliação dele, tornariam os radares menos perigosos. Os instrumentos não poderiam ser implantados menos de 50 metros depois do início de uma curva, 100 metros depois de uma subida ou atrás de uma árvore – 50 metros à frente ou atrás da planta. “O motorista que ver o radar numa dessas situações pode frear e causar um acidente grave. A função do radar é educar e não machucar”, opina o parlamentar.
'Sou motorista'
Quando questionado sobre a fórmula usada para calcular as distâncias para instalação dos radares, o vereador Preto admite não ter tido nenhuma assessoria técnica ou consultoria de transporte e trânsito. “Três assessores jurídicos interpretaram as resoluções do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) e eu fui dirigindo por esses locais. Consideramos 50 metros a distância segura, de meio quarteirão, para uma freada em curva”, afirmou. “Sou motorista há 34 anos.”
Para especialistas, essas ações são interferências excessivas dos legisladores nas regras de circulação da capital. “Não se pode pôr lei para isso (instalação de radares). É questão técnica medir a aceleração, a capacidade de frenagem, perfil médio da frota, tempo de reação de motorista”, reage o engenheiro Osias Baptista Neto, consultor em transporte e trânsito.
O urbanista Manuel Teixeira, especialista em trânsito e professor de arquitetura da PUC-MG, é a favor do radar e de sua sinalização, mas avalia que a Câmara Municipal não tem capacidade para avaliar os dados compilados pela BHTrans. “É um excesso de burocracia que vai inviabilizar as ações da empresa e piorar o trânsito. Não tem sentido. Isso não cabe ao Legislativo, mas ao Executivo (prefeitura)”, opina.
Além da experiência de 22 anos como motorista, o vereador Paulinho diz que não confia na capacidade técnica da BHTrans. “A gente vê por aí pontos de ônibus em esquinas que fecham o trânsito. Pelo projeto, os técnicos vão ter de provar a necessidade do radar. E os vereadores são capacitados para avaliar essas questões dentro das comissões. É nossa obrigação fiscalizar o Executivo”, defende.
O outro projeto de lei a tramitar neste semestre é o 1.777/11, de Edinho Ribeiro (PT do B), que visa a instituir a proibição de multas de detetores de avanço de sinal entre as 23h e as 6h. A cobrança já está suspensa por decreto da prefeitura.
Estudos técnicos
Sem comentar os projetos de lei, a BHTrans afirma que, para definir a localização de radares, obedece a resolução do Contran e faz estudos técnicos, considerando o número de veículos e pedestres que passam pela via, além da velocidade permitida no local.
A empresa atribui o salto na emissão de autuações por radar de excesso de velocidade à maior precisão dos equipamentos e ao aumento no número de aparelhos – de 37, ano passado, para 50. Os recursos das multas vão, integralmente, para o Fundo de Transporte de Trânsito Urbano e são aplicados em sinalização, campanhas educativas, fiscalização e segurança no tráfego.
Além dos 50 radares de excesso de velocidade fixos e um móvel, estão espalhados pela cidade 23 detectores de avanço de sinal e quatro equipamentos para fiscalizar a invasão de faixa exclusiva para ônibus. Ainda há previsão para a operação de dois radares móveis, 17 detectores de avanço de sinal e oito radares de faixa exclusiva de coletivos. A BHTrans não tem o balanço de quantas multas por ultrapassar o sinal vermelho foram emitidas desde junho, quando os equipamentos começaram a funcionar.
Palavra de especialista
Paulo Rogério da Silva Monteiro
Mestre em engenharia de transportes pelo IME
Questão é técnica
Quando o radar é entendido como sinônimo de multa, sempre vai haver um político para defender o infrator. Antes de indústria da multa, o que há é a indústria da infração. Quem sai com o carro da garagem sabe que está sujeito a leis de trânsito. Mas o maior equívoco nessa discussão de radares ocorre porque, antes de discutir a fiscalização, é preciso discutir a regra. Antes de um estudo de onde instalar um radar é preciso uma pesquisa apurada sobre qual a velocidade adequada na via. Você não tem que proibir o radar em curva, mas avaliar qual a velocidade a ser obedecida.
Como ficou?
Multas da BHTrans
STF ainda vai julgar recurso da prefeitura
A prefeitura ainda trava na Justiça batalha para devolver blocos e canetas ao agentes da BHTrans, proibida de multar motoristas infratores desde dezembro de 2009. O recurso extraordinário entrou na fila de votações do Supremo Tribunal Federal (STF) no fim de fevereiro, sem previsão para ser apreciado. “Não temos ideia (do prazo) porque essa ação havia caído para o ministro Eros Grau, que se aposentou e demorou a ser substituído por Luiz Fux, atual relator do projeto”, afirma o procurador-geral do município, Marco Antônio de Rezende Teixeira. De acordo com entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a BHTrans não pode fiscalizar o trânsito por ser uma sociedade de economia mista que por definição da lei visa lucro. O caráter, segundo o STJ, seria incompatível com o poder de multar.