O Estado de Minas aderiu à proposta e, com a meta de fazer um test-drive nos dois sentidos da chamada Rota da Savassi, enfrentou, de bike e capacete, o trânsito da capital mineiraNos 2,8 quilômetros de pista, da Rua Professor Moraes até a Avenida dos Andradas, os obstáculos e o desrespeito chamaram a atenção, muito mais que a quantidade de ciclistasIsso na rota mais central da cidade, que, além das pedras pelo caminho, tem seu traçado em uma área dominada por veículos.
São exatamente eles que representam o principal desafio para quem pretende pedalar pela cidadeE ele começa antes mesmo de se chegar à cicloviaA experiência de pedalar por ruas e avenidas tira em parte os encantos do que é andar de bicicleta nos tempos de infância, aquela sensação de liberdade, de sentir o vento no rosto sem preocupação com o motorista mais apressado ou o motoqueiro menos educado.
Quando a intenção é usar a bike como transporte numa metrópole, é preciso administrar também sentimentos de medo e insegurançaEmbora o objetivo do poder público seja incentivar a alternativa, as ciclovias ainda são como ilhas na cidade, atendendendo um número restrito de ciclistas, ainda sem conexões entre as rotasPara chegar até elas, é preciso enfrentar o trânsito feroz de ruas e avenidas dominadas por motos, carros, ônibus e quase nenhuma bike
Não é fácil se convencer de que, como estabelece o CTB, na ausência de ciclovias, o lugar de bicicleta é na rua, na faixa da direita e no mesmo sentido dos carrosBasta seguir pela Avenida Getúlio Vargas, no Bairro Funcionários, na Região Centro-Sul de BH, para ser fechado por um ônibus e, instintivamente, buscar refúgio no passeio, junto dos pedestres“O motorista não reconhece a bicicleta como veículoÔnibus e táxis não respeitam mesmo ”, afirma a médica Vívian Andrade, de 29 anos, que desde 2008 adotou o transporte movido a pedais para ganhar agilidade no trânsito e fugir de engarrafamentos.
Alívio
Atravessar a Avenida Afonso Pena junto dos veículos significa conviver com outro incômodo: a impressão é de que não há tempo para completar a travessia antes que o sinal fecheFrente a esses contratempos, a chegada à ciclovia da Savassi, na Rua Professor Moraes, quase esquina com Avenida do Contorno, é reconfortanteO trajeto, exclusivo para ciclistas e projetado para garantir a segurança de quem optou por usar a magrela no trânsito, contempla a Avenida Bernardo Monteiro, passando pela Avenida Carandaí e Rua Piauí até chegar à Avenida dos Andradas.
A BHTrans ainda trabalha na implantação da via, prevista para ficar pronta dia 27“Estamos em obras a partir da Avenida Carandaí até a Andradas, mas, no restante, só faltam alguns detalhes de sinalização para arrumar”, diz o supervisor do programa Pedala BH, da BHTrans, Mauro Luiz de OliveiraMas o paraíso de trafegar numa área especial para bicicletas logo se desfazMesmo antes de inaugurado, o trecho está sendo invadido pelo desrespeito, que espalha pedras pelo caminho dos ciclistas.
Na Rua Professor Moraes, motoristas insistem em invadir a pista de bikes para estacionar“Tenho que deixar os pacientes na clínica e não tem lugar para parar
Mas a invasão nas ciclovias não tem sido apenas de motoristasPedestres também tomam conta do espaço e, curiosamente, transformaram trechos em pista de caminhada“Antes ia para a Praça da Liberdade, mas agora tenho caminhado por aqui”, diz o aposentado Adnylson Luiz Rocha, de 68, que não tem medo de ser atropelado por ciclistas“É muito difícil eles passarem.” Tão difícil que tem gente que até transformou a pista em área de trabalhoO trecho entre as ruas Aimorés e Timbiras exige habilidade no guidom, pois é preciso desviar de baldes e tapetes deixados no meio da ciclovia pelo lavador de carros.
Mais adiante, um obstáculo inusitadoÀs quintas-feiras, na Avenida Carandaí, é dia de feira de frutas, verduras e biscoitosA construção da pista para bicicletas não alterou a rotina dos comerciantes, que, agora, montam as barracas em cima da ciclovia“Estamos aqui há 30 anos e a prefeitura nem nos consultou”, reclama o feirante Vítor Paulo Gonçalves, de 47.
Pedalar é viável, mas não é fácil
Um dia pedalando em Belo Horizonte é suficiente para derrubar o mito de que o relevo da cidade não combina com bicicletaA marcha do veículo ajuda a amenizar o tranco da subida e há áreas menos íngremes bem adequadas à rotina sobre duas rodas, contanto que o ciclista tenha disposição e fôlegoA camisa fica suada, mas quem encara o desafio tem como recompensa os benefícios para a saúdeAfinal, além de meio de transporte, a bicicleta é exercício físico“Comecei a andar de bicicleta porque é mais rápido do que carroAlém disso, acabo relaxando e fazendo meu exercícioQuando vou trabalhar, levo uma muda de roupa na mochila”, conta a médica Vívian Andrade.
De cima de uma bicicleta, o olhar sobre Belo Horizonte se transformaA vontade de admirar as árvores se confunde com a surpresa de descobrir que a Rua Piauí é mais íngreme do que você imaginavaA todo momento, o ciclista tem que tomar decisões: escolher a rua com menos trânsito, seguir pela avenida mais plana, tudo sem esquecer as leis de trânsitoMas sobre duas rodas a gente descobre também, rapidamente, que a cidade está longe de incorporar a ideia da ciclovia.
A Região Hospitalar é um exemplo dessa descoberta“Estamos perdidos com essa cicloviaE o estacionamento?”, queixa-se Aline Alves, de 29, que toda semana leva a mãe para sessões de quimioterapia na Santa Casa de BHA Rota da Savassi, ciclovia que será inaugurada dia 27, passa bem atrás do hospital, onde hoje há vagas de estacionamento rotativoQueixas ouvidas e continuando a pedalar, foi bem perto dali que a equipe do EM também descobriu que bicicleta estraga e que, ao contrário do carro, não tem seguro que dê jeitoA solução é empurrar a magrela, que, nessas horas, já nem é tão magra assim