A comodidade em forma de ar-condicionado, acelerador e freios ABS impede os cidadãos de descobrir que cruzar Belo Horizonte a pé do Barro Preto até a área hospitalar, ambos na Região Centro-Sul, leva apenas 20 minutos e 45 segundos. Marcado no relógio, o carro gasta apenas dois minutos a menos para fazer o mesmo trajeto. As facilidades sobre quatro rodas também escondem o fato de que bastam 19 minutos e 40 segundos para caminhar do Bairro Carmo, na Zona Sul, à Praça da Liberdade, no Funcionários, também na Zona Sul, 10 minutos a mais do que os motorizados.
São observações de quem, sem apertar o passo, comparou seis percursos, todos na área central de BH e bairros próximos à Avenida do Contorno, a pé e de carro. A constatação é de que, mesmo quando o trânsito está a favor do veículo e o transforma em campeão na disputa com o pedestre, o caminhante não perde de goleada. Poucos minutos separam pedestres de motorizados quando o assunto é tempo. Mas nos quesitos saúde e colaboração com o meio ambiente, quem gasta a sola dos sapatos anda com larga vantagem.
Na ponta do lápis, o teste entre carro e o pedestre, feito pelo Estado de Minas em duas manhãs de trânsito tranquilo e ao longo de percursos próximos à Avenida do Contorno, resultou em empate, levando-se em conta apenas o tempo. É bom lembrar que no caso do trajeto sobre rodas foram considerados também os minutos gastos para estacionar legalmente o veículo em uma vaga de rotativo. Na disputa, os pontos de partida e chegada eram o mesmos. Já o trajeto era o de maior conveniência para cada participante.
O pedestre chegou mais rápido nos percursos do Bairro Floresta à Praça Sete, do Bairro de Lourdes à Praça da Estação e ao longo da Avenida Augusto de Lima, do Barro Preto ao Mercado Central. Já o carro levou a melhor nos trechos da Praça da Assembleia ao Bairro Gutierrez, do Bairro Carmo à Praça da Liberdade e da Praça Raul Soares à área hospitalar, Região Centro-Sul. Considerados os critérios gasto calórico e emissão de poluentes, a situação muda de figura. Em 9,3 quilômetros percorridos a pé, o caminhante se despediu de 495 calorias, o equivalente a quase quatro barrinhas de chocolate.
Já o motorista, praticamente em repouso, gastou somente o suficiente para trocar marchas, da primeira para a segunda, da segunda para a terceira e não mais que isso, nos 12,9 quilômetros percorridos de carro. Mas ao volante, se o corpo fica parado, a paciência é exercitada a todo momento, com as buzinas, com o velocímetro que não passa dos 35km/h, com a busca incansável pela vaga e até com o carro da frente que pifou.
O pedestre não fica imune a obstáculos, apesar de se valer da vantagem de poder cortar caminho. Calçadas esburacadas são o principal desafio, junto com as ladeiras. Nessa hora, escadas, como a da Rua dos Goitacazes, no Centro de BH, são uma ajuda e tanto. Quem está a pé também tem que ficar alerta, pois, no trânsito o pedestre muitas vezes passa despercebido aos olhos do motorista. Mesmo com as dificuldades e com um pouco de suor, há a recompensa do corpo saudável e da colaboração com o meio ambiente e com a cidade, mais próxima e interessante para quem a conhece andando.
O professor aposentado João Francisco Baeta Costa, de 78 anos, já fez a opção pelas caminhadas. Quando dava aulas na Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), no Centro, andava mais de 60 quarteirões por dia, no percurso casa–trabalho. Com 78 anos, ele diz estar em plena forma e garante que a rotina de pedestre lhe trouxe vários benefícios à saúde. "Faço exercícios físicos e mentais, além de me socializar com pessoas que encontro pelos meus trajetos. É uma bela oportunidade de observar a vida, coisa que a gente não faz dentro de um carro", diz.
Mas há quem trilhe caminho oposto ao do professor, como o engenheiro civil Arnaldo Figueiredo Júnior, de 54 anos. Morador da Serra, na Região Centro-Sul da capital, ele trabalha a quatro quarteirões de casa, mas não dispensa o carro na rotina diária. "Como tenho vaga de estacionamento no prédio onde trabalho, é uma situação de muita comodidade. Acabei adquirindo esse hábito”, diz. Ele explica que como gosta muito de esportes e pratica corrida pelo menos duas vezes por semana, uma situação acaba compensando a outra. "Minha consciência não pesa tanto, por esse motivo", resume.
Meios de transporte na linha de largada
Está lançado o desafio. Carros, motos, bicicletas, ônibus, pedestres e o metrô vão travar, na próxima terça-feira, uma disputa para atestar qual desses meios de transporte é o mais viável em um percurso de 12 quilômetros, da Praça Coração Eucarístico, no bairro de mesmo nome, na Região Noroeste de BH, à Praça da Liberdade, no Bairro Funcionários, Região Centro-Sul. A atividade faz parte das comemorações do Dia Mundial sem Carro, na próxima quinta-feira.
A iniciativa pretende incentivar a adoção de meios alternativos ao automóvel como forma de transporte, observando questões como poluição, saúde, interação com a cidade e também tempo de deslocamento. O coordenador do grupo de ciclistas Mountain Bike BH, Humberto Guerra, um dos organizadores do desafio, afirma que a partir dos relatórios gerados desde 2007, a cada ano o carro gasta mais tempo no trajeto.
"Em 2007, foram 44 minutos. No ano seguinte o tempo aumentou para 52 minutos, e em 2009 o cronômetro registrou uma hora e dois minutos. Em 2010, as condições de tráfego estavam excepcionalmente boas e o tempo gasto foi de apenas 32 minutos. Mas o que observamos é que, cada vez mais, o carro fica refém das condições de tráfego, uma vez que há cada vez mais veículos nas ruas", diz Humberto.
No ano passado, o vencedor do desafio foi a bicicleta, contando quesitos como tempo, custo, gasto de energia, velocidade média e emissão de poluentes. O desempenho nas bikes foi dividido entre masculino, feminino e atleta, sendo que esse último teve melhor performance em todos os aspectos. Quem tiver interesse em ser um dos voluntários do desafio dos meios de transporte pode enviar e-mail para contato@mountainbikebh.com.br.