A cerveja nos botecos de Belo Horizonte passou a ser servida junto de protestoUm abaixo-assinado contra o rigor da Lei do Silêncio está circulando em cerca de 400 bares e restaurantes da capital com objetivo de mobilizar a sociedade em defesa desses estabelecimentosO movimento, organizado pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Minas Gerais (Abrasel), busca principalmente mudar a legislação que regula a emissão de ruídos, extremamente restritiva, na avaliação de empresários do ramoAo lado das casas de show, o setor somam 55% das reclamações do Disque-Sossego, serviço da prefeitura que atende denúncias relativas à poluição sonora, de acordo com levantamento da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA).
A principal crítica da Abrasel é em relação ao limite de 45 decibéis permitidos entre a meia-noite e as 7h, “um limite inexequível” para o presidente da entidade, Fernando JúniorAs assinaturas de frequentadores, recolhidas nos estabelecimentos, serão apresentadas em audiência pública sobre o assunto, no fim deste mês na Câmara Municipal“A intensificação da Lei do Silêncio é uma preocupaçãoUma cidade que, por natureza, é de botecos, não pode ter limites de 45dBEsse não é o barulho do bar, mas sim o som natural da ruaVamos reunir milhares de assinaturas e mostrar que a população belo-horizontina está favorável aos bares”, afirma, ressaltando que o setor conta com 12 mil pontos de venda e fatura mais de R$ 100 milhões por mês.
Para contestar o limite de 45 decibéis, Fernando Júnior se embasa em estudo de técnicos da prefeitura, divulgado nessa sexta-feira pelo Estado de Minas, que mostra que a partir da meia-noite a estimativa é de que 86% do território de BH registre ruído acima do permitidoA organização do setor é uma reação à recomendação do Ministério Público (MP) estadual feita à prefeitura pedindo pulso firme no combate ao barulho, com aplicação mais rigorosa da Lei do Silêncio (nº9.505/2008)A cobrança exige a adoção de medidas punitivas para quem desrespeita o sossego já previstas na legislação, mas que segundo o promotor Cristovam Joaquim Fernandes Ramos Filho, autor da ação, não são aplicadas pelo poder público.
Entre as medidas previstas estão a restrição do horário de funcionamento, isolamento acústico, limitação do uso de mesas e cadeiras nas calçadas, oferecimento de estacionamento coberto e até a contratação de funcionário para controlar o volume da conversa dos clientes
Adeptos
Em menos de 24 horas, o dono do Barbazul, José Márcio Ferreira, no Bairro Funcionários, adepto da campanha, conseguiu recolher mais de 200 assinaturas de clientes“Acho que a prefeitura teria de fazer um zoneamento da cidade e, a partir daí, estabelecer os limites de ruído Do jeito que está, é muito radical”, defendeAmante de uma cerveja gelada, o operador de bolsa de valores Cláudio de Borba Vieira, de 40 anos, assina embaixo, literalmente“Moro perto de um bar e acho que os moradores também têm que aceitarÉ preciso haver uma harmonia”, afirma, reconhecendo também que o volume da voz acompanha o do álcool.
O coordenador do laboratório de acústica e dinâmica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marco Antônio Vecci, também acredita ser necessária uma adaptação da legislação de acordo com o zoneamento “Acho que a lei é muito permissiva durante o dia, e à noite, em alguns locais, muito restritivaEla não faz uma distinção se o local da medição está ao lado da Avenida Amazonas ou na tranquilidade do Bairro Mangabeiras (Região Centro-Sul)Na maior parte do país, o zoneamento é considerado”, afirma o pesquisador, que esclarece o que é um som de 45dB
Palavra de especialista
Bruno de Castro
Vice-presidente da Sociedade Mineira de Otorrinolaringologia
Risco de perda auditiva
O grande problema envolvido no volume do som é que ele envolve uma progressão geométricaSe um determinado ruído passa de 45 para 50 decibéis (dB), sofre um aumento absurdoAlém disso, 45dB em um quarto fechado têm a intensidade diferente de um ambiente abertoA reação ao som também é muito relativa de pessoa para pessoaDe modo geral, a partir de 85dB, durante exposição de oito horas, já há perda auditiva, com lesão irreversível da célula nervosaSe o volume aumenta para 95dB, o limite de exposição passa a ser de quatro horasSe o volume aumenta para 105dB, a exposição máxima é de duas horas, e assim por diante.
>> Barulho no Brasil
Como funciona o controle dos ruídos em algumas capitais
BELO HORIZONTE
Das 7h às 19h 70 dB
Das 19h às 22h 60 dB
Das 22h às 7h 50 dB até as 23h59, e depois desse horário, 45 dB
Sextas-feiras, sábados e vésperas de feriados: até as 23h 60 dB
Próximo a escolas, creches, bibliotecas, cemitérios, hospitais,
ambulatórios, casas de saúde ou similar:
Das 7h às 19h 55 dB
Das 19h às 22h 50 dB
Das 22h às 7h 45 dB
Rio de Janeiro
Estabelecimentos recreativos, de educação, filantrópicos, templos religiosos, indústrias, comércios e casas com música ao vivo são obrigadas a ter isolamento acústico
Uso Dia (7h às 22h) Noite (22h às 7h)
Zonas agrícolas e de preservação ambiental 45dB 40dB
Residencial urbano 55dB 50dB
Zonas de negócios, comércio e administração 65dB 60dB
Área predominantemente industrial 70dB 75dB
Salvador
Em ambientes externos, o máximo de ruído permitido é:
Das 22h às 7h 60 dB
Das 7h às 22h 70 dB
Em ambientes internos, os limites passam para:
Das 22h às 7h 55 dB
Das 7h às 22h 60 dB
Brasília
Uso Dia (7h às 22h) Noite (22h às 7h)
Zonas hospitalares 50dB 45dB
Zona residencial urbana 55dB 50dB
Área mista, com vocação comercial e administrativa 60dB 55dB
Área mista, com vocação recreativa 65dB 55dB
São Paulo
Para funcionar depois da 1h, bares e restaurantes devem ter isolamento acústico, estacionamento e segurança
Uso Dia (7h às 22h) Noite (22h às 7h)
Zonas residenciais 50dB 45dB
Zonas mistas entre 55dB e 65dB (dependendo da região) entre 45dB e 55dB
Zonas industriais entre 65dB e 70dB entre 55dB e 60dB