Considerado o maior atrativo para a multidão que se reúne na Rua Guajajaras, no Centro de Belo Horizonte, o Bar Avião em Queda teve o alvará de localização e funcionamento anulado pela prefeitura, sendo obrigado a fechar as portas. O boteco foi apontado, em março, como pivô da liminar que obrigou sete bares da rua a encerrar as atividades às 22h, às quintas e sextas-feiras, tamanho o incômodo para moradores. A prefeitura não confirma o motivo da anulação do alvará do bar, sob a justificativa de que o sistema estava fora do ar nessa segunda-feira. O dono do estabelecimento, Cláudio Johsom Talini dos Santos, que soube da decisão pelo Estado de Minas, desconfia que ela esteja relacionada ao barulho.
A gerente de monitoramento da Secretaria Municipal Adjunta de Fiscalização, Raquel Guimarães, explica que a discrepância entre as diligências, autuações e multas é explicado pelo fato de nem sempre o fiscal encontrar irregularidade. “O profissional só vai notificar quando medir ruídos acima do permitido. Além disso, um estabelecimento é interditado quando há reincidência em uma determinada infração”, afirma, sem detalhar os motivos da anulação do alvará do bar Avião em Queda.
Ela lembra que com o projeto de integrar cinco áreas de fiscalização da prefeitura, entre elas a de controle ambiental, em tramitação na Câmara Municipal, a ideia é “otimizar os recursos humanos”. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA), que cuida da aplicação da Lei do Silêncio e foi responsável pela abertura do processo contra o Avião em Queda, informou que, como o sistema estava fora do ar nessa segunda-feira, não seria possível informar as razões para a decisão.
Não é a primeira vez que o estabelecimento, que oferece cardápio com preços convidativos – cerveja a R$ 2, caipirinha a R$ 3 –, tem problemas com o alvará. Em 2009, o documento foi cassado pela prefeitura e, por um ano, o bar funcionou por força de liminar. Apesar de o estabelecimento ter multas por uso irregular de mesas e cadeiras nas calçadas, o dono acredita que a reclamação em relação ao barulho tenha sido o motivo da anulação. “Já tive que fechar outros bares por causa disso, mas vou recorrer”, conta Talini, que nessa segunda-feira já não abriu as portas por orientação do advogado. Apesar das restrições de horário, ele assume que os frequentadores ainda se aglomeram até a metade do asfalto da rua. “Depois das 22h vai todo mundo embora.”
Alívio
Independentemente do motivo do fechamento, a medida trouxe alívio para moradores da Rua Guajajaras e a esperança, entre donos dos outros bares, para que o Ministério Público reveja a posição da restrição de horário para estabelecimentos da rua. Ainda vigente, a decisão levou em conta problemas como som alto, drogas e sexo explícito, denunciados pelo MP estadual. “Quem trouxe uma multidão para cá foi o Avião em Queda, que vendia cerveja a R$ 2 e churrasquinho a R$ 2. Nossos clientes passaram a não vir mais aqui. Nossa única esperança é que, agora, o MP nos chame para fazer um outro acordo”, afirma o dono de um dos bares da Guajajaras José Eustáquio de Jesus.
Para o estudante André Batista, de 23 anos, morador de prédio em frente ao bar, a restrição do horário dos bares deu sossego à vizinhança, mas, com o fechamento do Avião em Queda, cujo nome fantasia é Balaio de Gato, a tendência é só melhorar. “A confusão começou há três anos com a abertura do Balaio de Gato. Era impossível querer estudar em casa à noite. Ficávamos com vergonha de trazer visitas em casa, pois não sabíamos o que iríamos encontrar na porta de casa”, afirma.
Segundo o promotor de Justiça de Defesa do Meio Ambiente, Habitação e Urbanismo Cristovam Joaquim Fernandes Ramos Filho, nova medida em relação à Rua Guajajaras só será adotada se apurado que o bar fechado é o único responsável pelo tumulto. “Vamos acompanhar, mas já sabemos de outros bares que têm vendido cerveja em lata, no balde, o que leva à concentração de pessoas nas calçadas”, afirma.
Associação pede lei mais branda
A Câmara Municipal de Belo Horizonte organiza seminário para discutir a Lei do Silêncio, mesas e cadeiras nas calçadas e outros problemas envolvendo bares e restaurantes em BH. O evento partiu de reivindicação da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Minas Gerais (Abrasel-MG), empenhada em, principalmente, mudar a legislação de controle de ruídos, extremamente restritiva na avaliação de empresários do ramo. Nessa segunda-feira, em reunião com oito vereadores, representantes da entidade entregaram abaixo-assinado com 5 mil assinaturas recolhidas entre quinta-feira e domingo contra a aplicação rígida da legislação que impõe limite de 45 decibéis a emissão de ruídos na madrugada.
O vereador Léo Burguês (PSDB), presidente da Câmara, já informou que apresentará projeto prevendo mudanças na Lei do Silêncio (nº9.505/2008). “Vamos propor que o fiscal desconsidere o valor do ruído de fundo (barulho natural da rua) durante a medição. Muitas vezes o problema é o trânsito e a prefeitura culpa o bar”, afirma o parlamentar, informando que o seminário ocorrerá na primeira semana de novembro. O projeto de lei é resultado das reivindicações dos empresários.
A Abrasel informa que, além de se posicionar em relação às leis que recaem sobre o setor, também apresentou na reunião a campanha educativa Boa Noite Lourdes, com foco no bairro da Região Centro-Sul. De forma bem-humorada, em placas e bolachas de chope, a campanha mostra como se comportar no bar sem incomodar os vizinhos. A campanha conta com a parceria da Associação dos Moradores do Bairro de Lourdes (Amalou).
PALAVRA DE ESPECIALISTA
Os erros da legislação
“A lei municipal de controle de ruídos deveria seguir a lei federal. A legislação de BH tirou os parâmetros relacionados ao zoneamento e tratou todo mundo de uma forma só. O primeiro erro foi estabelecer o limite de 70 decibéis (dB) para o período das 7h às 19h na cidade inteira, barulho correspondente à área industrial. Se na rua o ruído é de 70 dB, a estimativa é que, em casa, as pessoas tenham que conviver com ruído de 80, 85dB. Para quem escuta, a impressão, com o aumento de 10dB, é que o som ficou duas vezes mais forte. De imediato, isso traz problemas de comunicação e irritação aos cidadãos. Há uma perda em qualidade de vida.”