A saída para fugir do transporte coletivo lotado e prestado de forma ineficiente tem se transformado em aventura perigosa para moradores da Região Metropolitana de Belo Horizonte e em uma epidemia que ameaça fugir ao controle da fiscalização. De olho no relógio, com o corpo cansado depois do trabalho e se espremendo em pontos cheios, passageiros têm cada vez mais se arriscado no serviço clandestino. Responsável por tentar conter o sistema irregular, o Departamento de Estradas de Rodagem de Minas Gerais (DER-MG) reconhece que os perueiros movimentam diariamente meio milhão de reais na Grande BH e cidades vizinhas.
Eles atuam com desenvoltura em 22 corredores já mapeados pelo departamento, levando cerca de 14 mil passageiros por dia, em uma frota que já se iguala em números à do transporte legalizado: são 3 mil veículos regulares para o mesmo número estimado de perueiros que atuam entre os 34 municípios da Grande BH. Também expulsos pelas deficiências do serviço oficial, multiplicam-se aqueles que optam por se deslocar em motos, seja como pilotos e garupas, seja como contratantes de um serviço que é proibido na capital.
No caso dos perueiros, entre as rotas clandestinas mais movimentadas destacam-se as que ligam a capital a Betim, Contagem, Ribeirão das Neves, Vespasiano, Sabará, Ibirité e Nova Lima. Mas também não faltam clientes para cidades fora da Grande BH. Passageiros que partem para Sete Lagoas, por exemplo, encontram um serviço organizado na Rua Guarani, cujos prestadores não fazem questão de se disfarçar. A explicação para o crescimento do sistema está estampada no rosto dos que aceitam se arriscar em um meio de transporte clandestino, sem seguro e muitas vezes sem manutenção. “Quero chegar em casa mais cedo e ter a garantia de que vou poder ir sentado. Depois de um longo dia de trabalho, não dá para ficar até 40 minutos ou uma hora esperando ônibus”, conta o operador de câmara fria Dirceu José Soares, de 40 anos, enquanto aguarda na BR-040 uma van que o leve para o Bairro Florença, em Ribeirão das Neves.
Custo-benefício Os irmãos Jeivisson Leonardo de Jesus Vieira, de 22, vendedor, e o carregador Jorge Leandro Vieira, de 17, também fizeram das vans clandestinas o meio de transporte entre a casa, em Esmeraldas, e o trabalho, em Contagem. “De ônibus, a viagem dura meia hora. De van, a metade. Às vezes, a van para na blitz e a gente tem que descer e seguir viagem de ônibus. Também sei que tem risco, porque em caso de acidente os passageiros não estão segurados. Ainda assim, prefiro ir de van”, admite Jeivisson. O rapaz até fez os cálculos e conta que tem planos de se tornar perueiro. “Se fizer seis viagens por dia entre meu bairro e meu trabalho, consigo tirar pelo menos R$ 3 mil por mês. Isso é mais que três vezes meu salário. Estou economizando para comprar um carro e começar a fazer a rota”, revela.
Mas o negócio que atrai cada vez mais passageiros pode ser uma armadilha. É o que alerta o diretor de Fiscalização do DER, João Afonso Baeta Costa Machado. “Nas blitzes, identificamos casos de motoristas sem habilitação, com documento irregular do carro, dirigindo embriagados ou depois de usar drogas. São muitos os desvios de conduta e o risco é muito grande. Apesar de saber das deficiências do transporte regular, a viagem no clandestino é muito arriscada”, afirma. Ele convoca os cidadãos que tenham reclamações sobre o transporte coletivo a fazê-las pelo telefone 155 (opção 6). “O retorno é dado em até 48 horas”, garante. Segundo o diretor, cerca de 15 mil blitzes foram feitas em Minas Gerais só neste ano. Dessas, 30% foram na Grande BH. A multa administrativa para quem é flagrado no transporte clandestino é de R$ 1.090, além da apreensão do veículo.
Ainda assim, o esquema dos perueiros consegue burlar a fiscalização. Na estação Eldorado do metrô, por exemplo, laçadores buscam pessoas que vão para Betim ou Igarapé e as levam a um estacionamento ao lado das plataformas de ônibus, sem nenhum disfarce. Ontem, localizados em pontos estratégicos, os perueiros identificaram a equipe do Estado de Minas e, por celular, alertaram colegas sobre a presença da reportagem. Desconfiados, intimidaram os passageiros para impedir que dessem depoimentos.