Do dia da detenção – 28 de março de 2011 – até hoje, Antônia narra uma via crucis para proteger o filhoDepois de tentar afastá-lo das más influências de colegas – chamados por ela de “inimigos” –, de ajudá-lo a se interessar novamente pelos estudos e de guiá-lo pelo caminho da religião, a cozinheira finalmente teve a alegria de ver o jovem se formar, na semana passada, no Programa Oportunidade Legal (Olé/BH Digital), que desde 2009 oferece cursos de informática a jovens encaminhados pela Vara Infracional da Infância e da Juventude de Belo Horizonte“Acredito que hoje ele está recuperado e tem um futuro maravilhoso pela frenteO mérito é dele, mas a vitória é minha”, desabafa Antônia, durante cerimônia no Centro Mineiro de Referência em Resíduos.
Mas, mesmo em meio às comemorações pelo resgate do filho, a cozinheira não esconde aflições típicas do coração de mãe
“O desejo de consumo é um ponto forte, pois o capitalismo acentua ícones e marcas e o adolescente precisa desses objetos para sentir que pertence a um determinado grupoA pobreza também é fator de vulnerabilidadeOutro traço recorrente é a ausência do pai ou de uma figura paterna em quem o jovem se espelhariaMas também há casos em que pesam os conflitos familiares, quando os pais têm dificuldade de impor hierarquia e as relações deixam de ser verticais e acabam sendo horizontalizadas, ou seja, de igual para igual”, explica Cristina.
A juíza da Vara Infracional da Infância e da Juventude de BH, Valéria Rodrigues, reconhece o peso de todos esses fatores na formação do caráter do adolescente, mas afirma que cerca de 20% dos menores apreendidos na capital estão no crime por opção“Pobreza, falta de emprego, deficiências da escola e problemas familiares são fatores que contribuem para a vulnerabilidade e são usados como justificativaMas não se pode esquecer da personalidade do sujeito ao lidar com as adversidades da vidaMuitos não conseguem se adequar aos valores da sociedade e passam a não tolerar cobranças de um comportamento padrão”, analisa a juíza.
Depoimento
Nas unidades de internação de Minas, são muitas as histórias em que os fatores de risco se misturam e levam a relatos de cenas estarrecedoras“Meus amigos zombavam de mim, dizendo que eu só usava roupa velha e rasgada
Sem demonstrar nenhum arrependimento, o adolescente fala com frieza dos crimes que comete desde os 8 anos“Nunca roubei de trabalhador, só de ‘filhinho de papai’ que ganhou tudo de mão beijadaTambém já dei uma surra e ‘passei fogo’ numa mulher que ficou devendo na minha boca de fumo, mas tudo sem intenção de matarAgora a polícia me pegou e estou preso num alojamento com mais seteMas, se alguém acha que é a cadeia que vai consertar minha vida, está muito enganado”, avisa