Jornal Estado de Minas

Confira alguns relatos de meninos de rua

Flávia Ayer
De vítima a infrator

A perda da mãe aos 8 anos foi o primeiro revés na vida de Caio (nome fictício)
Em conflito com o pai, o garoto buscou consolo nas ruasAos 9 anos teve o primeiro encontro com solventesDepois vieram a maconha e o crackO vício se instalou rápidoPara mantê-lo, Caio não mediu consequênciasRoubou, ameaçou, empunhou armas e acabou envolvido com traficantesEm 20 de agosto, com 14 anos, foi apreendido pela sexta vez em uma operação policial, com um revólver calibre 38, uma moto roubada, dezenas de buchas de maconha e R$ 1,8 mil em dinheiro.

“Meu pai tentou me levar para o interior, onde ele trabalha numa fazenda de gadoMas eu queria mais que ser só vaqueiroSonhava com vida de ‘boy’ e achei que ia ser fácil chegar lá com a droga”, conta, detido numa unidade de internação provisória de Belo HorizonteRevoltado com a detenção, se diz arrependido
“É uma torturaNesse calor, não é fácil ficar num alojamento abafadoQuero sair logo daqui e tentar mudar de vida, porque droga não salva ninguém.” (GT)

De cidadão a vítima

Dezenove horas da última sexta-feiraEstava prestes a atravessar a Rua Santa Rita Durão, na esquina com a Avenida Getúlio Vargas, no Bairro Funcionários, Região Centro-Sul de BH, quando uma mão pequena tocou minha orelhaMas não havia nada de afeto no atoUm grupo de cinco crianças acabava de levar meu celular, meu brinco e de me transformar em mais uma vítima da criminalidade infantilCom a ajuda de um motociclista e um policial, dois meninos foram detidos, sem o aparelhoNaquela hora, eles já não eram mais infratores: eram crianças chorosas, suplicando por liberdade.

Eu, cara a cara com eles, me tornava juíza do destino de Samuel e Pedro, de 10 e 11 anosRegistrar ou não a ocorrência? O policial, diante do que já era meu choro, junto com o dos meninos, pedia definiçãoEnquanto isso, os pequenos, moradores de aglomerados, contaram estar fora da escola, ter família desestruturada e juravam não voltar mais para a rua se fossem soltos
Achei que libertando-os eu não os ajudariaAutorizei o militar a levar os dois para o Conselho Tutelar e segui para registrar a ocorrência, acompanhada de uma incômoda dúvida sobre quem era a vítima, realmente