Jornal Estado de Minas

Pais devem pagar pensão desde a gravidez

Sandra Kiefer
Se engravidar uma mulher, o homem está obrigado a pagar pensão alimentícia antes mesmo de o filho nascer, ainda na barriga
O suposto pai da criança tem até 72 horas para cumprir a determinação judicialCaso se recuse, o devedor está sujeito a pena de prisão por até 90 diasA tese da exigência do pagamento da pensão por alimentos no período de gestação foi defendida por Raduan Miguel Filho, desembargador em Rondônia e vice-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), durante o VIII Congresso Brasileiro de Direito de Família, que se encerra hoje no Minascentro, em Belo Horizonte.

Mas como comprovar a paternidade se o filho ainda nem veio ao mundo? Na opinião do desembargador, esse é o maior avanço da Lei 11.804, chamada de Lei de Alimentos Gravídicos, de 2008“A nova legislação não exige prova, mas apenas indícios da paternidade”, explicaIsso significa que, diante do juiz, a gestante terá de declarar o nome verdadeiro do pai da criança e reunir indícios de provas, como bilhetes e e-mails trocados entre o casal e o testemunho de amigos que presenciaram as juras de amor dos namorados“O juiz precisa ser convencido para não cometer injustiça”, completa.

Em pedidos de alimentos na gestação, o juiz tem prazo inferior a nove meses, por motivos óbvios, para gerar a sentençaSegundo Raduan Filho, os juízes das varas de família estão orientados a abreviar o procedimento, despachando em 48 horas ou, no máximo, em 72 horas.

ALIMENTOS

É o juiz quem fixa o valor a ser pago, calculado com base na condição social da mãe e do paiO magistrado lembra ainda que a finalidade da lei é amparar a mãe financeira e moralmente, durante o período de gestação, e não enriquecer a gestante“Caso o namorado não tenha onde cair morto, a responsabilidade recai sobre os avós, que passam a responder pela ação de alimentos avoengos (palavra derivada de avó ou avô)”, completa.

“Uma mulher não vai ficar rica porque engravidouEla vai receber o valor necessário para cuidar das suas necessidades morais e materiais, que, em última instância, vão atingir o fim desejado, que é a proteção do filho”, afirma o juiz, lembrando o direito a acompanhamento no pré-natal e parto por meio de plano de saúde e não do SUS.

Em alguma medida, a lei é machista ao punir o homem? “Sem dúvida, a mulher pode ser levada a entrar em um relacionamento fugaz, leviano
Na prática, porém, na cultura brasileira o maior responsável ou, no caso irresponsável por engravidar a mulher e não assumir o filho continua sendo o homemO objetivo dessa lei é ensejar o amadurecimento da sociedade para o ato da gravidez, que não é só o deleite da mãe e do pai, mas está gerando uma pessoa que vem ao mundo sem ter culpa de nada”, compara.

Entrevista

Rodrigo da Cunha Pereira, coordenador-geral do congresso

(Fotos: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press )
“Novas estruturas de família estão em curso”

A família basileira nunca teve tanta importância como agora, segundo o advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e coordenador-geral do congressoEle revela as novas configurações familiares da atualidade no encontro que termina hoje em BH.

Qual é o principal desafio do direito de família na atualidade?

A procura de um novo conceito de famíliaAntigamente era claro que família era pai, mãe e filhos, casados no religioso e vivendo felizesEsse modelo ainda existe, mas hoje não é únicoNovas estruturas de família estão em cursoO que não quer dizer que a família está em decadênciaPelo contrárioO que existe são novas configurações familiares.

Como fica o direito diante desta família em transição?

O direito precisa dar resposta e proteção às novas famílias, que são muitas, como aquelas constituídas por pessoas do mesmo sexoO discurso moral e religioso sempre norteou o direito de família
Agora que começou a se tornar politicamente correta a aceitação da sexualidade diferente das tradicionais, os tribunais superiores já têm aceitado a adoção por casais homoafetivosO termo foi criado pelo IBDFAM.

O que está saindo de novidade no congresso?

Falamos da família conjugal, que são pares como marido e mulher, dois homens ou duas mulheresNa outra vertente da família, estão os filhos que formam a família parental, já que o cônjuge não é parente do outroEntão ampliamos o parentesco criando o termo da parentalidade sócio-afetiva, que é a consideração de que maternidade e paternidade são funções exercidasEntão, se você descobrir que o pai que você sempre teve não é o seu pai biológico, seja porque você foi trocada na maternidade ou porque você foi adotada, ele não vai deixar de ser seu pai sócio-afetivo e isso gera direitosMesmo que quisesse, ele não poderia tirar o seu nome da certidão de nascimento nem excluí-lo dos bens a ser deixados como herança.

Por que o uso do termo afetivo?

O IBDFAM trouxe o afeto para o centro da família e da cena jurídicaÉ o afeto que faz compreender a nova família e não a sua representação social que tanto pode ser a família ‘margarina’ da TV, com o pai, a mãe e os filhos, ou ter dois pais ou trazer filhos de outros casamentosO afeto se tornou o principal valor jurídico da última década e gera direitos e obrigaçõesA nova família nunca teve tanta importância como agoraA grande revolução da atualidade é que ninguém mais morre pela pátria ou levanta a bandeira da direita ou da esquerda, mas se engaja em movimentos que querem deixar um mundo melhor para os seus filhos(