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Estado de Minas

Orçamento Participativo Digital reflete insegurança de moradores em BH

Até o fim da tarde de ontem, 22% dos 57.863 votos eram direcionados a câmeras de vigilância. A recuperação de áreas violentas também tinha votação expressiva


postado em 10/12/2011 07:21 / atualizado em 10/12/2011 07:55

O medo de que sua banca de jornais seja arrombada pela terceira vez neste ano trouxe muitas noites de insônia para Leda Lúcia de Paula, de 37 anos, e seu marido. Entre um cochilo e outro, eles se revezam na janela de casa, de onde avistam se o estabelecimento ainda está inteiro. Durante a noite, a banca de metal, numa das praças do Complexo da Lagoinha, ao largo da Rua Itapecerica, na Região Noroeste de Belo Horizonte, é tomada por usuários de crack, traficantes, moradores de rua e assaltantes.

“Quando meu marido vai trabalhar, às 5h, e ainda está escuro, o perigo é o de ser roubado”, reclama Leda. O tormento dos furtos e roubos a comércios e a moradores de várias regiões da capital mineira tem refletido no comportamento nas urnas virtuais do Orçamento Participativo (OP) Digital 2011. A preocupação com melhorias na segurança pública, seja por meio de serviços de videomonitoramento ou revitalização de espaços marginalizados, são destaque no pleito, que encerrará o recebimento de votos às 23h59 de amanhã.

Dos 57.863 votos recebidos até o fim da tarde de ontem, para todas as 36 obras que podem ser votadas dentro das nove regionais administrativas da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), 12.537 (22%) eram direcionados à câmeras de vigilância. O desejo por esse tipo de monitoramento já está em primeiro lugar nas regionais Centro-Sul e Nordeste e também aparece com votações expressivas nas outras sete regionais. A revitalização de espaços que se tornaram redutos de marginais, como o Complexo da Lagoinha e o Viaduto Santa Tereza (Centro-Sul), também estão entre as obras mais votadas .

De acordo com a gerente do OP Digital, da Secretaria Municipal de Planejamento, Verônica Campos Sales, a temática da segurança pública apareceu mais latente nesta edição e é fruto de reivindicações de moradores e associações locais e comerciais. “No OP passado (2008) as obras viárias tiveram maior destaque. Apenas a revitalização da Praça Raul Soares (Centro) foi motivada pela violência e a criminalidade do local. E o resultado foi bom. Ela hoje é frequentada pelos cidadãos para passeios e diversão”, afirma.

Degradação Na Regional Noroeste, a revitalização do Complexo da Lagoinha lidera o pleito, com 36% dos votos. A região já concentra 66 câmeras operadas pelo 34º Batalhão da Polícia Militar em locais estratégicos como a favela Pedreira Prado Lopes. “A Lagoinha está insuportável. Quem não é de lá, evita parar ou passar no meio daquela degradação. Quem mora lá, como eu, enfrenta o problema ou se esconde”, desabafa o servidor público aposentado Pedro Sérgio Lozar, de 73 anos, que ontem votou numa das barracas do OP Digital montada na Praça 7.

Basta uma rápida volta pelas ruas candidatas, como a Bonfim, Itapecerica e Além Paraíba, para ver que a deterioração está em todas as partes. Nos jardins, plantas ornamentais, mesmo com espinhos, são usadas como abrigo pela população que consome crack. Tijolos do calçamento são empilhados e se transformam em fogareiros. Sem banheiros públicos, a escadaria das passarelas, as esquinas, os muros das casas e do comércio acabam servindo de depósito para dejetos.

Por mais que a Polícia Militar seja vista em patrulhas pelo Viaduto Santa Tereza, um dos símbolos mais representativos de Belo Horizonte, o local continua degradado. É difícil resistir ao cheiro forte nas quatro escadarias em espiral que ligam a ponte viária aos caminhos abertos para a Avenida dos Andradas e o Bairro Floresta. Esses acessos a pedestres foram transformados em banheiros pela população de rua.

De acordo com a Secretaria de Estado de Defesa Social de Minas Gerais, a redução de crimes contra o patrimônio é reduzida em até 40% nas áreas que estão sob monitoramento das câmeras do Programa Olho Vivo. Belo Horizonte tem 169 equipamentos. Para a Copa do Mundo, está prevista a instalação de 150 câmeras no percurso para os aeroportos de Confins e Pampulha, para os estádios Mineirão e Independência e locais onde as delegações estiverem hospedadas.


Votação aquém da expectativa

Mesmo com o aumento do acesso à internet, a adesão ao Orçamento Participativo (OP) Digital tem caído em Belo Horizonte. Há dois dias do fim do pleito virtual, menos de 58 mil pessoas escolheram projetos que consideram importantes para a cidade. Nas outras edições, de 2008 e 2006, a presença foi maior, ainda que houvesse o voto por telefone e presencial, chegando a 124 mil e 503 mil votos, respectivamente. Gente insatisfeita e confusa podia ser encontrada em várias partes da cidade.

Como o aposentado Célio Vasconcelos, que se diz decepcionado com a eleição. Em 2008, pela primeira vez, ele votou numa obra, a de restauro da Praça São Vicente, no Bairro Alípio de Melo, Região Noroeste de Belo Horizonte, mas até hoje a benfeitoria não saiu do papel. “Como é que podem colocar uma obra para ser votada se ela depois não é realizada”, reclama. Um dos técnicos da PBH presentes na barraca de votação da Praça Sete tentou explicar ao senhor que a intervenção precisa ainda de autorização do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte (Dnit), por interferir num trecho de domínio federal. “Ainda assim, não aceito. Estou muito decepcionado e não quero mais saber de votar”, afirmou.

CrÍtica Passeando com seu cão pelo degradado Viaduto Santa Tereza, a historiadora Luciana Alvim se disse decepcionada com a escolha das obras e ações por não terem contemplado a fração mais fragilizada da sociedade belo-horizontina, como os moradores de rua e idosos. “Nós não precisamos de praças e monumentos na Região Centro-Sul. O IPTU aqui já é caro o suficiente para que a PBH faça essas obras naturalmente. O que precisamos é de asilos para os idosos e acolhimento para quem não tem casa e vive na rua, muitas vezes, crianças”, disse.

Outros concordam com o método e gostaram das obras incluídas. “Caminho na Avenida dos Andradas e acho que ela merece ser revitalizada, ganhar iluminação e mais segurança para as pessoas que se exercitam lá”, cobra a estudante Ana Luiza Antunes, de 19 anos, que votou pela primeira vez. A amiga dela, Ana Raquel Duarte, também estudante e de mesma idade, marcou seu primeiro voto na melhoria das calçadas do Centro. (MP)


MEMÓRIA
Projeto foi lançado em 2006
O Orçamento Participativo (OP) Digital da Prefeitura de Belo Horizonte começou em 2006, quando foram aprovados dez projetos para a cidade, por meio da internet, todos eles concluídos. Foram 503.266 mil votos digitais e presenciais. Na edição do OP de 2008, mais uma vez dez projetos foram votados, mas apenas nove concluídos. Foram colocadas em votação cinco grandes obras viárias com custo estimado de até R$ 50 milhões para a execução, o que significou 147% de aumento em relação ao OP 2006. Os votos puderam ser computados também pelo telefone, o que possibilitou a participação de milhares de cidadãos que não tinham acesso à internet. Foram disponibilizados 270 pontos de inclusão digital em toda a cidade. A última edição do OP Digital contou com a participação de 124 mil cidadãos.


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