O maior desastre geológico dos últimos 30 anos. Assim foi definido por especialistas o deslizamento que soterrou duas casas e parte do Terminal Rodoviário de Ouro Preto, na Região Central, e deixou pelo menos uma pessoa morta na madrugada dessa terça-feira. Cerca de 30 mil metros cúbicos de cobertura do solo, vegetação e do material rochoso conhecido como itabirito deslizaram da encosta conhecida como Serra de Ouro Preto, causando destruição no Bairro São Francisco de Paula. Bombeiros retiraram o corpo do taxista Juliano Alves, de 28 anos, de dentro do táxi, depois de 18 horas de trabalho nos escombros. Segundo um vigia que estava na rodoviária, havia outro taxista no local e por isso os trabalhos continuam. Mas, apesar do risco e de um mapeamento que alertava para o perigo de desmoronamento, nenhuma providência foi tomada no local para evitar a tragédia. Minas tem 53 municípios em estado de emergência.
São cinco mortes no estado desde outubro, em decorrência das chuvas, segundo a Defesa Civil estadual. Ontem, um homem foi arrastado pela correnteza em Guidoval, na Zona da Mata, e é considerado desaparecida. Em 11 de outubro, um motoboy morreu eletrocutado depois de um temporal em Belo Horizonte, mas a morte não consta do balanço da Defesa Civil.
O irmão de Juliano, o pedreiro Jorge Alves Filho, de 30 anos, ficou muito abatido. Ele informou que morava com o taxista. “Ele tomou banho e saiu para o serviço como sempre fazia. Por volta da meia-noite, foi pegar os passageiros que chegam do último ônibus que vem de BH”, informou.
O Sindicato dos Taxistas de Ouro Preto informou que o outro taxista é Denilson Maciel de Araújo Silva, de 25 anos. A namorada dele, Janaína Carvalho, confirmou que o companheiro está desaparecido, mas disse que ainda acredita que, caso esteja sob os escombros, seja resgatado com vida.
Mapeamento
Ouro Preto é uma “bomba-relógio” propícia a inúmeros deslizamentos. E tanta ameaça tem uma causa bem definida: a topografia. É o que aponta o Mapa de Zoneamento de Riscos Geológico e Geotécnico para Área Urbana, do professor Romero César Gomes, do Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). De acordo com o levantamento, 60% do solo urbano do município é instável e tem risco que varia de médio a muito alto. O estudo, feito durante mais de cinco anos, foi apresentado à prefeitura em dezembro e teve como base o cadastro dos eventos ocorridos na cidade em decorrência das chuvas. A encosta que desabou ontem sobre a rodoviária estava na lista das regiões de alto risco, que incluem bairros como São Cristóvão e Taquaral.
“Essa é uma área de risco bem característica e se estende desde a saída de Ouro Preto, na Praça Tiradentes, até a Rua Padre Rolim, via de acesso a BH. A cidade tem grande concentração de problemas, pois é um vale encaixado entre duas serras. Todos os bairros têm área de risco e a maior delas é a serra onde ocorreu o deslizamento”, informou Gomes. “O risco é gerado quando há ocupação inadequada numa área já propícia. Numa área com problemas, como a Serra de Ouro Preto, qualquer corte no terreno é desfavorável à estabilidade”, completou.
Romero Gomes espera que o mapeamento seja usado pelo poder público para providências. “Deve-se buscar uma solução definitiva para o problema da ocupação da serra. O ideal seria a retirada em massa das pessoas na época de chuva, mas como isso é inviável, terá de ser feito um planejamento a médio e longo prazo”, ressaltou.
“O que nos causou espanto foi o volume de material que desceu. Mas com o volume de chuva em dezembro, que continua neste mês, era previsto que alguma coisa pudesse acontecer nessa parte da Serra de Ouro Preto”, afirmou Romero. Ainda segundo o especialista, a rocha na serra é composta por itabirito, totalmente permeável, e filito, que é impermeável. “A parte do itabirito, a cobertura do solo e a vegetação escorregaram por cima do fluxo de água que se formou sobre o filito", conclui.
Prefeitura
Segundo o secretário municipal de Patrimônio e Desenvolvimento Urbano, Gabriel Gobbi, a tragédia foi uma surpresa, até porque o temor era em relação a outra área, situada perto da encosta que desabou, entre a rodoviária e a antiga Santa Casa. “Embora não fosse previsível, era possível, mas não esperávamos um volume desse”, disse. O secretário reiterou que não há como fazer intervenções a curto prazo.
“São áreas extensas, de topografia muito acentuada, enormes maciços de terra, vegetadas e íngremes, e isso demanda estudo e planejamento mais cuidadoso, não dá para pôr uma lona, por exemplo”, resumiu. A primeira solução, segundo Gobbi, é impedir a ocupação ou estimular a desocupação de áreas. Geólogos também estão de prontidão para, assim que o tempo estiar, avaliar os locais de maior risco para isolar a área. “O que podemos fazer é isso. Não é possível obras agora”, afirmou.
O prefeito Ângelo Oswaldo (PMDB) disse que 80% da área da cidade é considerada de risco e por isso é impossível fazer mudanças que, segundo ele, inviabilizariam Ouro Preto. “Nossa equipe monitora esse locais frequentemente e no caso deste deslizamento não havia indícios de que poderia cair a qualquer momento. Não posso mudar a rodoviária, porque não tenho lugar para isso e nossa cidade não pode parar. Somos uma estância turística e essas mudanças só são viáveis quando detectamos que vai cair. Em virtude dos problemas, já retiramos 19 famílias no Bairro São Francisco de Paula por conta de novos deslizamentos”, informou.