As chuvas de janeiro de 1997 deixaram marcas nas paredes da casa e mais ainda na memória da família Lara Masssara, moradora de Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo HorizonteEra tarde quando o Rio das Velhas, que divide a cidade, invadiu as residências da Rua do Comércio, no Bairro da Ponte, aterrorizando os moradores e causando perdas na sala, cozinha e quartosDiante daquela situação extrema, já que foi obrigada a passar a noite com os filhos na rua até o dia clarear, para retirar a lama dos cômodos, a dona de casa Aura Lara Massara, viúva, hoje com 85 anos, tomou uma decisão: construir um abrigo, sobre a garagem, para guardar mobília e eletrodomésticos ao menor sinal de cheia do rio.
Dito e feitoNaquele mesmo ano, Aura, conhecida como Maninha, reuniu os três filhos e deu início à construção de alvenaria, que fica a dois metros de altura do piso, tem área de 40metros quadrados e pode acomodar tranquilamente 10 pessoas “Fizemos uma escada bem larga, de ferro, sem curvas, para podermos passar com geladeira e móveisNuma hora dessas, tudo precisa ser muito rápido, pois a enchente não perde tempoO abrigo é mais alto até do que a casa”, diz o filho de Maninha, o biólogo Cristiano Lara Massara, que trabalha na capital e se preocupa muito em dezembro e janeiro “Felizmente, nunca precisamos usar o abrigo, mas ele está sempre limpo e livre para qualquer emergênciaNo caso de ocorrer outra vez…”
Acompanhado da mãe, Cristiano mostra o compartimento sobre a garagem – “na época ficou muito caro”, ele se recorda – e diz que a ideia partiu de Maninha: “O pior naquela noite foi que os vizinhos não podiam se ajudar, pois todos estavam com água pela cinturaEntão, tínhamos que pensar numa solução para o futuro”O dia seguinte à enchente também não foi fácil
Deu certo
Para Lésia, uma boa medida seria que as autoridades fizessem o desassoreamento do Rio das Velhas, um dos mais importantes afluentes do São Francisco“Na década de 1970, a prefeitura fez esse serviço, retirando entulho da calha do rio, e ficamos uns 15 anos sem inundação
Natural de Afogados da Ingazeira, no sertão de Pernambuco, a dona de casa Maria Vânia de Souza Santos, de 56, veio para Minas com a família há 25 anos e foi morar há 18 no Bairro Nova Esperança, conhecido como Pantanal, à beira do Rio das Velhas, em Santa LuziaAcostumada às tristezas da seca, ela nunca imaginou que as águas pudessem lhe trazer transtornos“Nesta época do ano, fico da janela controlando o nível do rioSe ele sobe, carrego o que posso aqui para o pavilhão”, diz VâniaO pavilhão é o “abrigo” que ela construiu sobre a casa, para levar eletrodomésticos e mobília
Na escada larga que dá acesso aos cômodos, com banheiro, ela diz que o espaço é só mesmo para evitar perdas materiais“Se a situação apertar, vou para casa de parentesUma vez, a água aqui subiu dois metrosJá chegou ao ponto de ficar em casa de parentes no Barreiro, em BH”, revela, lembrando que prevenir é o melhor remédio.