O que parecia alívio para muitos ainda não representou o desfecho de uma história de riscos, prejuízos e aflição no Bairro Buritis, Região Oeste de Belo Horizonte. Movimentações de terra durante os trabalhos de quatro escavadeiras para demolir o edifício 1 do condomínio Art de Vivre, terminados oficialmente ontem às 15h10, podem ter comprometido ainda mais a estabilidade do prédio 2. Pedaços de laje e pedras acabaram se chocando contra a estrutura durante o desmanche do edifício vizinho. “Tivemos movimentações de solo nesse tempo e tudo precisará ser avaliado amanhã (hoje) pelos nossos peritos para ver se o outro prédio também representa perigo”, disse o secretário municipal de Obras e Infraestrutura, Murilo Valadares.
Dois laudos serão produzidos: um sobre as condições do prédio remanescente do condomínio Art de Vivre e outro sobre o solo e os escombros da demolição finalizada ontem. As movimentações do solo da encosta preocupam, principalmente por terem sido responsáveis pelo desabamento do primeiro edifício, o Vale dos Buritis, na terça-feira passada. “O problema aqui é mesmo o solo que está instável. A estrutura do prédio não ameaça ruir. É a encosta que preocupa e pode escorregar. Mas o tempo tem ajudado a gente. Não tem chovido e o sol também ajudou”, avaliou Valadares.
Os escombros de concreto armado, pedras e cabeamento serão levados para o aterro municipal na BR-040. Contudo, o material só será embarcado em caminhões pela Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) depois que se decidir o destino do edifício 2 do Art de Vivre. “Se precisarmos demolir o segundo prédio, vamos ter de usar o entulho como uma base para as escavadeiras poderem se mover e trabalhar sobre o barranco”, acrescentou o secretário municipal de Obras. A parte mais difícil da demolição, ontem, foi justamente calçar o barranco com os destroços para que as máquinas pudessem avançar e alcançar as partes mais baixas do barranco. Uma cena impressionante foi o levantamento de um dos elevadores pela pá de uma das máquinas. O aparelho foi erguido e depois jogado sobre um monte de pedras, sobrando apenas um emaranhado de metal retorcido e cabos.
INTERDIÇÃO PERMANECE
As casas e prédios interditados dentro da área sujeita a desabamentos na Rua Laura Soares Carneiro não poderão ser liberados até que se defina o futuro do Art de Vivre 2. De acordo com a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap), tal decisão caberá à Defesa Civil, que vai avaliar as condições de segurança do local. “Se tivermos de demolir o outro prédio, as interdições deverão ser mantidas e os trabalhos continuarão”, prevê Valadares.
Quem não gostou nada da notícia foram os moradores dessas residências ameaçadas. Ontem, por volta das 13h, enquanto homens ainda trabalhavam na demolição do edifício 1 do Art de Vivre, um casal que mora no prédio interditado de cinco andares no número 177 da Rua Laura Soares Carneiro (também sujeito às movimentações de terra) chegava de viagem e não conseguiu entrar em casa. “Estávamos for a e ficamos sabendo da demolição. Só que não pudemos voltar a tempo de tirar nossas coisas nem aprontar nada. Não sei o que fazer, como a situação será resolvida?, indagou o homem, que se identificou apenas como Pedro. O casal aguardou o fim do almoço dos 15 operários que trabalhavam no desmanche para pedir à Defesa Civil que pudesse entrar na residência e retirar pertences. A vendedora Valéria Araújo, de 38 anos, estava aflita. “Quero ver se acabam logo com essa loucura. Minha casa está abandonada e meus cães sozinhos. Preciso retomar minha vida logo”, reclamou a mulher, que mora em uma casa que fica ao pé do barranco sobre o qual os edifícios estão dependurados, na Avenida Protásio de Oliveira Penna.
Prefeitura garante exigir mais de regras construtivas
Não é preciso rodar muito pelas ruas do Bairro Buritis para ver que perigos de deslizamento rondam construções em toda parte. Se do alto das janelas dos edifícios que são erguidos o destaque são placas de “Vende-se”, embaixo, nas encostas abertas nos morros, é o colorido das lonas negras, azuis, brancas e amarelas que chamam a atenção. As coberturas plásticas são artifícios comuns para impedir que a água entre no solo pelo alto dos montes, faça o barranco pesar e ceder sobre as estruturas, vias e edificações vizinhas. “A prefeitura não vai deixar mais que essas situações se repitam. Estamos trabalhando para tornar mais seguras essas obras. Vamos tornar as regras de construções mais exigentes e cobrar mais responsabilidade de quem atesta a segurança da obra e de seu entorno”, avisou o secretário de Obras e Infraestrutura, Murilo Valadares.
A meio quarteirão dos escombros que rolaram por 50 metros morro abaixo quando o edifício Vale dos Buritis desmoronou semana passada, um outro condomínio com duas torres foi apontado pela Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) como área de risco. “São exemplos muito próximos que o Buritis apresenta, como também o Barreiro, Mangabeiras, Belvedere, Sion”, afirma o superintendente da Sudecap, Fernando Jannotti. Os prédios a que ele se referiu, na Rua Marco Aurélio de Miranda, foram erguidos no sopé de um morro íngreme. Parte da grama plantada em quadrados já cedeu expondo um barranco de barro vermelho lavado que se precipita para cima dos apartamentos. Uma lona azul é usada para tentar escoar rapidamente a água das chuvas para evitar danos e deslizamentos.
Os instrumentos que a prefeitura estuda aprimorar para tornar mais exigentes as regras de construções na capital, de acordo com a Sudecap e a Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura, seriam alterar o Código de Obras, tornando mais rígido o controle sobre as fundações das edificações e também a extensão da responsabilidade técnica de engenheiros para as estruturas do entorno da construção que estiver sendo feita. Hoje, para que um alvará de imóvel seja liberado, basta que o engenheiro assine um termo de responsabilidade técnica. A prefeitura não vistoria esse tipo de estrutura no processo de concessão de alvarás.